INTRODUÇÃO
Carente de regulamentação legislativa no Brasil, o fenômeno da terceirização voltou ao palco central do debate no Direito do Trabalho no primeiro semestre de 2015, após aprovação - na Câmara dos Deputados - de uma emenda ao Projeto de Lei 4330/04 que abre as portas para que as empresas possam subcontratar mão-de-obra em todas os setores, incluindo em suas atividades-fim. O PL ainda pode sofrer mudanças no Senado, contudo, tal movimento por parte dos Deputados foi suficiente para gerar uma grande polarização da sociedade em torno do tema.
Tendo surgido durante a 2ª Grande Guerra, em função da necessidade das fabricantes de armas de se especializarem na montagem dos armamentos demandados pelo governo, relegando a fabricação de certos componentes para empresas especializadas, a terceirização, prioristicamente, possuía duas finalidades principais: 1. Transferir atividades secundárias de uma empresa para outra, especializada naquela função, o que tende a aumentar a qualidade de tal serviço; 2. Reduzir o risco da atividade da tomadora, na medida em que, ao terceirizar determinados setores, a empresa reduz o seu quadro de pessoal e, assim, seu ônus trabalhista - de longe o que o mais incomoda o empresariado médio.
Via de regra, pode-se afirmar que o instituto da terceirização cumpre bem o seu papel: aumenta a especialização e a qualidade dos serviços; dá mais agilidade à empresa tomadora; estimula o desenvolvimento saudável de pequenas e médias empresas e gera empregos. Atualmente, há cerca de 1 milhão de prestadoras de serviços terceirizados, que geram quase 15 milhões de empregos formais. Contudo, num país extremamente carente de fiscalização, com uma Justiça lenta e um dos estados mais caros e ineficientes do mundo (carga tributária em 2014 foi de 35,42% do PIB), é quase natural afirmar que existem diversos casos em que a terceirização apenas mascara uma relação de trabalho de fato existente entre a empresa tomadora e os empregados, subcontratados através de um terceiro com o objetivo de precarizar a relação de trabalho, seja afastando o reconhecimento de situações de equiparação salarial com funcionários da própria tomadora que desempenham funções semelhantes, seja vinculando-os a sindicatos menores e mais fracos, ou, ainda, deixando de pagar obrigações trabalhistas.
ASPECTOS LEGAIS
Atualmente, há apenas uma regulamentação para o tema: a súmula 331 do TST, editada em função da ausência do legislador em regulamentar a matéria. Em linhas gerais, a súmula aglomera toda a orientação sobre a terceirização, apontando os casos lícitos e ilícitos, tanto em empresas privadas como para a Administração Pública, bem como trata também da responsabilidade da tomadora para com os empregados terceirizados. Segue abaixo a íntegra de tal normativa:
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.
Analisando o caso concreto, pode-se afirmar que - afora a dificuldade latente em distinguir exatamente quando uma atividade é fim e quando é meio - caso cumprida, a Súmula 331 do TST resguarda os direitos trabalhistas dos empregados das empresas terceirizadas e, assim, permite ao país seguir a tendência mundial de modernização e especialização nas relações comerciais e de trabalho. Ademais, a aprovação do PL 4330 complementaria o regramento já existente, trazendo mais segurança jurídica para as empresas e ampliando o respaldo dos trabalhadores. Se aprovado, está prevista a criação de um fundo-caução para garantir aos trabalhadores o recebimento das verbas salariais, trabalhistas e previdenciárias - o que hoje não existe. Além disso, garante aos terceirizados acesso à alimentação, ambulatório e transporte da tomadora, tornando-a por fim responsável solidária em relação às obrigações da contratada - atualmente essa responsabilidade é subsidiária. Em contrapartida, na medida em que aumenta a segurança jurídica para as empresas, a lei estimulará o investimento em novas vagas e a especialização do trabalho. Estudo da FIESP aponta para a criação de 3 milhões de novos postos de trabalho caso o PL seja aprovado.
CONCLUSÃO
Por fim, conclui-se que, mesmo com a inexplicável demora dos legisladores em regulamentar o tema da terceirização, a agilidade das relações privadas há muito trouxeram este intituto para o país, e é inegável suas vantagens para a modernização da economia e, por isso, a relevância que acabou assumindo. A iniciativa do TST em tratar do tema trouxe mais transparência para tais relações, mas a ausência legislativa sem dúvida ainda traz insegurança para todos os envolvidos - empregados e empregadores - e dificulta o amadurecimento da terceirização. Contudo, num país em que o setor produtivo sofre para bancar a ineficiência governamental e se sobressair em meio a tantas adversidades, é inadmissível punir mais uma vez a maior parte dos empreendedores e empregados que seriam beneficiados com a correta regulamentação do instituto, em função da inércia governamental em fiscalizar uma minoria mal intencionada que, de um modo ou de outro, já subverte a ordem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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