Processo nº 10027XX-42.2015.8.26.0565
Analisando recurso de apelação interposto pela incorporadora Liberty (M.BIGUCCI), a qual, inconformada com a condenação sofrida em primeira instância para a restituição de 90% dos valores pagos aos compradores de um imóvel residencial na planta, que posteriormente assinaram um distrato nitidamente abusivo, retendo parte considerável dos valores pagos, a 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em decisão de 14 de maio de 2015, CONFIRMOU a sentença de primeira instância e impôs à incorporadora a restituição de 90% dos valores pagos pelos então adquirentes, com correção monetária desde cada desembolso (correção retroativa) e juros legais de 1% ao mês até a data da restituição.
A ação de restituição de quantias pagas foi julgada procedente na Cidade de São Caetano do Sul para o fim de declarar a abusividade do Distrato e condenou a incorporadora na devolução da quantia de R$ 25.328,25, correspondente à diferença de 90% sobre os valores pagos no Distrato pela incorporadora.
No caso em análise, os compradores haviam pagado R$ 39.402,51 e a incorporadora havia retido cerca de 75% dos valores, o que é gritantemente ilegal.
Inconformada, a empresa recorreu basicamente para alegar em sede de recurso que seu Contrato faz lei entre as partes e que deveria ser respeitado, em que pese a linha de raciocínio adotada pela empresa revelar nítido abuso de poder econômico e afrontar disposições legais sobre o assunto, além de confrontar com o entendimento jurisprudencial dominante para casos em que o comprador de imóvel na planta solicita a rescisão do negócio por impossibilidade econômica.
Nas palavras do Desembargador Relator, Eduardo Sá Pinto Sandeville:
- “Embora o distrato enquanto modalidade de contrato, da mesma forma, obrigue as partes em atenção ao princípio do “Pacta Sunt Servanda”, o fato é que as condições apostas no instrumento contrariam a boa fé objetiva e função social do contrato, regras cogentes da legislação consumeristas, além da dominante jurisprudência dos nossos tribunais.
- E previsões abusivas no distrato, tal qual no contrato, permitem a declaração da nulidade, posto que “inaceitável transação que contrarie os princípios básicos do direito e as disposições legais vigentes. Não se admite como válido o distrato de promessa de compra e venda segundo o qual o promissário comprador recebe a devolução das parcelas pagas sem correção monetária” (REsp 331346 / MG, Ministra NANCY ANDRIGHI,j. 15/10/2001).
- Assim, não prevalece a rescisão contratual instrumentalizada pelo distrato de fls. 103/106, que traz previsão de restituição de apenas 25% dos valores pagos e de forma parcelada.
- É certo que, rescindido o contrato, as partes devem retornar ao estado anterior. Dessa forma, deve ser determinada a restituição dos valores pagos, bem como indenização pelos prejuízos decorrentes do desfazimento do contrato, como despesas administrativas com corretagem, propaganda, entre outras, tudo para manter o equilíbrio entre as partes e evitar o enriquecimento sem causa.
- Portanto, a restituição dos valores pagos, com retenção do percentual de 10%, se mostra adequada para compensar a apelante pelas despesas decorrentes do contrato rescindido.
- E a devolução deve ocorrer de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista no distrato, nos termos da súmula n.º 2 deste E. Tribunal mencionada acima. Por fim, a correção monetária deve mesmo incidir dos respectivos reembolsos, pois é mera atualização do valor da moeda e nada acresce ao valor devido.”
Ao final, a 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em votação unânime, manteve a condenação da incorporadora M.Bigucci na devolução do correspondente a 90% (noventa por cento) dos valores pagos pelos compradores no “Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra”, corrigidos monetariamente desde cada pagamento e com juros legais de 1% ao mês, abatendo-se a importância paga no distrato anteriormente celebrado.
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário)
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