6 CONCLUSÃO
Diante do trabalho exposto, é preciso ressaltar que a internação compulsória, em sua concepção histórica, está atrelada a uma forma de exclusão, principalmente quando se utiliza de meios segregatórios.
A internação compulsória, a priori, representa a privação da liberdade daqueles que estão com sua capacidade de discernimento comprometida. Manter um ser humano de forma obrigatória em tratamento parece remeter à barbárie.
Com o passar dos anos, novos problemas sociais relacionados às drogas alcançam o cenário brasileiro em um nível descontrolado, principalmente quando o uso deixa de ser crime, provocando, em consequência, um caos na segurança e na saúde pública.
Assim, a assistência aos dependentes químicos começa a ser questionada frente à garantia constitucional do direito à saúde, e a saída são as vias judiciais, tendo em vista a ineficiência dos tratamentos disponíveis, seja pela resistência, seja pela não aceitação.
Como saída, o judiciário brasileiro busca contínuo respaldo na Lei Federal nº 10.216/2001, que trata sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental, incluindo os dependentes químicos por interpretação analógica, recriando a possibilidade de internação compulsória por determinação judicial.
O Estado respalda-se no entendimento de que tem o dever de defender o cidadão em todos os casos, inclusive dele mesmo, haja vista que este pode vir a oferecer risco à própria vida e a de terceiros. Com essa atitude o princípio da dignidade da pessoa humana estaria sendo violado.
É preciso reconhecer que as substâncias psicoativas lícitas ou ilícitas, hoje, são o grande desafio da saúde pública e que as formas de assistência devem ser revistas. Todavia, é de suma importância reconhecer que a internação compulsória é um modelo de atenção à saúde eminentemente asilar e que priva o sujeito de sua autonomia pela escolha ou não do tratamento e sua continuidade.
A Judicialização da Saúde, em um primeiro momento, parece algo a solucionar o problema, porém, a utilização demasiada e sem verificação subjetiva de cada caso pode fazer com que o judiciário cometa erros irreversíveis, pois a internação compulsória como tática terapêutica não traz resultados positivos. É claro que, para situações de extrema necessidade, não pode deixar de ser considerada, contudo, há de se observar a linha da cessação da periculosidade, oferecida continuidade terapêutica, trazendo-se o indivíduo para a sociedade.
Ressalta-se que a intenção não é inibir o acesso ao judiciário, e, sim, suprir o desconhecimento da população sobre as políticas públicas de saúde já existentes. Sabe-se que o acesso ao judiciário, em verdade, não é universal e igualitário como é o acesso ao SUS, por isso a solução deve ser sempre a de construir políticas de saúde para o público dependente químico.
REFERÊNCIAS
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Notas
[1] O Sistema Único de Saúde, criado pela Lei 8080/90, trata-se de um conjunto de medidas que têm como objetivo promover qualidade de vida para a população brasileira garantindo acesso, assistência integral e equitativa à saúde funcionando de forma regionalizada, hierarquizada e integrada.
[2] Franco Basaglia, um dos psiquiatras mais discutidos no mundo, em função dos trabalhos que desenvolvia na Itália, fundou o Movimento da Psiquiatria Democrática e liderou as mais importantes experiências de superação do modelo asilar-manicomial. Esteve no Brasil da década de 70 início de 80. Trazido pelo psiquiatra, Dr. Antônio Soares Simone, visitou um dos maiores manicômios brasileiros, Hospital Colônia de Barbacena-MG. Suas visitas seguidas acabaram produzindo uma forte e decisiva influência na trajetória da Reforma Psiquiátrica.
[3] Lei11.434de 23 de agosto de 2006