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Regras do cumprimento da pena

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28/05/2018 às 13:45
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A partir da edição, em 1941, do Código Penal brasileiro, já havia previsão para o cumprimento da pena ser iniciado desde a prolação da sentença de primeiro grau. A história mudou isso algumas vezes.

I – INTRODUÇÃO

É cediço que, desde a criação do nosso Código Penal, ocorrido em 03 de outubro de 1941, promulgado pelo Presidente da República Getúlio Dornelles Vargas, advogado, político e líder civil da revolução de 1930, que o cumprimento da pena pelo réu dar-se-ia logo após a Decisum de primeira instância.


II - PROJETO DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO

Releva dizer que o Projeto do Código Penal Brasileiro teve o seu marco inicial em 1938, com a iniciativa do eminente jurista Francisco Campos, à época Ministro da Justiça, nomeando Alcântara Machado, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, para a elaboração do novo projeto de Código Penal.

Assim sendo, em 1939 o aludido Mestre encerrou o seu trabalho, cujo projeto foi submetido ao crivo de uma comissão modelada pelos catedráticos Nélson Hungria, Roberto Lyra, Narcélio de Queiroz e Vieira Braga. Em 1940, os trabalhos foram concluídos pela referida comissão e entregues ao Ministro Francisco Campos, com inúmeras emendas na finalização da redação, porém foi mantida, em geral, da tese abraçada pelo Professor Alcântara Machado.

Por conseguinte, o novo Código Penal foi instituído através do Decreto nº 2.848, de 07/12/1940, entrou em vigor na data de 1º de janeiro de 1942, sob a égide de um direito punitivo democrático e liberal, com inspiração no Código Rocco Italiano.


III – PREVISÃO DA PRISÃO EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO

Nesse sentido, vislumbra-se que os artigos 393, 408 e 594 do CPB, revogados, já previa a prisão imediata do réu após a sua decretação em primeiro grau, nos termos seguintes:

“Art. 393. São efeitos da sentença condenatória recorrível:”

“I – se o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança;”

“II – ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.”

“Art. 408. Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento.” (Redação dada pela Lei nº 5.941, de 22/11/1973).

“§ 1º. Na sentença de pronúncia o juiz declarará o dispositivo legal em cuja sanção julgar incurso o réu, mandará lançar-lhe o nome no rol dos culpados, recomendá-lo-á, na prisão em que se achar, ou expedirá as ordens necessárias para a sua captura.”

“Art. 594. O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto.” (Redação dada pela Lei nº 5.941, de 22/11/1973). (Revogado pela Lei nº 11.719/2008).


IV – PRIMEIRA MODIFICAÇÃO DA REGRA DO CUMPRIMENTO DA PENA

Com o repassar do tempo, verificou-se a primeira modificação da regra de cumprimento da pena, em razão do julgamento em primeira instância no ano de 1973, do Delegado Sérgio Paranhos Fleury, à época da gestão militar, chefiava o Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), no Estado de São Paulo. Assim, em razão desse fato, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 5.941/73, com a manutenção da prisão do réu logo após a condenação em primeiro grau, porém inseriu em seu contexto o direito do réu primário e de bons antecedentes aguardar o julgamento em liberdade. Diante dessa mudança textual, a referida lei passou a ser conhecida como “Lei Fleury”, resultando, destarte, o efeito cascata da decisum, beneficiando inúmeros condenados, inclusive o próprio Delegado Fleury, da prisão em primeira instância.


V – SEGUNDA MODIFICAÇÃO DA REGRA DO CUMPRIMENTO DA PENA

A segunda modificação da regra de cumprimento da sanção penal deu-se com a promulgação da Lei nº 11.719/2008, reformando do Código de Processo Penal, revogando os artigos 408 e 594 do CPB, como já alhures informado e, na mesma esteira, modificando o artigo 387 do Código de Processo Penal, rezando que o juiz decidirá em torno da prisão ou da liberdade do réu, quando da prolação da sentença condenatória, sem prejuízo do conhecimento do recurso de apelação, in verbis:

“Art. 387. O juiz ao proferir sentença condenatória:”

“I – mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no Código Penal, e cuja existência reconhecer;”

“II – mencionará as outras circunstâncias apuradas e tudo o mais que deve ser levado em conta na aplicação da pena, de acordo com o disposto nos arts. 59 e 60 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal (Redação dada pela Lei nº 11.719 de 2008);”

“III – aplicará as penas de acordo com essas conclusões (Redação dada pela Lei nº 11.719 de 2008);”

“IV – fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008);”

“V – atenderá, quanto à aplicação provisória de interdições de direitos e medidas de segurança, ao disposto no Título XI deste Livro;”

“VI – determinará se a sentença deverá ser publicada na íntegra ou em resumo e designará o jornal em que será feita a publicação (art. 73, § 1º, do Código Penal).”

“§ 1º. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012).”

“§ 2º. O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012).”

A posteriori, adveio a Súmula 347 do STJ, reconhecendo que o conhecimento do recurso de apelação do réu independe de sua prisão.

Com o esteio de unificar o entendimento em torno da matéria, ora analisada, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 12.403, de 2011, tipificando o artigo 283 do CPP, estabelecendo três cabimentos de prisão preventiva, em flagrante delito ou temporária, infra:

“Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.” (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

“§ 1º. As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade.” (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

“§ 2º. A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.” (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).


VI – TERCEIRA MODIFICAÇÃO DA REGRA DO CUMPRIMENTO DA PENA

 Contudo, o Supremo Tribunal Federal (STF), quando do julgamento do Habeas Corpus nº 126292, em 2016, decidiu admitir a prisão após a condenação em segunda instância, com sete votos a favor e quatro contrários.

Dentre os Ministros que votaram em prol da admissão da prisão em segunda instância está o Ministro Edson Fachin, que divergiu do relator, votando pelo indeferimento da medida cautelar, interpretando o artigo 283 do CPP nos moldes da Constituição Federal, defendendo que o início da execução criminal é coerente com Constituição Federal quando ocorrer condenação ratificada em segundo grau, salvante quando for admitido efeito suspensivo a eventual recurso a cortes superiores. Ademais, destacou o Ministro Fachin que a Constituição não tem o escopo de outorgar uma terceira ou quarta chance para a revisão de uma decisão com a qual o réu não se conforma e considera injusta. Para o Ministro, o acesso individual às instâncias extraordinárias visa a propiciar ao STF e ao STJ exercer seus papéis de uniformizadores da interpretação das normas constitucionais e do direito infraconstitucional. Afirma, ainda, que retomar o entendimento anterior ao julgamento do HC 126292 não é a solução adequada e não se coaduna com as competências atribuídas pela Constituição às cortes superiores. E, finalmente, afastou o argumento de irretroatividade do entendimento jurisprudencial prejudicial ao réu, entendendo que tais regras se aplicam apenas ás leis penal, mas não à jurisprudência.

Nesse sentido buscar-se-á compilar a tendência jurisprudencial do STF, que deu azo ao cumprimento de pena após o julgamento de segunda instância, que vem sendo respaldada até a presente data, in verbis:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. Habeas Corpus. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGRUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. 2. Habeas Corpus denegado”. (HC 126292/SP – STF, 2ª Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, Julg. 17/02/2016, Pub. Dje 100, data 17/05/2016).

DECISÃO:

A turma, por votação unânime, afetou o julgamento do feito ao Plenário do Supremo Tribunal Federal, por indicação do Ministro Relator. Presidência do Senhor Ministro Dias Toffoli, 2ª Turma, 15.12.2015. Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, denegou a ordem, com a consequente revogação da liminar, vencidos os Ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski (Presidente). Falou, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Rodrigo Janot Monteiro de Barros, Procurador-Geral da República.

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Em seguida, na data de 02/09/2016, deu-se o ingresso do recurso de Embargos de Declaração nos Habeas Corpus 126292 precitado, e após o seu julgamento, a decisão abaixo:

“EMENTA: PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VÍCIOS DO ART. 619 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INEXISTÊNCIA. 1. Segundo o acórdão embargado, “a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal”. 2. De acordo com o estatuído no artigo 619 do CPP, os embargos de declaração são cabíveis nas hipóteses de ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. No caso, não se verifica a existência de quaisquer desses vícios. 3. Embargos de Declaração rejeitados. (STF, HC 126292 ED/SP – SÃO PAULO – Emb. Declaratório no HC, Rel. Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, Julg. 02/09/2016, Dje 023, Pub. 07/02/2017).

DECISÃO: O Tribunal, por maioria, e nos termos do voto do Relator, rejeitou os embargos de declaração, vencido o Ministro Celso de Mello. A Ministra Rosa Weber acompanhou o Relator com ressalva. Plenário, Sessão virtual de 26 de agosto a 1º de setembro de 2016.

Nesse sentido, ainda, o julgamento de Repercussão Geral em torno do Princípio Constitucional da Presunção de Inocência, infra:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). ACÓRDÃO PENAL CONDENATÓRIO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBIIDADE. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. JURISPRUDÊNCIA REAFIRMADA. 1. Em regime de repercussão geral, fica reafirmada a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Recuso Extraordinário a que se nega provimento com o reconhecimento da repercussão geral do tema e a reafirmação da jurisprudência sobre a matéria. (STF, ARE 964246 RG/SP –SÃO PAULO, Tribunal Pleno – Repercussão Geral – Mérito, Rel. Min. Teori Zavascki, Julg. 10/11/2016, Dje 251, Pub. 25/11/2016).

DECISÃO: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. No mérito, por maioria, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria, vencidos os Ministros Celso de Mello, Dias Toffoli, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski. Não se manifestou a Ministra Rosa Weber, Ministro TEORI ZAVASCKI Relator.


VIII – O AJUIZAMENTO DAS ADCs 43 e 44/2016

Durante o mês de maio de 2016, o Partido Ecológico Nacional (PEN), ingressou junto ao STF com uma Ação Declaratória de Constitucionalidade do artigo 283 do CPP e nos mesmos moldes o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB), também, formalizou idêntica ação judicial, ensejando o julgamento dos feitos em conjunto, as quais foram distribuídas e registradas sob os números 43 e 44, respectivamente, que buscam estabelecer a constitucionalidade ao artigo 283 do Código de Processo Penal, infra:

“Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.” (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).  

Como já comentado, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sua maioria entendeu que o artigo 283 do CPP, não impede o início da execução da pena, após a condenação do réu em segunda instância, oportunidade em que indeferiu as liminares pleiteadas nas precitadas Ações Declaratórias de Constitucionalidade. Segundo os autores das ações, preliminarmente, foram requeridas a concessão da medida cautelar visando à suspensão da execução antecipada da pena de todos os acórdãos já prolatados em segunda instância. A alegação se prende ao ato do julgamento do Habeas Corpus nº 126292, ocorrido em fevereiro de 2016, que vem ocasionando controvérsia jurisprudencial, relacionado ao princípio constitucional da presunção de inocência, uma vez que, a jurisprudência mesmo sem força vinculante, os tribunais pátrios passaram a eleger semelhante posição, redundando em diversas decisões que, de modo deliberado, ignorando o preceito do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP).

Na data de 1º de setembro de 2016, o feito começou a ser examinado pelo Plenário do STF, oportunidade em que o Ministro Marco Aurélio, relator das aludidas ações, proferiu o seu voto abraçando a constitucionalidade do artigo 283 do CPP, concedendo a medida cautelar pleiteada. Porém, com a retomada do julgamento na data de 05 de setembro de 2016, prevaleceu a inteligência de que o preceito legal, em análise, não veda o início do cumprimento da pena, depois de esgotadas as instâncias ordinárias.

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Sobre o autor
Jacinto Sousa Neto

Advogo nas área de direito civil, trabalhista e em procedimentos administrativos (sindicância e processo administrativo), além disso sou escritor e consultor jurídico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA NETO, Jacinto. Regras do cumprimento da pena. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5444, 28 mai. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65183. Acesso em: 22 dez. 2024.

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