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O RAT requer mudanças após inércia de 10 anos

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VI – FONTE ALTERNATIVA DE FINANCIAMENTO DO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL – RGPS: CRIAÇÃO DE RAT PARA OS CONTRIBUINTES INDIVIDUAIS.

Sem a pretensão de aprofundar o exame das microdados das contas nacionais previdenciárias, é factível que o rearranjo percentual do RAT de todas as 1.301 atividades econômicas listadas no Anexo V do RPS poderia ensejar, ao fim, em receita menor ao Fundo do Regime Geral de Previdência Social – FRGPS.

Antecipando-se ao indesejado resultado negativo de ingresso financeiro por intermédio dessa rubrica previdenciária, vislumbra-se a plausibilidade jurídica e econômica de estipulação de RAT devido pelos contribuintes individuais.

Considerando o arcabouço jurídico concernente às receitas oriundas de contribuições previdenciárias - Leis nºs 8.212/91, 9.876/99[1], 10.666/2003[1]; Leis Complementares nºs 123/2006 e 150/2015[1] -, é certo afirmar que o segurado especial, com 0,1% (Art. 25, II, da Lei nº 8.212/91) e o segurado empregado doméstico, com 0,8% (Art. 34, III, da Lei Complementar nº 150/2015), além do segurado empregado e do trabalhador avulso, também possuem contribuição adicional ao financiamento de benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho.

Ocorre que os contribuintes individuais não participam do sistema de custeio de benefícios previdenciários decorrentes de acidentes de trabalho.

A inclusão da categoria dos contribuintes individuais no financiamento de despesas incorridas com acidentes de trabalho, com consequente criação de RAT único, positiva e cumpre o Princípio da Solidariedade como suporte axiológico para garantia da continuidade dos benefícios previdenciários prestados pelo regime previdenciário nacional. Sobre o assunto, o Pretório Excelso assim se manifestou[5]:

O sistema público de previdência social é fundamentado no princípio da solidariedade (art. 3º, I, da CB/1988), contribuindo os ativos para financiar os benefícios pagos aos inativos. Se todos, inclusive inativos e pensionistas, estão sujeitos ao pagamento das contribuições, bem como aos aumentos de suas alíquotas, seria flagrante a afronta ao princípio da isonomia se o legislador distinguisse, entre os beneficiários, alguns mais e outros menos privilegiados, eis que todos contribuem, conforme as mesmas regras, para financiar o sistema. Se as alterações na legislação sobre custeio atingem a todos, indiscriminadamente, já que as contribuições previdenciárias têm natureza tributária, não há que se estabelecer discriminação entre os beneficiários, sob pena de violação do princípio constitucional da isonomia.

[RE 450.855 AgR, rel. min. Eros Grau, j. 23-8-2005, 1ª T, DJ de 9-12-2005.]

Destarte, sua previsão na Lei nº 8.212/91 e no RPS pode representar incremento fiscal suficiente para compensar eventuais perdas nos RAT das outras espécies de segurados do RGPS.

Só no exercício de 2017 existiam 9.431.378 contribuintes individuais, sendo 7.208.034 contribuintes previdenciários vinculados ao Plano Completo (20%) e 2.223.344 contribuintes previdenciários vinculados ao Plano Simplificado (11% - LC 123/2006), com arrecadação de R$ 15,4 bilhões, sendo R$ 13,3 bilhões pelo Plano Completo (20%) e R$ 2,1 bilhões pelo Plano Simplificado (11%)[6].

Caso fosse estipulado RAT único de 1% aos Contribuintes Individuais do Plano Completo e 0,5% aos Contribuintes Individuais do Plano Simplificado, projeta-se receita previdenciária (base 2017) em torno de R$ 761 milhões.


VII - CONCLUSÃO

Para implementação de alíquotas de RAT em favor de atividades econômicas segundo critérios mais coerentes, lógicos, razoáveis, proporcionais e justos, sugere-se alteração do Anexo V do RPS, estabelecendo balanceamento das atuais alíquotas de atividades econômicas com potencial de alteração do encargo previdenciário.

Vale ressaltar que o mecanismo acima aventado não constitui renúncia de receitas como causa de exigir a demonstração da estimativa do impacto na arrecadação, já que essa regra é aplicável para fins de aprovação de projeto de lei ou na edição de medida provisória, conforme art. 89, caput, da Lei nº 12.465, de 12 de agosto de 2011[1].

De acordo com a Tabela 4 - Resultados dos serviços prestados principalmente às famílias, por atividades - Brasil – 2016, da mais recente Pesquisa Anual de Serviços da Fundação IBGE[7], evidencia-se que os gastos com Contribuições para a Previdência Social foram de R$ 754,9 milhões referentes ao serviço Alojamento e R$ 2,574 bilhões referentes ao serviço Alimentação.

Assim sendo, é possível mensurar que a queda de 1 p.p. nas atividades integrantes desses serviços (vide tabela abaixo) representaria investimento reflexo do Poder Público, pela compatibilização desse encargo em relação à atividade exercida, com margem de geração de renda ao ciclo econômico do turismo nacional, que em números de 2016 alcançaria o montante de R$ 146 milhões.

Descrição (Serviços de Alojamento e Alimentação)

RAT atual

RAT proposto

Hotéis

2

1

Apart-hotéis

2

1

Motéis

2

1

Albergues, exceto assistenciais

3

2

Campings

1

1

Pensões (alojamento)

2

1

Outros alojamentos não especificados anteriormente

2

1

Restaurantes e similares

2

1

Bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas

3

2

Lanchonetes, casas de chá, de sucos e similares

3

2

Serviços ambulantes de alimentação

3

2

Fornecimento de alimentos preparados preponderantemente para empresas

3

2

Serviços de alimentação para eventos e recepções - bufê

2

1

Cantinas - serviços de alimentação privativos

3

2

Fornecimento de alimentos preparados preponderantemente para consumo domiciliar

3

2

O fragmento do RPS, esquadrinhado neste artigo, autoriza afirmação segundo a qual 15 atividades econômicas dos serviços Alojamento e Alimentação podem dispor de alíquotas reduzidas do RAT, e em contrapartida 56 outras atividades econômicas, também presentes no RPS, podem sofrer reclassificação do potencial de risco de acidente de trabalho.

A perspectiva, neste sentir, é a de não só ajustar o citado encargo previdenciário à realidade econômica, conjugado a critério objetivo da meritocracia no esforço empresarial de mitigação dos infortúnios e, por conseguinte, do ônus atribuído ao FRGPS relativo a acidentes de trabalho, mas também, como resultado imediato, a tendência de elevação das receitas decorrentes do RAT.


VIII – MINUTAS DE DECRETO E DE LEI

Esbocei minuta de Decreto com proposta de alteração do Anexo V do RPS, respeitando o Princípio da Anterioridade nas situações de aumento de alíquota do RAT para determinadas atividades econômicas.

Outrossim, não construí novo Anexo V, até porque nosso estudo tem o condão de chamar ao debate sobre a necessidade de modificação de alíquotas do RAT, cabendo ao Poder Executivo definir as atividades econômicas e os correspondentes percentuais.

Já a alíquota única do RAT dos contribuintes individuais deve constar da Lei de Custeio.

DECRETO Nº X.XXX, DE XX DE XXX DE 2019.

Altera o Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto no 3.048, de 6 de maio de 1999.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991,

DECRETA: 

Art. 1o O artigo 202 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, fica acrescido dos seguintes incisos IV e V:

Art. 202. ............

.................................................................................................

IV – um por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços. (AC)

V – cinco décimos por sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que prestem serviços junto a microempresas e empresas de pequeno porte, definidas na Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. (AC)

Art. 2o O Anexo V do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, passa a vigorar na forma do Anexo a este Decreto.

Art. 3o Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, produzindo seus efeitos, quanto à nova redação dada ao Anexo V, na data de sua publicação, nos casos de redução da alíquota do RAT, e a partir do primeiro dia do mês de janeiro de 2020, na hipótese de majoração das alíquotas do RAT.

Brasília, XX de XXX de XXXX; XXXº da Independência e XXXº da República.

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LEI Nº Y.YYY, DE YY DE YYY DE 2019.

Altera art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º O inciso III do artigo 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991 passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 22................

.................................................................................................

III - vinte e um por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços, sendo um por cento para financiamento dos benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho.” (NR)

Art. 2º O artigo 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991 fica acrescido do inciso IV:

“Art. 22................

.................................................................................................

IV – vinte inteiros e cinco décimos por cento sobre o total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados contribuintes individuais que lhe prestem serviços, sendo cinco décimos por cento para financiamento dos benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho exercidos em favor de microempresas e empresas de pequeno porte, definidas na Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.” (NR)

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2020.

Brasília, XX de XXX de XXXX; XXXº da Independência e XXXº da República.


IX - NOTAS

[1] Portal da Legislação do Governo Federal, pelo link http://www4.planalto.gov.br/legislacao/, acessado em 18.06.19

[2] Proposta de Emenda à Constituição – PEC nº 6/2019, que “Modifica o sistema de previdência social, estabelece regras de transição e disposições transitórias, e dá outras providências”, no link https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2192459, acessado em 18.06.19

[3] Pesquisa de Jurisprudência no Portal eletrônico do Tribunal Superior do Trabalho – TST, no link https://jurisprudencia.tst.jus.br/, acessado em 18.06.19

[4] Base Normativa do FAP, pelo link https://www2.dataprev.gov.br/FapWeb/pages/documentosApoio/documentosDeApoio.xhtml, acessado em 18.06.19

[5] Consulta à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, pelo link http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp, acessado em 19.06.19

[6] Anuário Estatístico da Previdência Social – AEPS 2017, pelo link http://sa.previdencia.gov.br/site/2019/04/AEPS-2017-abril.pdf, acessado em 17.06.19

[7] Pesquisa Anual de Serviços – PAS, dados de 2016, realizada pelo IBGE, consultada pelo link https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/servicos/9028-pesquisa-anual-de-servicos.html?t=resultados, acessada em 17.06.19

[8] Consulta ao Sistema Normas da Secretaria Especial da Receita Federal, pelo link http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/consulta.action, acessado em 25.06.19

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Sobre o autor
Lúcio Oliveira da Conceição

Sou Advogado desde 2008, servidor da Controladoria-Geral da União; exerceu a função de Chefe da Assessoria Especial de Controle Interno no Ministério do Turismo (mar/2017 a jan/2019)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CONCEIÇÃO, Lúcio Oliveira. O RAT requer mudanças após inércia de 10 anos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5838, 26 jun. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74954. Acesso em: 28 mar. 2024.

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