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O STF e a Lei Maria da Penha: uma lamentável decisão

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Agenda 10/02/2012 às 16:10

VII – A PRISÃO PREVENTIVA

  Por força do art. 42 da lei ora comentada, acrescentou-se o inciso IV ao art. 313 do Código de Processo Penal que passou a ter a seguinte redação:

“Art. 313. Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior [56], será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos:

“I - punidos com reclusão;

“II - punidos com detenção, quando se apurar que o indiciado é vadio ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecer ou não indicar elementos para esclarecê-la;

“III - se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 46 do Código Penal;

“IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.” (grifo nosso).

Aqui mais um absurdo e uma inconstitucionalidade da Lei Maria da Penha. Permite-se que qualquer que seja o crime (doloso), ainda que apenado com detenção (uma ameaça, por exemplo), seja decretada a prisão preventiva, bastando que estejam presentes o fumus commissi delicti (indícios da autoria e prova da existência do crime – art. 312, CPP) e que a prisão seja necessária para garantir a execução das medidas protetivas de urgência. A lei criou, portanto, este novo requisito a ensejar a prisão preventiva. 

“A primeira observação que se faz é que, com a alteração legislativa, o artigo 313, inciso IV do Código de Processo Penal passou a prever, além de mais uma hipótese legal para a prisão preventiva, qual seja a possibilidade de sua decretação nos crimes dolosos praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, mais um fundamento daquela custódia cautelar, consubstanciado na garantia da execução das medidas protetivas de urgência, previstas na Lei 11.340/06.Tecnicamente, melhor seria se essa última parte da disposição legal tivesse sido inserida no artigo 312 do Código de Processo Penal. Entretanto, o equívoco do legislador não lhe retira a natureza de verdadeiro fundamento da prisão preventiva, calcada que está na necessidade da restrição.Assim, a partir da vigência da Lei 11.340/06, é possível a decretação da prisão preventiva para a garantia das medidas protetivas de urgência previstas na referida lei.” [57]

Não seria mais necessária a demonstração daqueles outros requisitos (garantia da ordem pública [58] ou econômica, conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal, além da magnitude da lesão causada - art. 30 da Lei nº. 7.492/86, que define os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional [59]).

A respeito, veja-se a preocupação dos juristas espanhóis Gimeno Sendra, Moreno Catena e Cortés Dominguez:

“Tampoco puede atribuirse a la prisión provisional un fin de prevención especial: evitar la comisión de delitos por la persona a la que se priva de libertad. La propia terminología más frecuentemente empleada para expresar tal idea – probable comisión de ´otros´ o ´ulteriores´ delitos – deja entrever que esta concepción se asienta en una presunción de culpabilidad. (…) Por las mismas razones no es defendible que la prisión provisional deba cumplir la función de calmar la alarma social que haya podido producir el hecho delictivo, cuando aún no se ha determinado quién sea el responsable. Sólo razonando dentro del esquema lógico de la presunción de culpabilidad podría concebirse la privación en un establecimiento penitenciario, el encarcelamiento del imputado, como instrumento apaciguador de las ansias y temores suscitados por el delito. (…) La vía legítima para calmar la alarma social – esa especie de ´sed de venganza´ colectiva que algunos parecen alentar y por desgracia en ciertos casos aflora – no puede ser la prisión provisional, encarcelando sin más y al  mayor número posible de los que prima facie aparezcan como autores de hechos delictivos, sino una rápida sentencia sobre el fondo, condenando o absolviendo, porque sólo la resolución judicial dictada en un proceso puede determinar la culpabilidad y la sanción penal.” [60]

Obviamente, mais uma vez não se observou o princípio da proporcionalidade [61], perfeitamente exigível quando se trata de estabelecer requisitos e pressupostos para a prisão provisória; aqui, prende-se preventivamente quando, muito provavelmente, não haverá aplicação de uma pena privativa de liberdade (quando da sentença condenatória). Como ensina Alberto Bovino, não é possível “que a situação do indivíduo ainda inocente seja pior do que a da pessoa já condenada, é dizer, de proibir que a coerção meramente processual resulte mais gravosa que a própria pena. Em conseqüência, não se autoriza o encarceramento processual, quando, no caso concreto, não se espera a imposição de uma pena privativa de liberdade de cumprimento efetivo. Ademais, nos casos que admitem a privação antecipada da liberdade, esta não pode resultar mais prolongada que a pena eventualmente aplicável. Se não fosse assim, o inocente se acharia, claramente, em pior situação do que o condenado. ” [62] 

Incabível, pois, a decretação da prisão preventiva nos termos do art. 313, IV do Código de Processo Penal, pois, “não obstante o fato de ocorrer exclusivamente em sede parlamentar a atuação do princípio da proporcionalidade, isso não significa que as disposições normativas penais não possam ser submetidas a um eventual controle constitucional acerca da proporção nelas contidas. Não apenas isto é permitido, mas, acima de tudo, é recomendável quando alguma dúvida houver neste sentido.” [63]

Com o mesmo entendimento, Gimeno Sendra, Moreno Catena e Cortés Domínguez, advertem que “las medidas cautelares son homogéneas, aunque no idénticas, con las medidas ejecutivas a las que tienden a preordenar.” [64]

Segundo Humberto Ávila, “um meio é proporcional quando o valor da promoção do fim não for proporcional ao desvalor da restrição dos direitos fundamentais. Para analisá-lo é preciso comparar o grau de intensidade da promoção do fim com o grau de intensidade da restrição dos direitos fundamentais. O meio será desproporcional se a importância do fim não justificar a intensidade da restrição dos direitos fundamentais.” [65]

Aliás, no art. 20 da lei já se prevê que “em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial”, podendo o Juiz “revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.” Note-se, porém, que com o advento da Lei nº. 12.403/2011, que deu nova redação ao art. 311 do Código de Processo Penal, o Juiz só pode decretar de ofício a prisão preventiva no curso do processo penal. Antes, apenas quando requerida pelo Ministério Público ou representada pela autoridade policial.


VIII – CONCLUSÃO

Diante destas considerações, entendemos que os arts. 17 e 41 da Lei nº. 11.340/2006, além do inciso IV do art. 313 do Código de Processo Penal, não devem ser aplicados, pois, apesar de normas vigentes formalmente (porque aprovadas pelo Poder Legislativo e promulgadas pelo Poder Executivo), são substancialmente inválidas, tendo em vista a incompatibilidade material com a Constituição Federal [66]. Relembremos que “não se pode interpretar a Constituição conforme a lei ordinária (gesetzeskonformen Verfassunsinterpretation). O contrário é que se faz.” [67]

Uma coisa é lei vigente, outra é lei válida.

Vejamos a lição de Miguel Reale:

“Validade formal ou vigência é, em suma, uma propriedade que diz respeito à competência dos órgãos e aos processos de produção e reconhecimento do Direito no plano normativo.” [68]

Nem toda lei vigente é válida e só a lei válida e que esteja em vigor deve ser observada pelos cidadãos e operadores de Direito. [69] Como afirma Enrique Bacigalupo, “la validez de los textos y de las interpretaciones de los mismos dependerá de su compatibilidad con principios superiores. De esta manera, la interpretación de la ley penal depende de la interpretación de la Constitución.” [70]A propósito, Ferrajoli:“Para que una norma exista o esté en vigor es suficiente que satisfaga las condiciones de validez formal, condiciones que hacen referencia a las formas y los procedimientos de acto normativo, así como a la competência del órgano de que emana. Para que sea válida se necesita por el contrario que satisfaga también las condiciones de validez sustancial, que se refieren a su contenido, o sea, a su significado.” Para o autor, “las condiciones sustanciales de la validez, y de manera especial las de la validez constitucional, consisten normalmente en el respeto de valores – como la igualdad, la libertad, las garantias de los derechos de los ciudadanos.” [71] (Grifos no original).Janaína Paschoal adverte: “O perigo que vislumbramos na nova lei é justamente o de, novamente, prevalecer o caminho mais fácil, qual seja o de simplesmente prender-se o agressor, tratando-se como uma ´safada` que gosta de apanhar que, depois de denunciar, se opõe a essa prisão. (...) A idéia de que a Mulher precisa se libertar, psicologicamente, de seu agressor é totalitária, e tão preconceituosa como a que deve se submeter às vontades do marido.” [72]

Não olvidemos, outrossim, que a exclusão do Juizado Especial Criminal para o processo e julgamento de tais crimes só facilitará o transcurso do prazo prescricional (e a extinção da punibilidade), pois, optando por outros procedimentos (especiais ou sumário) certamente a demora na aplicação da pena será bem maior do que, por exemplo, se houvesse a possibilidade (bem ou mal) da transação penal (com a proposta imediata de uma pena alternativa).

Segundo o jornal Folha de São Paulo, edição on line do dia 07 de agosto de 2008, “o número de denúncias de agressões a mulheres no país mais do que dobrou no comparativo do primeiro semestre deste ano em relação a igual período de 2007. Números apresentados nesta quinta-feira pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres com base no número de serviço 180 --a central de atendimento à mulher-- apontam que de janeiro a junho de 2008 foram feitos 121.891 contra 58.417 em igual período de 2007, num incremento de 107,9%. A lei Maria da Penha, que pune com mais rigidez os agressores de mulheres, completa dois anos hoje. Os dados mostram ainda um crescimento quase três vezes e meio superior na quantidade de pessoas que pretendem se informar sobre a lei. Enquanto no primeiro semestre do ano passado 11.020 ligações foram atendidas com o intuito de prestar esclarecimentos sobre a lei, no primeiro semestre de 2008 os atendimentos foram de 49.025. Distrito Federal, São Paulo, Pará e Goiás lideram o ranking das denúncias. Na outra ponta estão Acre, Maranhão e Amazonas. O levantamento mostra que 61,5% das mulheres informaram sofrer agressões diariamente e outras 17,8% são alvo toda semana de destratos. A maior parte das agressões (63,9%) são praticadas pelos próprios companheiros. Em 58,4% dos casos relatados, os agressores estavam bêbados ou eram usuários de drogas. Segundo a subsecretária Aparecida Gonçalves, da área de Enfrentamento à Violência da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, a maior incidência de denúncias na região Centro-Oeste do país se deve ao que ela considera um maior nível de informação a respeito da legislação que estabelece maior rigor nas punições aos agressores de mulheres. Isso relativiza o fato de Estados do extremo do país apareçam nas últimas colocações. "A cada ano temos uma maior divulgação da lei, e a medida que ela passa a ter uma maior efetividade, isso reflete nas denúncias. Só as respostas efetivas aos casos de agressões virão a fortalecer esses números", afirma Gonçalves. Apesar de a maior parcela das agressões ser cometida quando o parceiro está drogado ou bêbado, ela afirma que a questão é cultural. "Se fosse só a agressão em si, ele [agressor] bateria num amigo do bar, não na mulher, ao chegar em casa", afirma. Durante cerimônia ocorrida no Palácio do Planalto, foram mostrados também os resultados de uma pesquisa a respeito da lei Maria da Penha. A pesquisa Ibope/Themis (Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero) --esta última uma ONG gaúcha-- revelou que 68% da população brasileira já ouviu falar da lei. Outros 82% conhecem a sua eficácia. A consulta foi realizada entre os dias 17 e 21 de julho, com 2.002 entrevistados em 142 municípios brasileiros. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos. A pesquisa mostra que 32% não conhece e nem ouviu falar da lei. Um quinto dos pesquisados (20%) respondeu acreditar que a lei Maria da Penha coloca o agressor na cadeia e 33% afirmaram que ela inibe a violência doméstica. Após ser agredida, segundo os respondentes, 38% das mulheres procuram as delegacias especializadas de atendimento à mulher e 19% outras delegacias. Para 42% dos entrevistados, as mulheres não procuram serviço de apoio.”

A título de conclusão, e para refletirmos, oportuna também a transcrição da lição de Roberta Toledo Campos:

“O homem exalta a violência. Virou o grande monstro que ameaça a família. O povo grita por socorro. E o Estado, num ato salvacionista, edita a Lei Maria da Penha. Lógico! Como é inadimplente na implementação dos direitos fundamentais, como educação, saúde, moradia, cultura, emprego etc., e, assim, gerador de muitas das mazelas humanas, faz uso de uma de suas atribuições a mais viável economicamente: o processo legislativo e o sistema penal. Ao criar leis, o Estado transmite ao povo carente de direitos fundamentais a sensação de dever cumprido, já que as leis entram em vigor imediatamente e induzem a ilusão de que agora temos leis fortes, que não deixam mais brechas para a impunidade. (...) Não nos escapa que é momento de refletir sobre a crise da masculinidade e da feminilidade. Há dúvida de que a natureza determina de modo tão sumário a diferença entre masculino e feminino. Homem, mulher, masculino e feminino são construções. Efetivamente, muitos de nós criticamos o modelo masculino ou feminino sob o qual fomos criados. Já se sabe atualmente que é possível ser homem sem ser macho e opressor. O desmoronamento dos modelos tradicionais de gênero é mais uma possibilidade do que uma perda. É a possibilidade de mudança. E é esta crise que nos leva à auto-reflexão para a construção de um novo ser humano. Ser humano este não determinado por sua biologia, mas capaz de encontrar livremente a sua própria identidade, o seu ser, tomando o cuidado para não cometer o erro de supor a possibilidade de uma nova síntese, de uma nova identidade estereotipada. (...) Não é possível diante da principiologia democrática constitucionalizada estabelecer modelos de identidade masculina ou feminina. Estereotipar a identidade em masculino e feminino é, no mínimo, discriminatório. Falar em encontrar uma nova identidade masculina ou feminina é um equívoco. É possível apenas refletir sobre a construção da nova identidade do sujeito constitucional no atual Estado Democrático de Direito.” [73] 

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Notas

1.   Janaína Paschoal, “Mulher e Direito Penal”, Coordenadores: Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 3.

2.   Sobre o assunto, além de vários artigos já publicados na internet, indicamos: “Comentários à Lei de Violência Doméstica e Familiar contr a Mulher”, obra coletiva publicada pela Editora Lumen Juris (2008) e organizada por Adriana Ramos de Mello; “Violência Doméstica”, de Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007; “Violência Doméstica”, de Stela Valéria Soares de Farias Cavalcanti, Salvador: Editora JusPodivm, 2007 e “Estudos sobre as novas leis de violência doméstica contra a mulher e de tóxicos”, obra coletiva coordenada por André Guilherme Tavares de Freitas, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007.

3.   “O declínio primitivo e que deu azo ao presente conflito afirmou não se tratar de violência de gênero, uma vez que as envolvidas são do sexo feminino. Na esteira do vem decidindo o STJ, o sujeito passivo da violência doméstica, objeto da Lei 11.340/06 é a mulher, sendo certo que o sujeito ativo pode ser tanto o homem quanto a mulher, desde que fique caracterizado o vínculo de relação doméstica, familiar ou de afetividade, o que restou cabalmente demonstrado neste autos, de onde exsurge a hipótese contemplada no inciso II, do art. 5º, da Lei da regência. Ademais a condição peculiar da mulher (vítima) prevista no art. 4º, da Lei Especial, está perfeitamente delineada com o fim social a que se destina a legislação em comento. A Lei Maria da Penha é um exemplo de implementação para a tutela do gênero feminino, justificando-se pela situação de vulnerabilidade e hipossuficiência em que se encontram as mulheres vítimas da violência doméstica e familiar” (TJRJ – 8ª C. CC 2009.055.00401 – rel. Gilmar Augusto Teixeira – j.30.09.2009).

4.   “Lesão corporal cometido por sogra à nora. I – Conflito suscitado no juízo criminal comum em face de Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca da Capital, para julgamento de delito praticado na vigência da Lei 11.340/06. II – O artigo 129, § 9º do Código Penal é aplicável às hipóteses de violência doméstica, nas quais a lesão corporal é praticada contra pessoas que integram estrutura familiar, in casu sogra e nora, ligadas, portanto, por laços de afinidade, não importando se entre pessoas do mesmo sexo, amoldando-se os fatos, em consequência, ao disposto 5º e 14 da Lei 11.340/06. Conflito Procedente” (TJRJ – 2ª C. CC 2009.055.00320  – rel. Kátia Jangutta – j.03.09.2009).

5.   O namoro é uma relação íntima de afeto sujeita à aplicação da Lei 11.340/06. Quando a agressão é praticada em decorrência dessa relação, o Ministério Público pode requerer medidas para proteger a vítima e seus familiares. O entendimento é da 6ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça e foi firmado no julgamento do pedido de Habeas Corpus de um agressor que tentava suspender a proibição de chegar a menos de 50 metros da ex-namorada e do filho dela. A restrição foi imposta pela Justiça do Rio Grande do Sul em ação proposta pelo Ministério Público com base na Lei Maria da Penha. A defesa do agressor alegou a inconstitucionalidade da lei por privilegiar a mulher em detrimento do homem, a ilegitimidade do Ministério Público e disse que não havia relação doméstica entre o casal, pois namoraram por pouco tempo, sem a intenção de constituir família. De acordo com o inquérito policial, a vítima trabalhava com o agressor e os dois namoraram por quatro anos. Após o término do relacionamento, o agressor passou a espalhar panfletos difamatórios contra a ex-namorada, pichou o muro de sua residência e é suspeito de ter provocado um incêndio na garagem da casa dela. Seguindo o voto da relatora no STJ, desembargadora convocada Jane Silva, a 6ª Turma negou o pedido. Para a relatora, um namoro de quatro anos configura, para os efeitos da Lei Maria da Penha, relação doméstica ou de família, não simplesmente pela duração, mas porque o namoro é um relacionamento íntimo. A própria lei afasta a necessidade de coabitação para caracterizar a relação íntima de afeto. Assim, o Ministério Público tem legitimidade para propor medidas de proteção. A decisão ressalta ainda que declarar a constitucionalidade ou não da lei é atribuição do Supremo Tribunal Federal. A relatora ainda esclareceu que a 3ª Seção do STJ, no julgamento dos conflitos de competência 91.980 e 94.447, não decidiu se a relação de namoro é ou não alcançada pela Lei Maria da Penha. O entendimento da Corte Superior naqueles casos específicos foi de que a violência praticada contra a mulher não decorria da relação de namoro. De acordo com Jane Silva, quando há a comprovação de que a violência praticada contra a mulher, vítima de violência doméstica por sua vulnerabilidade e hipossuficiência, decorre do namoro e que esta relação, independentemente de coabitação, pode ser considerada íntima, aplica-se a Lei Maria da Penha. (HC 92.875).

6.   Aprovada pela Organização das Nações Unidas em 1979 e ratificada pelo Brasil em 1984.

7.   Firmada em 1994 na cidade brasileira de Belém do Pará, adotada pela Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos em 6 de junho de 1994 e ratificada pelo Brasil em 27 de novembro de 1995.

8.   Pedagogia da Autonomia, São Paulo: Paz e Terra, 35ª. ed., 2007, p. 28.

9.   Como se sabe, a antijuridicidade de um comportamento é composta pelo chamado desvalor da ação e pelo desvalor do resultado; o primeiro, segundo Cezar Roberto Bitencourt, é a “forma ou modalidade de concretizar a ofensa”, enquanto que o segundo é “a lesão ou exposição a perigo do bem ou interesse juridicamente protegido.” Este mesmo autor, citando agora Jescheck, ensina que modernamente a “antijuridicidade do fato não se esgota na desaprovação do resultado, mas que ‘a forma de produção’ desse resultado, juridicamente desaprovado, também deve ser incluído no juízo de desvalor.” (Teoria Geral do Delito, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 121/124). Segundo Luiz Flávio Gomes, deve-se a Welzel “o enfoque do delito como desvalor da ação (negação de um valor pela ação) mais desvalor  do resultado. (...) O delito não é fruto exclusivamente do desvalor do resultado, senão sobretudo (na visão de Welzel) do desvalor da ação, que, no seu sistema, goza de primazia. O desvalor da ação, de qualquer modo, passa a constituir requisito obrigatório de todo delito.” (Estudos de Direito Penal e Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999, pp. 220/221). Assim, é inegável que o estudo da antijuridicidade leva à conclusão de que esta se perfaz não apenas com a valoração do resultado como também (e tanto quanto) com o juízo de valor a respeito da ação (ou omissão). Munõz Conde, na sua Teoria Geral do Delito, explica bem esta dicotomia e a imprescindibilidade da conjunção entre estes dois elementos: “Nem toda lesão ou colocação em perigo de um bem jurídico (desvalor do resultado) é antijurídica, mas apenas aquela que deriva de uma ação desaprovada pelo ordenamento jurídico (desvalor da ação).” Em vista dessa percepção, diz o mesmo autor que o Direito Penal “não sanciona toda lesão ou colocação em perigo de um bem jurídico, mas só aquelas que são conseqüências de ações especialmente intoleráveis.” E continua o mestre espanhol: “Ambos os conceitos, desvalor da ação e desvalor do resultado, são igualmente importantes na configuração da antijuridicidade, de vez que estão perfeitamente entrelaçados e são inimagináveis separados (...), contribuindo ambos, no mesmo nível, para constituir a antijuridicidade de um comportamento.”. (...) “O que sucede é que, por razões de política criminal, o legislador na hora de configurar os tipos delitivos pode destacar ou fazer recair acento em um ou em outro tipo de desvalor.” ((Teoria Geral do Delito, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988, tradução de Juarez Tavares e Luiz Régis Prado, p. 88/89). 

10.   O Princípio da Igualdade no Direito Penal Brasileiro – Uma Abordagem de Gênero, Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2001, p. 174.

11.   Introdução ao Direito Processual Constitucional, Porto Alegre: Síntese, 1999, p. 46.

12.   Sobre a sucessão das leis processuais no tempo, conferir o nosso “Juizados Especiais Criminais”, Salvador: JusPodivm, 2007, págs. 101 a 107.

13.   Processo Penal Brasileiro, Vol. I, p. 169.

14.   Ação Penal nos Crimes Contra os Costumes, de Geraldo Batista de Siqueira, p. 24.

15.   Entendemos que a expressão genérica “prestação de outra natureza” fere o princípio da legalidade. Cezar Roberto Bitencourt afirma que “essa falta de garantia e certeza sobre a natureza, espécie ou quantidade da ´prestação de outra natureza` caracteriza a mais flagrante inconstitucionalidade!”, exatamente por serem inadmissíveis, “em termos de sanções criminais”, “expressões vagas, equívocas e ambíguas”.

16.   Obra citada, p. 3.

17.   Penas e Medidas Alternativas à Prisão, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999, p. 66.

18.   Nicolas Gonzalez-Cuellar Serrano, “Proporcionalidad y Derechos Fundamentales en el Proceso Penal”, Madri: Editorial Colex, 1990, p. 29. 

19.   “O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal”, texto inserto na obra Princípios Penais Constitucionais, Salvador: Editora JusPodivm, 2007, p. 203.

20.   Teoria dos Princípios, São Paulo: Malheiros, 4ª. ed., 2004, p. 131.

21.   O art. 27, porém, exige que “em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei”, bem como ser “garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado.” (art. 28).

22.   Prisão Cautelar – Dramas, Princípios e Alternativas, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 132. 

23.   Leonardo Sica, “Direito Penal de Emergência e Alternativas à Prisão”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 123.

24.   Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. X, Tomo I, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1984, p. 139.  

25.   História e Prática do Habeas Corpus, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1999, p. 39.

26.   Comentários à Constituição do Brasil, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 312.

27.   É bem verdade que a 2ª. Turma do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada no dia 30 de outubro de 2007, no julgamento do Habeas Corpus nº. 90.617-6/PE, tendo como Relator o Ministro Gilmar Mendes, concedeu a ordem para determinar o retorno ao cargo de um Desembargador, réu em uma ação penal originária. No voto do relator ficou consignado o seguinte: (...) Conforme asseverei na oportunidade da apreciação e julgamento da questão de ordem apreciada por  esta Colenda Segunda Turma em sessão de 19.6.2007: “Para a análise do alegado excesso de prazo, inicialmente, surgiria a questão preliminar quanto ao cabimento do presente writ. Assim, um argumento usual em inúmeros julgados deste Supremo Tribunal Federal é o de que este pedido de habeas corpus não poderia ter seguimento porque o acórdão impugnado não afetaria diretamente a liberdade de locomoção do paciente. A prevalecer esse entendimento, reiterado em diversos casos pela jurisprudência desta Corte, revelar-se-ia incabível o manejo do HC na situação dos autos. Nesse sentido,  arrolo os seguintes precedentes: HC no 84.816-PI, Rel. Min. Carlos Velloso (2ª Turma, unânime; DJ 6.5.2005); HC nº 84.420- PI, Rel. Min. Carlos Velloso (2ª Turma,unânime; DJ 27.8.2004); HC (AgR) no 84.326-PE, Rel. Min. Ellen Gracie (2ª Turma,unânime; DJ 1o.10.2004); HC nº 83.263-DF,Rel. Min. Nelson Jobim (2ª Turma, unânime;DJ 16.4.2004); HC no 77.784-MT, Rel. Min.Ilmar Galvão (1ª Turma, unânime; DJ 18.12.1998)” – (Voto proferido pelo Min.Gilmar Mendes no HC-QO nº 90.617/PE,julgada em 19.6.2007, 2ª Turma, maioria, DJ 6.9.2007).Naquela assentada (19.6.2007), asseverei ainda, verbis:“Em que pese a extensão e a amplitude que essa interpretação tem assumido em nossa jurisprudência, não me impressiona o argumento de que habeas corpus é o meio adequado para proteger tão-somente o direito de ir e vir do cidadão em face de violência, coação ilegal ou abuso de poder”- (Voto proferido pelo Min. Gilmar Mendes no HC-QO nº 90.617/PE, julgada em 19.6.2007, 2ª Turma, maioria, DJ 6.9.2007).A esse respeito, devo frisar que, no caso concreto, a decisão do STJ determinou o afastamento do paciente do cargo de Desembargador do TJ/PE e tal situação  perdura por mais de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses, sem que a instrução criminal tenha sido devidamente concluída. Isto é, os impetrantes insurgem-se não exatamente contra o simples fato do afastamento do paciente do cargo que ocupava na magistratura, mas sim em face de uma situação de lesão ou ameaça a direito que persiste por prazo excessivo e que, exatamente por essa razão, não pode ser excluído da proteção judicial efetiva (CF, art. 5o,XXXV).Ainda, reiterando manifestação anterior, creio como pertinente a transcrição dos seguintes argumentos no voto que proferi em 19.6.2007:“Nestes termos, considerada essa configuração fática excepcional, entendo ser o caso de se estabelecer um distinguishing com relação à referida jurisprudência tradicional deste Tribunal quanto à matéria do cabimento do hábeas corpus. Entendo que o writ é cabível porque, na espécie, discute-se efetivamente aquilo que a dogmática constitucional e penal alemã – a exemplo da ilustre obra Freiheitliches Strafrecht (‘Direito Penal Libertário’), de Winfried Hassemer, – tem denominado Justizgrundrechte. Essa expressão tem sido utilizada para se referir a um elenco de normas constantes da Constituição que tem por escopo proteger o indivíduo no contexto do processo judicial.Não tenho dúvidas que o termo seja imperfeito, uma vez que, amiúde, esses direitos transcendem a esfera propriamente judicial. Assim, à falta de outra denominação genérica, também nós optamos por adotar designação assemelhada – direitos fundamentais de caráter judicial e garantias constitucionais do processo –,embora conscientes de que se cuida de denominações que pecam por imprecisão. De toda forma, independentemente dessa questão terminológica, um elemento decisivo é o de que, no caso concreto ora em apreço, invoca-se garantia processual de natureza judicial e administrativa, que tem repercussão direta quanto ao devido processo legal penal e à dignidade pessoal e profissional do paciente.Desse modo, o tema da razoável duração do processo (CF, art. 5o, LXXVIII), por expressa disposição constitucional, envolve não somente a invocação de pretensão à ‘direito subjetivo’ de célere tramitação dos processos judiciais e administrativos,mas também, o reconhecimento judicial de ‘meios que garantam a celeridade de sua tramitação’. Em outras palavras, a interpretação desse dispositivo também está relacionada à efetivação de legítimas garantias constitucionais como mecanismos de defesa e proteção em face de atrocidades e desrespeitos aos postulados do Estado democrático de Direito (CF, art. 1o).Nesse particular, entendo que,preliminarmente, o habeas corpus é garantia cabível e apta para levar ao conhecimento deste Tribunal a apreciação do tema do excesso de prazo para a instrução criminal.É dizer, embora a decisão impugnada não repercuta diretamente no direito de ir e vir do paciente (liberdade de locomoção stricto sensu), observa-se situação de constrangimento ilegal decorrente de mora na prestação jurisdicional no âmbito processual penal” – (Voto proferido pelo Min. Gilmar Mendes no HC-QO nº 90.617/PE,2ª Turma, maioria, DJ 6.9.2007). No caso concreto, tal constrangimento corresponde à persistência do afastamento cautelar desde o recebimento da denúncia pelo STJ.A viabilidade deste writ se dá, portanto, em razão de que o afastamento cautelar do paciente tem perdurado por lapso temporal excessivo.Este habeas corpus foi impetrado em 7 de fevereiro de 2007. O julgamento da questão de ordem ocorreu em 19.6.2007, cujo acórdão foi publicado em 6.9.2007. Hoje, completam-se 8 meses e 23 dias desde a impetração.Friso que, no feito penal em andamento perante a Corte a quo, a suposta vítima (MARIA SORAIA ELIAS PEREIRA), vem tumultuando a regular instrução do feito (AP nº 259/PE), seja por ter obstado a realização de perícia no período de , seja por meio da apresentação de sucessivos pedidos de substituição de testemunhas, os quais apesar de indeferidos pelo STJ, têm contribuído para que, até o presente momento (informações disponíveis na página oficial do STJ - www.stj.gov.br), a instrução ainda não tenha se encerrado. Em conformidade com a orientação jurisprudencial acima mencionada, constato a configuração de excessiva mora da instrução criminal e verifico patente situação de ilegalidade apta a ensejar a concessão da ordem. Ademais, entendo que, em princípio, a excessiva mora processual verificável de plano, nestes autos, configura-se como aquilo que, em matéria de ilegítima persistência dos efeitos da custódia cautelar, ambas as Turmas deste STF têm denominado como “excesso de prazo gritante”. Nesse sentido, arrolo alguns processos nos quais foi adotado o parâmetro de moras processuais superiores a 2 (dois) anos para o deferimento da ordem, a saber: HC no 87.913/PI, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, unânime, DJ 5.9.2006; HC no 84.095/GO, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, unânime, DJ 2.8.2005; HC no 83.177/PI, Rel. Min. Nelson Jobim, Segunda Turma, unânime, DJ 19.3.2004; HC no 81.149/RJ, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma,unânime, DJ 5.4.2002. Nestes termos, diante de excepcional situação de excesso de prazo para a conclusão da instrução criminal verificável neste caso concreto, defiro a ordem tão-somente para suspender os efeitos da decisão da Corte Especial do STJ que impôs o afastamento do cargo nos termos do art. 29 da LC no 35/1979, e determino, por conseqüência, o retorno do ora paciente à função de magistrado perante o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJ/PE).”

28.   Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro, São Paulo: Saraiva, 1993, p.121/123.

29.   O Direito à Defesa na Constituição, São Paulo: Saraiva, 1994, p. 33.

30.   Teoria Geral do Processo, São Paulo: Malheiros, 1995, p. 52.

31.   É cediço que o princípio da proporcionalidade está implícito na Constituição Federal. Os princípios implícitos, como se sabe, “podem ser apreendidos a partir de uma pluralidade, mais ou menos vasta, de normas explícitas, ou ainda ser extraídos não mais de uma pluralidade de disposições, mas de uma única disposição. Isso se dá toda vez que de uma única disposição se extrai, além da norma expressa que constitui seu significado, também uma norma ulterior implícita. Finalmente, restam aqueles princípios totalmente implícitos, que são deduzidos não de uma disposição, mas da ´natureza das coisas`, da ´Constituição material`, do sistema jurídico como um todo, de outros princípios implícitos à sua volta, e assim por diante.” Quanto à proporcionalidade, “sua natureza de princípio jurídico é evidenciada quando, à parte da generalidade e do aspecto vago do que impõe (...), é possível também verificar que se encontra entre as normas superiores do ordenamento jurídico, de nível constitucional, razão pela qual norteia toda a atividade penal, seja no âmbito legislativo, seja na aplicação da lei aos casos concretos.” (Mariângela Gama de Magalhães Gomes, “O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 58, com grifo nosso).

32.   Em sentido contrário, na sessão realizada no dia 1º. de junho de 2007, a 1ª. Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal concluiu que o crime de lesão corporal leve, praticado contra a mulher independe de representação da vítima. A conclusão, por maioria de votos, foi uma resposta a recurso do Ministério Público. De acordo com a Turma, a nova lei propõe uma reflexão sobre o problema da violência doméstica e abre a oportunidade para que os operadores do direito assumam uma postura corajosa diante da questão. O voto condutor do acórdão destaca as agressões como “atitudes covardes de homens que resolvem abandonar seu perfil natural de guardiões do lar para se transformarem em algozes e carrascos cruéis de sua própria companheira”. Um dos três votos proferidos no julgamento seguiu outro posicionamento (Processo nº. 20060910173057). Este mesmo Tribunal, porém, um mês depois desta primeira decisão, seguiu outro entendimento: “TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL - 1ª. TURMA CRIMINAL – EMENTA: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER - AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO. Com base na interpretação sistemática, a Egrégia Primeira Turma Criminal concluiu que o legislador, ao disciplinar no art. 41 da Lei nº 11.340/2006 que nos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não se aplica a Lei nº 9.099/1995, pretendeu apenas vedar os institutos despenalizadores nela previstos, subsistindo a incidência do art. 88, que condiciona à representação da vítima a ação penal nos crimes de lesão corporal leve e de lesão corporal culposa. O entendimento pela exclusão completa da lei em casos tais, conforme destacado, resultaria em verdadeiro contra-senso, uma vez que o Código Penal exige a representação em hipóteses de crimes mais graves, como estupro e atentado violento ao pudor, e a própria Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) impõe, em seu art. 12, que a autoridade policial, no momento do registro da ocorrência, tome a representação da vítima a termo, cuja retratação, a teor do art.16, somente é possível perante o juiz, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público, a fim de que seja constatada a inexistência de coação por parte do agressor.” (20060910172536 RSE, Rel. Des. MARIO MACHADO. Data do Julgamento 12/07/2007).

33.   Apud José Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal, Campinas: Bookseller, 1998, Vol. I, p. 79.

34.   Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 79.

35.   O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 59.

36.   Apud Mariângela Gama de Magalhães Gomes, “O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 60.

37.   Obra citada, p. 67.

38.   “Reflexiones sobre el significado del principio constitucional de igualdad”, artigo que compõe a obra coletiva denominada “El Principio de Igualdad”, coordenada por Luis García San Miguel, Madri: Dykinson, 2000, p. 206.

39.   Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, São Paulo: Malheiros, 1999, 3ª. ed., 6ª. tiragem, p. 47.

40.   Valores Constitucionais e Direito Penal, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1989, p. 117.

41.   Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra: Almedina, 6ª. ed., p. 1.151.

42.    Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Atlas, 1997, p. 28.

43.    Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2ª. ed., p. 69.

44.    Juizados Especiais Criminais e Alternativas à Pena de Prisão, Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 3ª. ed., p. 59.

45.   Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCrim, n.º 57, agosto/1997.

46.   Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo Penal, São Paulo: Saraiva, Vol. II, 12ª. ed. p. 503.

47.   “TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS - SEÇÃO CRIMINAL - CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 590-9/194 (200603891424) - Relator: Des. Elcy Santos de Melo - EMENTA: Processual Penal. Conflito negativo de competência. Juizado Especial Criminal. Citação pessoal. Autor do fato não encontrado. Deslocamento da competência. Justiça Comum. Art.66, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95. Encontrando-se o autor do fato em local incerto e não sabido e, portanto, inadmissível a sua citação pessoal, correta a postura do juiz do Juizado Especial Criminal em determinar a remessa dos autos para a Justiça Comum, a teor do que determina o art. 66, parágrafo único, da Lei n.9.099/95, ali firmando a sua competência, ainda que presente nos autos o endereço atualizado do acusado ou sendo este encontrado após o deslocamento processual.Conflito provido.” Idem: “TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS - Ementa: Processual Penal. Conflito negativo de jurisdição. Juizado Especial Criminal. Citação pessoal. Paciente não encontrado. Modificação da competência para o juízo comum: artigo 66, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95. Conflito procedente. Não localizado o autor do fato delituoso para a citação na forma pessoal perante o juizado especial criminal, dá-se o deslocamento da competência para o juízo criminal comum julgar e processar o feito, nos termos do artigo 66, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95. Conflito conhecido e provido. Competência do juiz suscitado.” (Conflito de Competência nº. 520-4/194 - 200400741029 – Rel. Des. Floriano Gomes).

48.   Lei dos Juizados Especiais Criminais (com Geraldo Prado), Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 15.

49.   Teoria Geral do Procedimento e o Procedimento no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, pp. 67/69.

50.   Luciana Russo, “Devido processo legal e direito ao procedimento adequado”, artigo publicado no jornal “O Estado do Paraná”, na edição do dia 26 de agosto de 2007.

51.   E também dos Juizados Especiais Criminais, cuja competência encontra sede igualmente na Carta Magna.

52.   Repetimos: e também dos Juizados Especiais Criminais.

53.   Idem.

54.   Segundo José Afonso da Silva, entre nós, este “sistema foi originariamente instituído com a Constituição de 1891 que, sob a influência do constitucionalismo norte-americano, acolhera o critério de controle difuso por via de exceção, que perdurou nas constituições sucessivas até a vigente.” (Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo: Malheiros, 10ª. ed., 1995).  

55.   Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva, 17ª. ed., 1989, p. 34.

56.   Indícios da autoria e prova da existência do crime.

57.   Prado, Fabiana Lemes Zamalloa do. A prisão preventiva na Lei Maria da Penha. Disponível na internet www.ibccrim.org.br 25.10.2007

58.   Expressão por demais genérica e, exatamente por isso, imprópria para autorizar uma custódia provisória que, como se sabe, somente se justifica no processo penal como um provimento de natureza cautelar. Há mais de dois séculos Beccaria já preconizava que “o réu não deve ficar encarcerado senão na medida em que se considere necessário para o impedir de escapar-se ou de esconder as provas do crime” (Dos Delitos e das Penas, São Paulo: Hemus, 1983, p. 55), o que coincide com dois outros requisitos da prisão preventiva em nosso País (conveniência da instrução criminal e asseguração da aplicação da lei penal). Decreta-se a prisão preventiva no Brasil, muitas vezes, sob o argumento de se estar resguardando a ordem pública, quando, por exemplo, quer-se evitar a prática de novos delitos pelo imputado ou aplacar o clamor público. Não raras vezes vê-se prisão preventiva decretada utilizando-se expressões como “alarma social causado pelo crime” ou para “aplacar a indignação da população”, e tantas outras frases (só) de efeito.

59.   Evidentemente que este requisito não pode ser levado em conta para se decretar uma prisão preventiva, mesmo porque, “nota-se que a magnitude da lesão é conseqüência do crime, fator que deve ser levado em consideração para a aplicação da pena (art. 59, CP).” Logo, “este dispositivo é flagrantemente inconstitucional, sua aplicação virá a macular todos os atos que se lhe seguirem”: eis a lição de Roberto Podval. (Leis Penais e Sua Interpretação Jurisprudencial, Vol. I, São Paulo: Revista dos Tribunais, 7ª. ed., 2001, p. 896). Já Manoel Pedro Pimentel perguntava: “Como se há de aferir esse elemento normativo – magnitude da lesão causada – se não for através de critério subjetivo, que pode variar amplamente, já que a lei não define quantitativa ou qualitativamente tal magnitude? (Apud João Gualberto Garcez Ramos, “A Tutela de Urgência no Processo Penal Brasileiro”, Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 145).

60.   Derecho Procesal Penal, Madrid: Colex, 3ª. ed., 1999, pp. 522/523. 

61.   Como afirma Denilson Feitoza Pacheco, “a importância da afetação negativa causada pela medida cautelar pessoal deve estar justificada pela importância da realização do fim perseguido por essa intervenção no direito fundamental.” (O Princípio da Proporcionalidade no Direito Processual Penal Brasileiro, Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2007, p. 261).

62.   Apud Rogerio Schietti Machado Cruz, “Prisão Cautelar – Dramas, Princípios e Alternativas”, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 100.

63.   Mariângela Gama de Magalhães Gomes, “O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 213.

64.   Derecho Procesal Penal, Madri: Editorial Colex, 3ª. ed., 1999, p. 475.

65.   Teoria dos Princípios, São Paulo: Malheiros, 4ª. ed., 2004, p. 131.

66.   O recurso nº 2007.023422-4, apresentado pelo Ministério Público Estadual contra decisão do juiz de Itaporã (MS), o qual reconheceu a inconstitucionalidade da Lei nº. 11.340/06, denominada "Lei Maria da Penha", foi julgado pela 2ª. Turma Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que manteve a decisão de primeira instância. O Magistrado de primeiro grau alegou que a referida lei "criou discriminação, pois coíbe a violência contra a mulher e não a que porventura exista contra homens". Em sede recursal, na última sessão de julgamentos da 2ª Turma Criminal, ocorrida no dia 19//2007, o relator do processo, Desembargador Romero Osme Dias Lopes, já havia manifestado seu voto, mantendo a decisão do juiz singular e sustentando que a "Lei Maria da Penha" desrespeita os objetivos da República Federativa do Brasil, pois fere os princípios da proporcionalidade e da igualdade. Na seqüência, o Desembargador Carlos Eduardo Contar pediu vista dos autos para melhor embasar seu voto e, assim, a sessão foi adiada. Na pauta de julgamentos desta quarta-feira (26/9/2007), Des. Contar apresentou seu voto, acompanhando o relator; mantendo a decisão de primeiro grau; negando, portanto, provimento ao recurso do Ministério Público; e, também, reconhecendo, neste caso específico, a inconstitucionalidade da Lei nº 11.340/06, "Lei Maria da Penha". O Des. Contar, em seu voto, reafirma os direitos fundamentais garantidos, igualmente, aos homens e às mulheres, e que qualquer medida protetiva de cunho infraconstitucional configura-se em afronta à isonomia entre os gêneros prevista na Constituição. "(...) Quando a Carta Magna, dentre o rol de direitos fundamentais, consagrou igualdade entre homem e mulher, estabeleceu uma isonomia plena entre os gêneros masculino e feminino, de modo que a legislação infraconstitucional não pode - sob qualquer pretexto - promover discriminação entre os sexos, em se tratando de direitos fundamentais, eis que estes já lhes são igualmente assegurados", afirmou o Desembargador. Assim, ao concluir seu voto, Des. Contar sustenta que a "Lei Maria da Penha" "viola o direito fundamental à igualdade entre homens e mulheres", razão pela qual reconhece, para este caso concreto, a inconstitucionalidade da referida norma jurídica. O desembargador Claudionor Miguel Abss Duarte também votou como o relator, de modo que a decisão da 2ª Turma Criminal do TJMS foi unânime. Fonte: Secretaria de Comunicação Social do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul.

67.   STJ, Rel. Min. ADEMAR MACIEL, DJU 3.4.95, p.8.149.

68.   Lições Preliminares de Direito, São Paulo: Saraiva, 19ª. ed., 1991, p. 114.

69.   Como ensina Gilberto Thums, “não basta que existam leis com vigência, é necessário que sejam válidas e somente possuem validade as leis que se harmonizam com os princípios fundamentais da Constituição. (...) Portanto, todas as normas infraconstitucionais  que não correspondem, quanto ao seu conteúdo, aos princípios constitucionais, embora formalmente vigentes (validade formal), seriam materialmente inconstitucionais, podendo o juiz negar sua aplicação.” (Sistemas Processuais Penais, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 172, com grifo nosso).

70.   “Principios Constitucionales de Derecho Penal”, Buenos Aires: Editorial Hamurabi, 1999, p. 232.

71.   Derecho y Razón – Teoria del Garantismo Penal, Madri: Editorial Trotta S.A., 3ª. ed., 1998, p. 874.

72.   Obra citada, p. 3.

73.   Campos, Roberta Toledo. Aspectos constitucionais e penais significativos da Lei Maria da Penha. Disponível na internet www.ibccrim.org.br 04.09.2007.

 

 

Sobre o autor
Rômulo de Andrade Moreira

Procurador-Geral de Justiça Adjunto para Assuntos Jurídicos do Ministério Público do Estado da Bahia. Foi Assessor Especial da Procuradoria Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador - UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador - UNIFACS (Curso então coordenado pelo Jurista J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e Membro fundador do Instituto Baiano de Direito Processual Penal (atualmente exercendo a função de Secretário). Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Integrante, por quatro vezes, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação dos Cursos JusPodivm (BA), Praetorium (MG) e IELF (SP). Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados no Brasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOREIRA, Rômulo Andrade. O STF e a Lei Maria da Penha: uma lamentável decisão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3145, 10 fev. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21057. Acesso em: 22 nov. 2024.

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