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Operação Faktor da Polícia Federal: direitos individuais e licitude das provas

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19/01/2013 às 13:04
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3 OPERAÇÃO FAKTOR DA POLÍCIA FEDERAL

As investigações da Polícia Federal, inicialmente denominada Operação Boi Barrica[43], tinham como objetivo apurar saques realizados por Fernando (José Macieira) Sarney, filho do Senador pelo Estado do Maranhão José (Ribamar Ferreira Araújo da Costa) Sarney, durante a campanha eleitoral de Roseana Sarney (Murad) para o governo do Estado do Maranhão.

3.1 OBJETIVOS DA INVESTIGAÇÃO E CONTEXTO POLÍTICO

O principal objetivo da investigação era apurar o saque de dois milhões de reais em dinheiro por Fernando Sarney, então suspeito de fazer “caixa dois” na campanha de Roseana Sarney.[44] Neste período, chamou a atenção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), as “movimentações financeiras atípicas em contas bancárias de Fernando José Macieira Sarney, de sua esposa, Teresa Cristina Murad Sarney, da empresa Gráfica Escolar (que imprime O Estado do Maranhão)”[45], que por sua vez é ligada ao Grupo Mirante de Comunicação (afiliada Rede Globo no Maranhão).

A operação teve início investigando a possível existência de “caixa dois” durante a campanha de Roseana Sarney, mas foi revelado um grande esquema criminoso. Polícia Federal e Ministério Público Federal “investigaram um megaesquema criminoso com tentáculos em vários estados e órgãos estratégicos da administração federal – principalmente nos setores elétrico e de transportes”[46], motivo pelo qual Fernando Sarney foi indiciado em 15 de julho de 2009 por lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, falsidade ideológica e gestão irregular de instituição financeira.

3.2 NULIDADE DAS PROVAS DA OPERAÇÃO FAKTOR

A nulidade das provas colhidas durante a Operação Faktor foi declarada pelo Superior Tribunal de Justiça em relatório de autoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, datado de 15 de setembro de 2011[47]. O Ministro faz apontamentos quanto à fundamentação da sentença que autorizou as interceptações, assim como as diligências realizadas durante o inquérito policial, que podem ser cruciais para se chegar a uma conclusão sobre a justiça ou até mesmo legalidade (no sentido de obediência à lei) do acórdão em questão.

O Ministro-relator levanta como principais motivos para declarar a nulidade das provas os seguintes: a) ausência de diligências ou outros meios hábeis que tendessem buscar provas para o embasamento da opinio delicti; b) ausência de fundamentação idônea da decisão que autorizou a quebra do sigilo fiscal; c) utilização da quebra de sigilo como instrumento de devassa indiscriminada, com ofensa à garantia constitucional da intimidade e da privacidade; d) contaminação das quebras de sigilo posteriores; e) utilização da quebra de sigilo fiscal como origem propriamente dita das investigações (instrumento de busca generalizada).

A problemática da decisão não gira entorno tão-somente da suposta ofensa à garantia constitucional da intimidade e privacidade, mas principalmente ao que foi chamado de “instrumento de busca generalizada” pelo Ministro-relator, cuja decisão critica duramente que a autoridade policial não demonstrou a impossibilidade de utilização de outros meios de prova, assim como não indicou o nexo entre a interceptação e a impossibilidade de colheita de provas por outros meios menos invasivos, e concluiu que a gravidade das infrações ou sua repercussão não sustentam a devassa da intimidade, que é medida de exceção. É relevante analisar neste momento se os crimes em questão, em razão de sua natureza, deixam outras evidências que poderiam ser descobertas sem a utilização de quebras de sigilo telefônico, de dados e fiscal.

Sobre a colheita de prova no crime organizado, ROESLER[48] aponta:

Entretanto, em meio a uma legislação criminal decadente e confusa, a impunidade cresce e ganha relevo no sistema judiciário brasileiro. A impunidade é danosa ao equilíbrio social e torna impossível a realização de justiça, conceito tão aclamado pela sociedade atual. Nos delitos que causam lesão ao erário, no tráfico de entorpecentes e no crime organizado, especialmente, a obtenção das provas é difícil e demorada. Muitas vezes esta só é conseguida por meio de violações à intimidade e à vida privada. Apesar da inadmissibilidade das provas ilícitas, não é possível que os interesses individuais dos delinquentes se sobreponham aos da sociedade organizada.

Para GOMES FILHO[49], é possível que a prova do crime somente possa ser obtida através de interceptação “diante da forma de execução do crime, da urgência na sua apuração, ou então da excepcional gravidade da conduta investigada, a ponto de justificar-se a intromissão”. Para o autor, ao autorizar a interceptação, “não pretendeu a Constituição, certamente, outorgar uma carta branca para que o legislador ordinário autorizasse o seu emprego na apuração de todos os crimes punidos com reclusão”, pois “somente diante da excepcional gravidade de certos delitos ou da forma particular da execução de outros (como, v.g. ameaça ou injúria cometidas por telefone), é que seria justificável” tal invasão da privacidade.

FERNANDES[50] ressalta que “a interceptação só será admitida se não houver outro meio disponível para obtenção da prova (inciso II) ou seja, é necessário que seja o único meio para evidenciar a autoria e a materialidade.”

Até o momento, parece estar superado o argumento da ausência de diligências ou outros meios hábeis que tendessem buscar provas para o embasamento da opinio delicti.

Quanto à ausência de fundamentação idônea da decisão que autorizou a quebra do sigilo fiscal, fundamentou o relator:

No tocante ao pedido de interceptação telefônica, “a decisão é extremamente confusa e lacônica”. Em que pese ter sido a primeira decisão deferindo o monitoramento telefônico, fala em “inclusão de novos terminais”, pertencentes a pessoas, cuja quebra de sigilo já foi autorizada. Tudo leva a crer que o Magistrado estivesse se referindo, na verdade, aos autos 2007.23.00.001751-0 que tratam da quebra de dados telefônicos e não de interceptação! Por conta desta sutil confusão, a autoridade judicial acabou por deferir a interceptação telefônica sem qualquer fundamentação específica, como se estivesse tratando de uma simples prorrogação. O pior é que, na sequência, a decisão transcreve (ctrl-c/ctrl-v) o mesmíssimo trecho das já mencionadas decisões de quebra de sigilos bancários, fiscal e de dados telefônicos, cuja ilegalidade foi anteriormente demonstrada.

Destaca-se que a fundamentação dessa decisão é a mesma daquela que, proferida por outro juiz, havia, em dezembro de 2006, autorizado a quebra de sigilo bancário dos investigado e que, aqui, ainda não figura o paciente em tal condição.

Estamos diante, em que pese a excepcionalidade da situação, de uma cola/copia, o que autoriza as mesmas observações referentes à decisão anterior: ausência de qualquer referencia a outras investigações ou quanto à impossibilidade de se utilizar outros meios de prova para se apurar os fatos descritos pelo COAF, além de conclusões subjetivas quanto a eventual ocorrência de crime.

Depreende-se do trecho acima o apego à formalidade e à estrita legalidade ao tratar da confusão entre os termos “quebra de sigilo de dados telefônicos” e “interceptação”, o que, supostamente, teria afetado a especificidade da fundamentação da decisão que autorizou a interceptação.

Aponta PRADO[51] que os dados não são objeto da proteção constitucional, “mas sim a sua comunicação, que poderá excepcionalmente ser afetada, quando de outro modo não for possível apreender a informação”. Esclarecendo, o autor explica que o critério de exceção da proteção é ditado pela “instantaneidade da comunicação telefônica, não permitindo a apreensão da informação, de outro modo, para fim de prova”. Seguindo a mesma lógica, “a comunicação de dados, por qualquer meio automatizado, desde que os dados repousem em banco de dados ou similar não é passível de interceptação”.

É possível concluir que não são as formas de comunicação, mas a comunicação em si que é protegida pela Constituição Federal, e que a interceptação só será autorizada quando esta se caracterizar pela instantaneidade, ou seja, não puder ser apreendida de outra forma. Se o critério para interceptar dados de comunicação e a comunicação telefônica parece ser o mesmo, não poderia também a fundamentação para autorizar ambas as hipóteses de quebra ser a mesma? Ainda que haja uma visão negativa quanto à utilização da mesma fundamentação para casos diversos (conhecido como cola/copia), é importante lembrar que se tratava da mesma investigação e das mesmas pessoas, quando fundamentar de modo diverso parece mais apelar para a criatividade do que para novos embasamentos jurídicos.

Ainda, o Ministro-relator, em desfavor da decisão que autorizou as quebras de sigilo da Operação Faktor, aponta que as interceptações foram utilizadas como instrumento de devassa indiscriminada, sendo que a quebra do sigilo fiscal foi a origem propriamente dita das investigações, o que constitui instrumento de busca generalizada.

Importante destacar o marco inicial das investigações: o Relatório de Inteligência Financeira (RIF) elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).O RIF “faz parte da rotina policial em todo o País e compõe mais de 80% dos inquéritos que envolvem crimes financeiros, segundo delegados da Polícia Federal”[52] Entretanto, nos autos do HC191378/DF, o Ministro Sebastião Reis Júnior entendeu que relatório do COAF – órgão de inteligência do Ministério da Fazenda, responsável pela prevenção e pelo combate ao crime de lavagem de dinheiro – não é documento hábil para lastrear quebra de sigilo fiscal e bancário.

Importante ressaltar o papel do COAF, conforme determina a L. 9613/1998[53]:

Art. 14. É criado, no âmbito do Ministério da Fazenda, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas nesta Lei, sem prejuízo da competência de outros órgãos e entidades.

§ 1º As instruções referidas no art. 10 destinadas às pessoas mencionadas no art. 9º, para as quais não exista órgão próprio fiscalizador ou regulador, serão expedidas pelo COAF, competindo-lhe, para esses casos, a definição das pessoas abrangidas e a aplicação das sanções enumeradas no art. 12.

§ 2º O COAF deverá, ainda, coordenar e propor mecanismos de cooperação e de troca de informações que viabilizem ações rápidas e eficientes no combate à ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores.

§ 3º O COAF poderá requerer aos órgãos da Administração Pública as informações cadastrais bancárias e financeiras de pessoas envolvidas em atividades suspeitas.

Art. 15. O COAF comunicará às autoridades competentes para a instauração dos procedimentos cabíveis, quando concluir pela existência de crimes previstos nesta Lei, de fundados indícios de sua prática, ou de qualquer outro ilícito.

Sobre o relatório do Ministro, SILVA[54]opina que não pode haver prova mais fidedigna do que a quebra de sigilo fiscal e bancário nos crimes financeiros:

A quebra de sigilo fiscal e bancário e a posterior perícia realizada nos documentos por ela fornecidos é a melhor forma de identificar e lastrear o caminho percorrido pelo dinheiro em crimes contra ordem tributária, contra o sistema financeiro, de lavagem de dinheiro e os que envolvem desvios de verbas públicas.

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Aliás, quanto melhor a prova técnica baseada em dados reais fornecidos por instituições creditícias que eventuais ilações acerca da origem e destino do dinheiro feitas pelo aparelho policial.

Neste sentido, conclui LOPES[55] que é constitucional o acesso às informações do contribuinte para fins fiscais, tendo em vista que o sigilo bancário só tem sentido enquanto protege o contribuinte contra o perigo da divulgação ao público, e não para as autoridades competentes, pois o sigilo não pode admitir que sonegadores, traficantes e corruptos tenham o direito de esconder do fisco seus reais rendimentos.

Assim é que o Fisco, quando acessa dados de operações financeiras não está atropelando os preceitos constitucionais nem os direitos fundamentais, tendo em vista que as informações não vazam detalhes de foro íntimo, por serem meros números, mas além do mais, não há divulgação pública, ficando restritas somente à autoridade competente ao seu exame.

Deste modo, tem-se que a quebra do sigilo bancário e fiscal não representa desrespeito à ordem constitucional, não sendo considerado um atentado à privacidade e à intimidade.

Além disso, “trechos do inquérito da operação Faktor (antiga Boi Barrica) indicam que, antes do pedido de escutas telefônicas, foram levantadas informações sobre as ligações entre suspeitos e empresas responsáveis pelas movimentações financeiras incomuns”[56].

Por fim, importante debruçar-se sobre a teoria dos frutos da árvore envenenada, tendo em vida que as quebras de sigilo posteriores foram consideradas contaminadas. Sobre o tema, ROESLER[57] ensina que “a teoria dos frutos da árvore envenenada consiste na extensão da regra da inadmissibilidade às provas em si mesmas lícitas, mas que tiveram origem em uma prova ilícita”.

A questão das provas ilícitas por derivação foi debatida no item 2, ao tratar das provas lícitas e ilícitas, entretanto apenas no plano teórico. Sua análise concreta demanda um profundo estudo do caso, o que não se faz possível, por não possuir acesso aos autos. Relevante, entretanto, constar a opinião de ROESLER[58]:

Entretanto, a fim de evitar injustiças, surgiu o princípio da proporcionalidade, garantido a aplicação da lei em casos de extrema gravidade, fazendo prevalecer o interesse estatal sobre o particular. [...] a teoria dos frutos da árvore envenenada não pode ser levada ao extremo. Isso porque é de se considerar que a ilicitude não contamina as provas derivadas que, no caso investigado, poderiam ser descobertas de outro modo.

3.3 LICITUDE DAS PROVAS VERSUS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Durante o relatório, o Ministro levanta o seguinte questionamento:

Qual o “valor mais nobre”? O valor de proteção à intimidade das pessoas ou o da busca da verdade nos processos? Qual o limite da relativização dos direitos fundamentais? Quais os “limites” do direito à prova? O “modo de agir” pode valer mais do que o “resultado”? Como devem ser vistas as regras probatórias?

Para ele, a questão em debate não é nada simples, e aponta que “é indispensável observar os fundamentos da “proporcionalidade”, sob pena de se “banalizar” e até mesmo “vulgarizar” muitas das “garantias constitucionais”, que é o caso da privacidade e intimidade.

O debate jurídico levantado por ocasião do julgamento foi intenso. Há quem defenda, a exemplo de Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, advogado e ex-secretário de Justiça de São Paulo, que a decisão foi acertada, tendo em vista que o direito à privacidade está garantido na Constituição.[59]

Neste mesmo sentido, aponta BOTTINI[60]:

Na verdade, critica-se a decisão dos Ministros exatamente pelo que ela tem de melhor: o cumprimento da lei, que reserva às interceptações o caráter excepcional, determinando sua utilização quando nenhuma outra forma de investigação pode ser adotada. No Brasil, no entanto, os juízes de primeira instância, em inúmeras oportunidades, ignoram este preceito, cabendo às Cortes superiores restabelecer a lei.

Em entendimento diverso, que parece mais acertado, posiciona-se Miguel Reale Júnior, que considerou esdrúxula a decisão do Superior Tribunal de Justiça. Para o professor titular de direito penal da Universidade de São Paulo, “é “evidente” que o alerta feito pelo COAF deve levar a investigações com quebra de sigilos”, e tendo em vista a natureza das investigações, “as provas que alimentam as ações penais nesse tipo de caso são aquelas baseadas na quebra dos sigilos”. Para ele, tal decisão é preocupante, “pois estende muito a interpretação do que pode ser considerado prova ilícita”.[61]

Para o Ministério Público Federal, a decisão viola diversos dispositivos da Constituição Federal, além do que o argumento da Sexta Turma quanto ao esgotamento de outros meios de prova, como condição para a quebra de sigilo, é “frágil” e “insustentável”[62].

Sobre a questão, MORAES[63]acredita que “nenhuma liberdade individual é absoluta” sendo possível a interceptação “sempre que as liberdades públicas estiverem sendo utilizadas como instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas”:

Os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5º da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, nem tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito.[64]

Para PRADO[65], a privacidade não pode servir de impedimento para revelar fatos do interesse público ou comum:

Considerando a importância do privado, o legislador constituinte marcou posição, assegurando a esfera mínima de inviolabilidade, sem prejuízo de delimitar, obedecendo a critério de transparência, o direito de informação – art. 5º, inciso XIV, da CR – quer quanto a ser informado como quanto a informar, de acordo com a ética e velando pelo princípio da autenticidade do que se informa. Neste tópico convém frisar que a adoção do princípio da proporcionalidade ou razoabilidade há de ser invocado para resolver eventual conflito produzido pela colisão dos direitos fundamentais, porém, fica evidente o desígnio do legislador de que não existe uma esfera absoluta de privacidade, quando o processo comunicativo versar sobre fatos do interesse público ou comum.

Também no sentido da imprescindibilidade da quebra do sigilo das comunicações, aponta BERTAZZO[66]:

Em relação aos fins desse meio eletrônico de captação de prova, não restam dúvidas que visa combater a macrocriminalidade, a criminalidade organizada. Conforme aludido diversas vezes, o Estado não pode ficar inerte face ao avanço tecnológico do modus operandi dos crimes cometidos por organizações criminosas. Deve haver a regulamentação rigorosa de meios e mecanismos que permitam o Estado ter paridade no combate às organizações criminosas.

Para Amaury Portugal, presidente do Sindicado dos Delegados de Polícia Federal no Estado de São Paulo desde 2005, a decisão não se justifica, pois “a Polícia Federal não erro, foi tudo feito corretamente”. Ele acredita que a decisão de anular das provas tenha cunho político:

Hoje é preciso tomar muito cuidado para investigar. Não se pode tomar certas medidas que seriam normais numa investigação. Não se pode, por exemplo, esbarrar em quem tem força política, em gente com muito poder. Convém investigar pelas beiradas, até o momento de fechar o cerco. Ficou muito mais difícil investigar a corrupção oficial. Como são pessoas com dinheiro, posses e influência política, elas se blindam. E também existe a interferência de alguns poderes da República. O caso da Boi Barrica é uma demonstração dessa força a que me referi. É grande a ingerência nos tribunais.[67]

Para BOTTINI[68], a decisão dos Ministros está sendo criticada por aquilo que tem de melhor: “o cumprimento da lei, que reserva às interceptações o caráter excepcional, determinando sua utilização quando nenhuma outra forma de investigação pode ser adotada”. Segundo ele, a falha não está na decisão do Tribunal Superior, mas sim dos juízes de primeira instância, “em inúmeras oportunidades, ignoram este preceito, cabendo às Cortes superiores restabelecer a lei”. Sobre suspeitas de imparcialidade do Ministro, apregoa que dois ministros titulares haviam se dado por impedidos de participar do julgamento. “Portanto, o relator do habeas corpus não “se aproveitou” da ausência dos colegas para julgar e nem foi posto na Corte pelo interessado no julgamento”.

Independentemente da suspeita quanto à legitimidade da motivação da sentença, é importante ter em mente, conforme aponta SILVA[69], que, “se por um lado o direito à intimidade e ao sigilo de dados é garantido constitucionalmente pela Lex Maxima, por outro é cediço que não há direito individual absoluto”.

Dizer que o cidadão que dilapida o patrimônio público não pode ter seu sigilo bancário e fiscal afastados pelo Estado-juiz diante derelatório feito por órgão estatal de inteligência é sepultar qualquer possibilidadede responsabilização da criminalidade organizada (que se escondeatrás de complexas transações financeiras, utilizando-se de‘laranjas’para encobrir seus delitos).

Se é certo que o Estado-juiz deve cuidar para que não sejam cometidos excessos no curso das investigações levadas a efeito pelo Estado-investigação, é igualmente fato que ele deve ser cauteloso com o fitode não superdimensionar direitos individuais em detrimento do interesse de toda sociedade, gerando, como dito supra, funesta sensação de impunidade.

Deste modo, é imperativo concluir que alguns crimes, por sua própria natureza, não apresentam muitas alternativas de investigação, sendo a quebra de sigilos e interceptações, por vezes, a única fonte de provas a ser explorada. Mas é preciso ter em mente que os direitos fundamentais devem ser respeitados, proibindo-se qualquer excesso, conforme aponta ROESLER[70]:

Com o avanço do crime organizado e dos delitos de colarinho branco, a eficácia do sistema de persecução penal é posta em xeque, dando margem aos debates a respeito da utilização ou não da prova proibida. [...]Entretanto, a busca pela verdade real no processo penal não pode ser obtida a qualquer preço. Como dissemos, necessário se faz um sistema de freios à ação persecutória do Estado. A inadmissibilidade das provas ilícitas busca exatamente impor limites à ação dos órgãos da justiça criminal evitando abusos contra o réu no curso da ação penal.

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Sobre a autora
Denise Vichiato Polizelli

Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Londrina. Pós-graduada em Direito e Processo Penal pela Universidade Estadual de Londrina. Pós-graduada em Ministério Público - Estado Democrático de Direito pela Fundação Escola do Ministério Público do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

POLIZELLI, Denise Vichiato. Operação Faktor da Polícia Federal: direitos individuais e licitude das provas . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3489, 19 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23487. Acesso em: 2 nov. 2024.

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Orientador: Antônio José Mattos do Amaral

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