Recentemente, tomamos conhecimento acerca de divergência entre a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS e Superintendência de seguros Privados – SUPEP acerca da competência para o exercício da fiscalização das atividades de corretores de seguro de saúde.
A dúvida surgiu porque a SUSEP tem sustentado, basicamente, que o exercício da fiscalização sobre a intermediação na contratação de seguro saúde seria da ANS em face de legislação que teria retirado o ramo saúde da fiscalização da SUSEP (Despacho/SCADM/PF-SUSEP Nº 455/2010 e manifestações posteriores no mesmo sentido). Por sua vez, ANS entende, em suma, que as Leis nº 9.656, de 1998, nº 9.961, de 2000, e nº 10.185, de 2001, não transferiram para a Autarquia a competência de habilitação e fiscalização do exercício da profissão de corretor de seguro de saúde (Parecer 235/2013/PROGE/GECOS).
Há de se reconhecer que se trata de questão dotada de relevância jurídica e social, na medida em que a atividade de corretores de seguro de saúde atinge praticamente todos os segmentos de nossa sociedade (dos mais jovens aos mais idosos) e em área por demais sensível: saúde suplementar.
Pois bem. É cediço que a competência é determinada por lei em sentido formal. Segundo Odete Medauar, “nenhum ato administrativo pode ser editado validamente sem que o agente disponha de poder legal para tanto”.1
Nesse passo, importante observar que não há lei atribuindo à Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS a competência para fiscalizar as atividades de corretores de seguro saúde.
De outra parte, há legislação expressa que leva à competência de fiscalização do corretor de seguro à Superintendência de Seguros Privados – SUSEP. O Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, que criou a SUPEP, preconiza in verbis:
ART. 127. CABERÁ RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL, PERANTE A SUSEP, AO CORRETOR QUE DEIXAR DE CUMPRIR AS LEIS, REGULAMENTOS E RESOLUÇÕES EM VIGOR, OU QUE DER CAUSA DOLOSA OU CULPOSA A PREJUÍZOS ÀS SOCIEDADES SEGURADORAS OU AOS SEGURADOS.
ART. 128. O CORRETOR DE SEGUROS ESTARÁ SUJEITO ÀS PENALIDADES SEGUINTES:
A) MULTA;
B) SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO;
C) CANCELAMENTO DO REGISTRO
PARÁGRAFO ÚNICO. AS PENALIDADES SERÃO APLICADAS PELA SUSEP. EM PROCESSO REGULAR, NA FORMA PREVISTA NO ART. 119 DESTA LEI.
Ademais, o art. 17, “b”, da Lei 4.594, de 29 de dezembro de 1964, que regula a profissão de corretor de seguro, e o art. 125, “b”, do Decreto-Lei nº 73, de 1966, reforçam esse entendimento, na medida em que preconizam a impossibilidade do corretor de seguros ser empregado ou manter relação de direção com a companhia seguradora. Tal vedação fortalece o afastamento da competência da ANS, na hipótese, uma vez que não se pretende, com a atividade fiscalizatória ora discutida, averiguar a conduta de operadora de plano de saúde ou sociedade seguradora. Vejamos:
LEI Nº 4594, DE 1964:
ART. 17. É VEDADO AOS CORRETORES E AOS PREPOSTOS:
(...)
B) SEREM SÓCIOS, ADMINISTRADORES, PROCURADORES, DESPACHANTES OU EMPREGADOS DE EMPRESA DE SEGUROS.
PARÁGRAFO ÚNICO. O IMPEDIMENTO PREVISTO NESTE ARTIGO É EXTENSIVO AOS SÓCIOS E DIRETORES DE EMPRESA DE CORRETAGEM.
DECRETO-LEI Nº 73, DE 1966:
ART. 125. É VEDADO AOS CORRETORES E SEUS PREPOSTOS:
(...)
B) MANTER RELAÇÃO DE EMPREGO OU DE DIREÇÃO COM SOCIEDADE SEGURADORA, I
PARÁGRAFO ÚNICO. OS IMPEDIMENTOS DESTE ARTIGO APLICAM-SE TAMBÉM AOS SÓCIOS E
DIRETORES DE EMPRESAS DE CORRETAGEM.
Portanto, entendemos que compete à SUSEP a missão de fiscalizar a conduta de corretores de seguros de saúde.
Tal entendimento, a propósito, alinha-se ao quanto consignado no Parecer nº 31/2013/DEPCONSU/PGF/AGU, da Procuradoria-Geral Federal, órgão vinculado à Advocacia-Geral da União, aprovado em 7 de outubro de 2013.
Nesse quadro, posicionamo-nos no sentido de que eventual conduta de corretor de seguros e de empresa corretora de seguro saúde que venha a ludibriar ou causar prejuízos a terceiros, por exemplo, apropriando-se indevidamente de quantia entregue por segurado, deve ser objeto de fiscalização e apuração pela Superintendência de Seguros Privados – SUSEP.
Nota
1 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 13ª ed. rev. e atual., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, página 139.