Capa da publicação Caso Jeferson Alves e a motosserra: até onde vai a crença na impunidade?
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Um ilícito a olhos vistos

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05/03/2020 às 13:30
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Após o escândalo da retroescavadeira, no município de Sobral-CE, foi a vez da motosserra. O Deputado Estadual Jeferson Alves, diante de câmeras, destruiu o bloqueio que protegia a terra indígena Waimiri Atroari com uma motosserra. Há 40 anos a rodovia é parcialmente fechada à noite para reduzir riscos de atropelamento.

I - O FATO

No Brasil, a crença na impunidade é tamanha que os que infringem a lei se sentem livres para filmar e divulgar as ações ilegais. Foi o que fez o deputado estadual Jeferson Alves. Na sexta-feira, dia 28 de fevereiro de 2020, ele convocou fotógrafos e cinegrafistas para registrar sua performance na BR 174. Diante das câmeras, ligou uma motosserra e destruiu o bloqueio que protegia a terra indígena Waimiri Atroari. Há cerca de 40 anos, a rodovia é parcialmente fechada à noite para reduzir riscos de atropelamento. O trânsito permanece livre para ônibus, ambulâncias e caminhões com carga perecível.

Mesmo assim, fazendeiros e empresários insistem em derrubar o bloqueio. “Presidente Bolsonaro, é por Roraima é é pelo Brasil, não a favor dessas ONGs”, bradou Alves, exibindo a corrente rompida como um troféu. Na internet, o deputado se apresenta como um político “temente a Deus e aos princípios bíblicos”. Em dezembro, ele debochou da Justiça Eleitoral ao promover um show com sorteio de panelas, geladeiras e carro zero.

A atitude do deputado estadual Jeferson Alves (PTB-RR) foi repudiada por meio de nota emitida pela Associação da Comunidade Waimiri Atroari. O parlamentar retirou a corrente no Posto do Jundiá, nos limites da entrada da terra indígena Waimiri Atroari, na BR-174, sentido Roraima-Amazonas, na manhã desta sexta-feira (28), utilizando um alicate turquesa e motosserra, e cortou a corrente de controle seletivo de acesso localizado dentro da terra indígena Waimiri Atroari.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) informou que os indígenas já substituíram as correntes que são colocadas no início e no final da terra indígena.

A Associação da Comunidade Waimiri Atroari informou que está tomando todas as medidas legais e judiciais cabíveis dentro do Estado Democrático de Direito, visando a punição e responsabilização exemplar de todos os envolvidos dos atos espúrios, ilegais e imorais acima relatados.

Ainda na nota, a associação diz que “o deputado coagiu e manteve em cárcere privado alguns indígenas da referida etnia, que estavam na guarita de posto de fiscalização na entrada da terra indígena”.

“O fato é que a conduta do parlamentar, e de seus asseclas, de querer agir com as próprias mãos, além de incitar outras pessoas a mesma prática, se enquadra também em várias outras condutas tipificadas por crime da legislação penal brasileira”, diz outro trecho da nota.

A associação esclareceu que a ação destrutiva do parlamentar causou ilícito civil de natureza material (destruição do material dos indígenas) e moral (ofensa aos direitos da personalidade e constrangimento moral dos indígenas que foram encarcerados e dos demais integrantes da etnia).


II - O CRIME DE DANO

O artigo 163 do Código Penal preceitua: ¨Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia.¨, prevendo pena de detenção de um a seis meses ou multa.

As ações típicas alternativamente incriminadas consistem em: a) destruir (arruinar); b) inutilizar (tornar inútil, imprestável); c) deteriorar (estragar, corromper).

No ensinamento de Nelson Hungria (Comentários ao Código Penal, volume V, pág. 105 e 106), na destruição, a coisa cessa de existir na sua individualidade anterior, ainda mesmo que não desapareça a matéria de que se compõe; na inutilização, a coisa não perde, individualmente, a sua individualidade, mas é reduzida, ainda que temporariamente, à inadequação ao fim a que se destina; com a deterioração, a coisa sofre um estrago substancial, mas sem desintegrar-se totalmente, ficando apenas diminuída na sua utilidade ou desfalcada em seu valor econômico.

Só existe crime de dano quando o fato constituir fim em si mesmo; desde que é meio para o outro crime, perde a sua autonomia e passa a ser elemento de crime complexo ou progressivo (RT 547/403).

Mas não haverá crime de dano se não existir lesão significativa ao bem jurídico alheio, devendo ser excluída a tipicidade penal pela aplicação do princípio da insignificância.

Por sua vez, o parágrafo único do artigo 163 estabelece tipo qualificado, se o crime é cometido:

a) com violência à pessoa ou grave ameaça;

b) com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave;

c) contra o patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista;

d) por motivo egoístico ou com prejuízo considerável para a vítima.

A pena é de detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Objeto específico da tutela penal, em relação ao crime de dano, é o interesse público consubstanciado na inviolabilidade do patrimônio mobiliário ou imobiliário, que é ofendido por fato que suprime ou diminui a utilização ou o preço da coisa alheia.

Objeto jurídico do crime é a propriedade ou a posse, pois a palavra "alheia", inserida no artigo 163, tanto significa a coisa que é de propriedade de outrem, como a que se acha na posse de terceiro, não obstando que o possuidor possa praticar o crime de dano, seja lesando o direito de propriedade de terceiro, ou seja a posse indireta que a vítima conserva sobre a coisa, ao contrário do que se dá no furto.

Sujeito ativo é quem destrói, inutiliza ou deteriora a coisa alheia. Sujeito passivo é o dono ou proprietário do objeto danificado. Também poderá ser, eventualmente, o possuidor.

Será o caso de crime de dano qualificado cuja ação é de natureza pública incondicionada.


III - O CÁRCERE PRIVADO

Observe-se ainda o delito de cárcere privado.

A expressão cárcere privado decorre do verbo encarcerar, que significa deter, ou prender alguém indevidamente e contra sua vontade.

No crime de cárcere privado, a vítima quase não tem como se locomover, sua liberdade fica restrita a um pequeno espaço físico, como um quarto ou um banheiro.

A pena prevista é de 1 a 3 anos de reclusão. Todavia, a pena aumenta para 2 a 5 anos nos seguintes casos: privação de liberdade maior do que 15 dias, crime com finalidade sexual e, ainda, se as vítimas se enquadram nos seguintes casos: pais, filhos, esposo ou convivente do criminoso, pessoa idosa, pessoa indevidamente internada em casa de saúde ou hospital.

A aumento de pena é ainda maior, de 2 a 8 anos, caso a vítima sofra dano físico ou moral em razão do confinamento.

O mesmo artigo prevê o crime de sequestro, muito similar ao crime de cárcere. O que difere um do outro é o espaço do confinamento. No sequestro, o espaço é mais amplo e permite mais movimentação da vítima.

O sequestro e o cárcere privado são formas muito semelhantes de privação do direito de ir e vir, destacando-se a última por um sentido de maior restrição da liberdade.

Como elemento subjetivo basta o dolo genérico.

Observo se a privação da liberdade é realizada com finalidade especial o crime poderá ser outro.


IV - O EXERCÍCIO ARBITRÁRIO DAS PRÓPRIAS RAZÕES

Prevê o artigo 345 do Código Penal:

Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.

Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.

Tutela-se a administração da justiça, impedindo-se que o particular satisfaça sua pretensão, legítima ou ilegítima, fazendo valer sua vontade por meio de violência, ameaça, fraude, etc. Isso porque compete ao Judiciário dirimir conflitos de interesses, não se permitindo que qualquer pessoa crie embaraço à atuação regular da Justiça. No crime em tela o indivíduo revela desprezo pela Justiça, uma vez que usurpa uma prerrogativa que é inegavelmente própria do Poder Judiciário, que exerce o poder-dever da Jurisdição.

Em face da pena aplicada é crime de menor potencial ofensivo, podendo ser aplicado o benefício da transação penal(artigo 76 da Lei 9.099/95).

Tem-se a origem desse tipo penal no direito italiano(Código Penal, artigo 392), com precedentes históricos no Código sardo de 1859(artigo 286) e ainda no código toscano de 1853(artigo 146), de onde passou aos códigos Zanardelli(artigo 235) e Rocco(artigo 392 e 393).

A essência do delito está no direito-dever de aplicar e fazer valer o direito, tarefa do Estado, ao passo que o particular aplica e faz valer o direito do Estado, como se tem da lição de Piero Marsich(Esercizio arbitrario delle proprie ragioni nel diritto italiano vigente, Padova, 1926, pág. 69 e seguintes).

Sobre o assunto, confira-se a lição de Rui Stocco e Tatiana de O. Stocco:

“O ser humano evoluiu e desenvolveu-se no sentido de buscar estruturar-se através de um grupo social do qual faça parte e, nele inserido, acatar as regras e o modus vivendi que o próprio estrato social estabeleceu. Um dos pressupostos da vida em sociedade e da inserção da pessoa nessa sociedade é - obrigatoriamente - a submissão às regras estabelecidas e à legislação posta. Se as divergências entre pessoas devem ser dirimidas pelo Poder Judiciário - porque assim se estabeleceu -, que tem no juiz o árbitro das querelas, nada justifica que alguém queira fazer justiça pelas próprias mãos. Essa a razão pela qual a reprovação da sociedade a esse comportamento fez com que a conduta fosse considerada grave e erigida à condição de crime.

(...)

Objeto material é a conduta justiceira daquele que despreza a legislação regente do inter-relacionamento das pessoas e que estabelece os mecanismos e procedimentos para dirimir conflitos e busca, individualmente, fazer a sua justiça, segundo a sua visão e entendimento, em desprezo às regras previamente estabelecidas”. (Código Penal e sua interpretação: doutrina e jurisprudência. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 1685.)

Explica Heleno Cláudio Fragoso(Lições de direito penal, volume III, 5ª edição, pág. 523) que “a materialidade do fato consiste em fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão jurídica. Sendo assim a existência da pretensão é pressuposto indispensável do fato, sendo, porém, irrelevante, que ela corresponda efetivamente a um direito, desde que o agente suponha de boa-fé que o possui”.

É conhecida a lição de Nelson Hungria(Lições de direito penal, volume IX, pág. 492) no sentido de que para que se possa reconhecer a sinceridade da convicção(titularidade de um direito) deve existir pelo menos a aparência do direito, um fumus iuris, ou como entende Sabatini, uma pretensão que, se levada a juízo, não seria rebatida como lide temerária. Para Heleno Cláudio Fragoso(Lições de direito penal, volume II, 5ª edição, pág. 523) o essencial é que o agente pratique a ação de boa fé, não se podendo excluí-la a priori mesmo nos casos em que haveria lide temerária, devendo ser levada em conta, à luz do que disse Manzini, a educação, a cultura e a capacidade intelectual do agente.

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Ao contrário do que ocorre com o direito italiano, a violência não é elemento constitutivo do crime, que pode ser praticado mediante fraude.

Esse crime não se confunde com a figura do esbulho possessório(artigo 161, § 1º, II), que tem como pressuposto a invasão de propriedade alheia com o fim de esbulho possessório(RT 380/173).

Paulo José da Costa(Comentários ao código penal, volume III, 1989, pág. 564), lembra a lição de Carrara quando ensinou que “ o ato externo deve privar alguém contra a sua vontade de um bem que desfruta. Aquele que está fruindo de um bem e continua a fruí-lo apesar de quem não o queira, não delinque porque a lei protege o status quo que não poderá mudar a não ser por consentimento dos interessados, por decreto da autoridade judiciária”.

Sujeito ativo é qualquer pessoa que pratica a conduta inscrita no artigo 345 do Código Penal, de forma que se tratar de funcionário público poderá ser hipótese de abuso de autoridade. Por sua vez, o sujeito passivo do crime é o Estado que exerce a administração da Justiça.

O crime se configura quando o agente faz justiça pelas próprias mãos, para satisfazer a uma pretensão. Ensina Magalhães Noronha(Direito Penal, 15ª edição, 1978, volume IV, pág. 505), que a pretensão se assenta em um direito que o agente tem ou julga ter, ou seja, pensa de boa-fé possuí-lo, o que deve ser apreciado não apenas quanto ao direito em si, mas também de acordo com as circunstâncias e as condições da pessoa. Assim a pretensão pode ser ilegítima, ocorrendo o ilícito em discussão desde que o agente se convença de ser o titular do direito.

Sendo assim será indispensável que a pretensão possa ser objeto de apreciação da Justiça, pois não ocorrerá o crime se houver carência de ação, como impossibilidade jurídica do pedido(cobrança de dívida de jogo ilegal), falta de interesse de agir(falta de necessidade ou utilidade em recorrer ao Judiciário diante de uma pretensão resistida ou a inadequação da via eleita), se a pretensão estiver sujeita a prescrição, que é uma forma de encobri-la. Considera-se indiferente a efetiva existência do direito.

Essa pretensão pode envolver um direito pessoal, um direito real, um direito de família.

Pode a pretensão ser do próprio agente ou de terceiro, se houver mandato ou gestão de negócios, por exemplo, como ensinou Nelson Hungria(Comentários ao Código Penal, volume IX, pág. 492).

Como ensinou Júlio Fabbrini Mirabete(Manual de direito penal, volume III, 22ª edição, pág. 417) o crime de exercício arbitrário das próprias razões é de ação livre, podendo ser praticado por violência, fraude, ameaça. Assim o tipo penal exige uma pretensão legítima(ou supostamente tal) e de uma ação ou omissão que em outras circunstâncias iria constituir um fato delituoso autônomo: furto, dano, apropriação indébita, etc, de forma que justificada pelo propósito doloso e específico do agente.

Assim há o crime previsto no artigo 345 do Código Penal: se a intenção do agente, ao se apoderar da coisa alheia móvel, foi a de se pagar dívida que o dono se recusara a satisfazer(RT 522/439; 554/377; RF 145/346). Haverá tal crime se o médico vem a reter o paciente no hospital uma vez que não recebeu o pagamento atinente a internação e tratamento(RT 512/423). Já se decidiu ainda que havia esse crime previsto no artigo 345 do CP se o objetivo não era a subtração, mas a retenção do objeto até que fosse saldada a dívida(RT 486/326). Há ainda esse crime se há uma conduta que leve a dano da coisa se praticada para reaver coisa que o agente suponha lhe pertencer(RT 419/390). Há o crime do artigo 345 do CP se o agente, para conter a agressividade da vítima, depois de dominá-la fisicamente a amarrá-la a um mourão, se dirigiu a policia para informar o fato persuadido de haver exercido um direito(RT 182/319). Outro exemplo presente no artigo 345 do CP existe quando o agente acorrenta a vítima com o intuito de fazê-la trabalhar para si, a pretexto de se ressarcir de prejuízo causado por aquela(RJDTACRIM 5/95). Outros exemplos: derrubar muro divisório de sua propriedade erguido pelo confinante(RT 485/332); cortar água e luz do locatário, absorvendo-se a contravenção referente à economia popular(RT 429/430); o adquirente do imóvel arrematado em execução hipotecária, aproveitando-se da ausência do ocupante, muda o cilindro da fechadura para imitir-se na posse(RT 639/370).

Mas se exclui a antijuridicidade da ação nos casos em que a lei permite a violência privada: legítima defesa, estado de necessidade, cumprimento do dever legal, restituição de posse incontinenti, nos casos de turbação ou de esbulho.

O elemento subjetivo do tipo é o dolo que se constitui não só pela vontade de empregar o meio, que pode ser a violência, a ameaça, a fraude, etc, como ainda pela finalidade de fazer justiça pelas próprias mãos, ou seja, satisfazer a uma pretensão real ou ainda supostamente legitima(RT 654/307-9). O dolo genérico acha-se representado pela vontade livre e consciente de fazer justiça enquanto que o dolo específico pela finalidade do agente de satisfazer pretensão jurídica legítima ou supostamente tal. Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 525) segue a linha de Manzini, para quem o agente deve limitar-se a pretender ainda que com meios ilícitos, o que supõe ser materialmente justo.

Como ensinou Paulo José da Costa(obra citada, pág. 564) consuma-se o crime quando o agente, substituindo-se arbitrariamente à autoridade judiciária, a qual poderia recorrer, faça justiça por ele mesmo. Para Paulo José da Costa, assim, não se aperfeiçoa o crime com o mero uso de meio arbitrário, como disse Magalhães Noronha(obra citada, volume IV, pág. 378), fundado nas lições de Maggiore, para quem consuma-se o crime com o emprego ou uso do meio arbitrário, sendo indiferente que o agente consiga ou não a sua pretensão. Para Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 524) não parece ser este o melhor entendimento, já que o crime é fazer justiça pelas próprias mãos, e não se pode dizer que faz justiça quem apenas tenta fazê-la.

O núcleo do tipo é fazer justiça pelas próprias mãos de forma que o tipo penal se consuma com a satisfação da pretensão. Em não sendo obtido o resultado pretendido, no entender de Júlio Fabbrini Mirabete(obra citada, pág. 418), há tentativa, ao contrário do que ensina Magalhães Noronha(obra citada, pág. 506 e 507).

Responde o agente pelo crime de exercício arbitrário das próprias razões em concurso com a violência, sendo que o dano é objeto de absorção(RT 485/332).

Consoante os termos do parágrafo único do artigo 345 do Código Penal, no parágrafo único, se não há emprego de violência, procede-se mediante queixa. É o caso do crime quando envolve ameaça, ainda que grave(RT 282/106). No ensinamento de Nelson Hungria(obra citada, volume IX, pág. 491), a ação penal é privada quando se tratar de violência contra a coisa, pois a lei ao falar em vis corporalis se refere à violência contra a pessoa(RT 503/333). No entanto, a ação penal será sempre pública se houver interesse da União, Estado e Município, a teor da Lei 8.699, de 27 de agosto de 1993. A propósito, transcreve-se a lição de Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 525):

“ Há grande divergência doutrinária e jurisprudencial, no que concerne ao sentido do vocábulo violência, no dispositivo que ora estudamos. Ao passo que alguns julgados(RF 115/581) e autores(Bento de Faria, “Código Penal”, 1943, vol. 5, 616; Jorge Severiano, “ Código Penal”, vol. 4, 441) entendem que a violência, para ensejar a ação pública, tanto pode ser feita a pessoa como a coisa, outras decisões(Fragoso, “ Jur. Crim.”, nº 225) e autores(Nelson Hungria, IX, 491) afirmam que só cabe ação pública quando se trata de violência a pessoa. Este último entendimento tem sido sufragado pelo STF e por outros tribunais(RF 181/305, 260/331; RT 503/333, 503/429).

Ousamos divergir dos que entendem que o dispositivo em exame contempla apenas a violência à pessoa, pois tal opinião, conquanto autorizada, não se ajusta a nosso direito positivo. Não hesitamos em defendê-la de lege ferenda.

Para tanto, Heleno Cláudio Fragoso(obra citada, pág. 526), em defesa de sua tese, faz menção a lição de Nelson Hungria(Comentários ao código penal, volume VIII, 69) noutro caso em que fala em violência tout court(artigo 208, parágrafo único, CP) quando ensina que pode ela referir-se tanto à pessoa como à coisa.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Um ilícito a olhos vistos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6091, 5 mar. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/79852. Acesso em: 19 mar. 2024.

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