Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br
Artigo Selo Verificado Destaque dos editores

A Usina Hidrelétrica de Belo Monte à luz das normas constitucionais

Exibindo página 1 de 4
Agenda 06/01/2014 às 07:10

A construção da usina hidrelétrica Belo Monte possui grande viabilidade no que tange ao desenvolvimento do Brasil, no entanto muitos aspectos que se sobressaem diante da obra devem ser analisados com extrema cautela.

Sumário: INTRODUÇÃO. 1. Desenvolvimento Histórico – o que é a Hidrelétrica de Belo Monte.    1.1. Breve relato sobre o que é e para que serve uma usina hidrelétrica. 1.2. Projeto UHE Belo Monte. 1.3. Consórcio Norte Energia. 1.4. Algumas polêmicas na história da UHE de Belo Monte. 2. Garantia aos Direitos Fundamentais. 2.1. Direito à Propriedade. 2.1.1. Das desapropriações ocorridas para o estabelecimento da obra. 2.1.2. Do reassentamento coletivo efetuado pela Norte Energia S.A. 2.2. Proteção e tutela dos índios. 2.2.1. Belo Monte e as comunidades indígenas. 2.3. Direito ao Meio Ambiente como garantia fundamental. 3. A grande questão ambiental. 3.1. Impactos ambientais causados pela obra.  3.1.1 A questão da pesca como fonte de renda das populações. 3.2. Norte Energia e os impactos ambientais. 3.3. E as futuras gerações?. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.

Resumo: O presente trabalho visa apresentar as características legais acerca da construção da 3ª maior usina hidrelétrica do mundo, a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, localizada no Estado do Pará – Brasil. A obra tem trazido diversas polêmicas sociais, econômicas, políticas e legais, tendo em vista que alguns direitos estão sendo relativizados, tais como o direito à propriedade, a tutela dos índios e principalmente o direito ambiental. Com a construção da obra é certo que haverá crescimento em diversas áreas para o nosso país, no entanto, o principal objeto deste trabalho é abordar os aspectos constitucionais a serem preservados e trazer fatos dotados de veracidade para que cada leitor, à luz de suas convicções intelectuais e subjetivas, tire suas próprias conclusões sobre um caso tão polêmico.

Palavras-chave: desenvolvimento econômico e social, direitos e garantias fundamentais, preservação ao meio ambiente, tutela dos índios, usina hidrelétrica.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAI – Avaliação Ambiental Integrada

ANEEL –Agência Nacional de Energia Elétrica

CF – Constituição Federal

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente

DL – Decreto Lei

EIA – Estudo de Impacto Ambiental

ELETROBRÁS – Centrais Elétricas Brasileiras S.A

ELETRONORTE – Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A

FADESP – Fundação de Amparo de Desenvolvimento de Pesquisa

FIESP-CIESP – Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo

IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

LI – Licença de Instalação

LO – Licença de Operação

LP – Licença Prévia

MPF – Ministério Público Federal

MW – Megawatt

NESA – Norte Energia S.A

RIMA – Relatório de Impacto Ambiental

SISNAMA – Sistema Nacional do Meio Ambiente

UHE – Usina Hidrelétrica


INTRODUÇÃO

Acontecimentos com repercussão nacionalo correm em todo o mundo, gerando opiniões positivas e negativas acerca de múltiplos temas em países diversos. No Brasil não é diferente.

É cediço que o Brasil é considerado um país em desenvolvimento, mas, que vem conquistando grande espaço no âmbito internacional através do crescimento em algumas áreas.

A construção de uma usina hidrelétrica no Estado do Pará, que será a terceira maior hidrelétrica do mundo, tem sido alvo de grande polêmica no âmbito interno do país e também na perspectiva internacional.

A chamada Usina Hidrelétrica de Belo Monte trará ao povo brasileiro grandes benefícios, pois, trata-se de um fator indiscutível para o crescimento econômico interno. Além de a obra ser projetada para suprir 40% da geração de energia do país após ficar pronta, sua construção tem contribuído para geração de empregos e valorização do Estado do Pará e Estados vizinhos afetados pela obra.

No entanto, desde o início de elaboração dos estudos para projetar a obra, ela já vem causando polêmicas negativas. Isto porque pode afetar, e já o vem fazendo, grande parte do patrimônio ambiental da região, justamente onde ficam localizados pequenos produtores rurais, comunidades ribeirinhas e diversas tribos indígenas que vivem em área de preservação ambiental.

Não obstante a isso, a obra traz mudanças permanentes nos aspectos ambientais da área, devido não apenas à barragem do Rio Xingú, mas, também ao tamanho da área destinada à construção da hidrelétrica.

O Ministério Público Federal intentou diversas ações visando a paralisação da obra, alegando irregularidades no processo de licenciamento, falta de tutela e proteção ao meio ambiente, afronta aos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal, entre outros, demonstrando claramente ser contrário à construção da usina. No entanto, não vem obtendo muito sucesso em sua batalha e hoje as obras estão em comum andamento, com previsão de término para o ano de 2015.

Muitos movimentos se levantaram contra a construção da usina, visando defender os direitos sociais dos produtores rurais, índios e, principalmente, os direitos ao meio ambiente, contudo, também sem sucesso até o presente momento.

A seu turno, Governo e Norte Energia S.A, empreendedora do projeto, defendem a construção da obra pelos benefícios no setor energético que ela trará e, afirmar que será garantido o desenvolvimento sustentável.

Este trabalho tem por objetivo levantar os pontos positivos e negativos que a obra pode causar ao país sob a ótica jurídica em suas diversas formas, para tanto, discorreremos, no decorrer dos capítulos, sobre os direitos fundamentais, consagrados pela Constituição Federal que devem ser observados com expressiva atenção frente à implementação da obra.

Traremos ao estudo institutos jurídicos que podem ser aplicados ante às transformações sociais e ambientais que estão ocorrendo nas áreas afetadas, se valendo de dispositivos legais, jurisprudências e doutrinas.

O maior objetivo deste estudo é oferecer ao leitor conhecimento sobre um importante acontecimento no país e proporcionar a cada um, que tire suas próprias conclusões de acordo com seus conhecimentos e valores sociais e jurídicos.

Para tanto, será abordado no capítulo primeiro aspectos acerca do desenvolvimento histórico da usina, bem como dados técnicos para entendimento do leitor de como funciona uma usina hidrelétrica e quais as polêmicas que vêm ocorrendo em torno da hidrelétrica de Belo Monte.

O capítulo segundo trará os fundamentos a serem observados durante a construção da obra para preservar e garantir alguns direitos fundamentais dos indivíduos afetados, dentre eles o direito à propriedade, a proteção e tutela dos índios e a preservação ao meio ambiente como direito fundamental.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Por sua vez, o capítulo terceiro abordará especificamente os aspectos ambientais, trazendo dispositivos legais e doutrinários sobre o direito ambiental e desenvolvimento sustentável, e também como ficará a situação das futuras gerações.


1. DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO - O QUE É A HIDRELÉTRICA DE BELO MONTE

Hoje em nosso país ocorre a construção da terceira maior usina hidrelétrica do mundo, a Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Seguida pelas usinas Três Gargantas, na China, e Itaipu, na divisa entre Paraguai e Brasil, a Belo Monte está sendo construída no Rio Xingú, Estado do Pará, nas proximidades da cidade de Altamira.

A construção da UHE Belo Monte vem sendo analisada desde a década de 1970. Os estudos foram iniciados pelas Centrais Elétricas do Norte do Brasil (ELETRONORTE S/A) e, posteriormente, transferido a Centrais Elétricas Brasileiras S/A (ELETROBRÁS), em conjunto com as construtoras Camargo Corrêa S/A, Andrade Gutierrez e Norberto Odebrecht.(NORTE ENERGIA, 2012)

Antes de adentrarmos especificamente no projeto de construção da UHE de Belo Monte, é necessário entender para que serve uma usina hidrelétrica e quais os mecanismos necessários de implementação de uma obra como esta. Para tanto, passaremos ao estudo de uma breve síntese acerca do tema.

1.1.       Breve relato sobre o que é e para que serve uma usina hidrelétrica

É cediço que existem diversas formas de se gerar energia, no entanto, as usinas hidrelétricas são uma maneira viável para geração de energia no Brasil, tendo em vista a grande quantidade de rios no país que possuem as características necessárias para a construção de barragens por um custo mais baixo.

Em suma, pode-se conceituar uma Usina Hidrelétrica da seguinte maneira:

“É uma construção feita em um trecho do rio. A água é represada por um grande muro, chamado de barragem. Essa água represada passa por um duto (tipo de tubulação), girando uma ou mais turbinas, que, por sua vez, movem o gerador que produz a energia elétrica. Essa energia elétrica gerada segue para subestação que fica ao lado da usina. Depois é transportada pelos linhões para todo o país.” (RIMA, 2009, p. 8)

Como todo e qualquer grande empreendimento realizado no país, a construção de uma usina hidrelétrica pode trazer alterações em diversos aspectos, tais como ambiental, social, cultural e econômico, portanto, é necessário que haja o licenciamento ambiental previamente realizado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) para a autorização da construção.

De acordo com a lei 6.938/81 – Política Nacional do Meio Ambiente, a construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento. (BRASIL, 2013)

Assim, tem-se a necessidade da ocorrência do licenciamento ambiental para instalação de uma usina hidrelétrica, o qual, conforme determinado pela Resolução do CONAMA nº 237/97 em seu artigo 8º, se materializa através da licença prévia, licença de instalação e licença de operação.

Depois de efetuado o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) e o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), bem como concedida a Licença Prévia (LP), efetua-se um leilão, organizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) em que o Governo Federal visa repassar a uma empresa o direito de construir, operar a usina e vender a energia produzida, se tornando, pois, o empreendedor da obra, o qual terá o compromisso de cumprir tudo o que foi proposto no RIMA e no EIA. (RIMA, 2009)

Por fim, após estes procedimentos e, concedidas as licenças necessárias, a empresa responsável poderá enfim realizar a construção da usina planejada e, posteriormente, iniciar o funcionamento dela.

Suprido o básico entendimento acerca da implementação de uma usina hidrelétrica no Brasil, passemos a análise do caso concreto da obra de Belo Monte.

1.2.       Projeto UHE Belo Monte

A UHE de Belo Monte foi planejada para gerar energia em potência de 11.233,1 MW, contudo, por operar com reservatório reduzido, deverá produzir efetivamente cerca de 4.571 MW, o que representa aproximadamente 40% do consumo nacional de energia.

O custo da UHE Belo Monte está estimado em R$ 26 bilhões pela concessionária, ou seja, R$ 4,3 milhões por MW efetivo. O leilão para construção e operação da usina foi realizado em abril de 2010 e vencido pelo Consórcio Norte Energia com lance de R$ 77,00 por MW. O contrato de concessão foi assinado em 26 de agosto do mesmo ano e, o de obras civis em 18 de fevereiro de 2011.A usina está prevista para entrar em funcionamento em 2015. (NORTE ENERGIA, 2012)

Veja-se um breve histórico dos atos ocorridos desde o início dos estudos para a construção da usina até o início realização da obra (RIMA, 2009):

No ano de 1975 iniciaram-se os estudos para o aproveitamento hidrelétrico da bacia do Rio Xingu; em 1980 os estudos de inventário foram concluídos e iniciaram-se os estudos de viabilidade da construção da Usina Hidrelétrica Kararaô, como era inicialmente chamada. Tais estudos foram revisados no ano de 1994, buscando a diminuição da área a ser inundada e proibição de inundar as áreas dos indígenas.

Em 2002 todos os estudos, efetuados junto à Eletrobrás, foram apresentados à ANEEL, no entanto, o Ministério Público Federal, através de decisão judicial, paralisou os trabalhos,sob o argumento de que a Eletronorte queria que o processo de estudos para concessão do licenciamento fosse feito pela Fadesp (Fundação de Amparo de Desenvolvimento da Pesquisa) e não pelo Ibama que é o órgão competente, assim, o EIA não pôde ser concluído.

Posteriormente, no ano de 2005, o Congresso Nacional autorizou a Eletrobrás a complementar os estudos, levando o IBAMA, no ano de 2007, a realizar vistoria técnica e reuniões públicas nos municípios de Altamira e Vitória do Xingu para discutir acerca do EIA.

Após a solicitação da Licença Prévia realizada pela Eletrobrás, o leilão para concessão do serviço público a um empreendedor foi realizado no dia 20 de abril de 2010, o qual restou vencedor o Consórcio Norte Energia S.A (NESA), com lance de R$77,00 por MW.

Por fim, em 26 de janeiro de 2011, o IBAMA concedeu à Norte Energia a licença válida por 360 dias para a construção da infraestrutura que antecede a obra e, no dia 1º de junho do mesmo ano, o IBAMA concedeu a Licença de Instalação (LI).

Importante salientar que desde o início dos estudos para a implementação da obra em território nacional, o objetivo foi viabilizar uma fonte de geração de energia por um custo mais baixo e acessível, bem como, através da grande obra, gerar desenvolvimento econômico e social com reflexos em todo o país.

No entanto, a construção da usina não foi assim entendida por todos, ao contrário, foi mal recepcionada pelos cidadãos, ambientalistas, membros do Poder Judiciário, entre outros.

Isto porque, nitidamente, a obra traz grandes reflexos no setor ambiental, social, cultural e econômico, gerando impactos inesperados e negativos. Assim, muitos movimentos se levantaram visando impedir a continuidade da obra em defesa dos afetados, no entanto, a obra permanece ativa até o presente momento.

1.3.       Consórcio Norte Energia

Como mencionando anteriormente, o Consórcio Norte Energia foi o vencedor dos leilões para a construção da hidrelétrica. O leilão foi realizado em 20 de abril de 2010 e a outorga coube à Norte Energia pelo prazo de 35 (trinta e cinco) anos.

De acordo com o institucional do Consórcio Norte Energia S.A, compõem a Norte Energia empresas estatais e privadas do setor elétrico, fundos de pensão e de investimento e também empresas autoprodutoras, quais sejam: Eletrobras: 15,00%, Chesf: 15,00%, Eletronorte: 19,98%, Petros: 10,00%, Funcef: 5,oo%, Caixa FIP Cevix: 5,00%, Belo Monte Participações S.A. (Neoenergia S.A.): 10,00%, Amazônia (Cemig e Light): 9,77%, Vale: 9,00%, Sinobras: 1,00% e J.Malucelli Energia: 0,25%.

Ademais, para explorar o potencial hidrelétrico, a concessionária recolherá à União, como pagamento pelo uso de bem público, o valor anual de R$ 16,6 milhões, além de cerca de R$ 200 milhões que serão pagos à União, ao estado do Pará e aos municípios impactados, referentes à compensação financeira pela utilização de recursos hídricos. (NORTE ENERGIA, 2012)

O consórcio busca não apenas a construção da UHE, mas o desenvolvimento econômico e social de toda a região, implantando redes de saúde, escolas, empregos, e se atentando ao desenvolvimento sustentável do local.

A Norte Energia, em nota explicativa de porque a escolha de Belo Monte, afirmou:

“Em mais de trinta e cinco anos de debates, a implantação da Usina Hidrelétrica Belo Monte se tornou vital para atender a demanda energética brasileira projetada para os próximos anos. A escolha por Belo Monte representa a manutenção de uma matriz energética limpa, sustentável e segura que, em complementariedade com outras fontes de energia, coloca o Brasil em posição privilegiada no cenário mundial.” (NORTE ENERGIA, 2012)

Para Luiz Gonzaga Bertelli, vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo e conselheiro e diretor da Fiesp-Ciesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo):

“O Belo Monte responde aos interesses do governo de produzir energia limpa, renovável e sustentável a fim de assegurar o desenvolvimento econômico e social da nação. [...] É inquestionável que a demanda de energia elétrica cresce a passos largos no Brasil graças ao desenvolvimento econômico do país e dos brasileiros e, consequentemente, do acentuado consumo residencial, comercial e industrial. No ano passado, por exemplo, o uso da energia elétrica cresceu 7,8% em comparação com 2009. Nos últimos anos, a população do Brasil passou a ter maior acesso aos bens de consumo duráveis como micro-ondas, geladeiras e televisores. Foi ampliado o acesso à luz elétrica para camadas cada vez mais amplas da sociedade. Ainda existe um percentual significativo de domicílios não eletrificados. [...] Belo Monte oferece a alternativa de geração de energia elétrica mais econômica em comparação com qualquer outra fonte energética disponível na região. [...] O empreendimento vai gerar quase 20 mil empregos diretos e inúmeros empregos indiretos na região, [...] dinamizando a estrutura produtiva das comunidades próximas à hidroelétrica.” (BERTELLI, 2012, p. 1)

Importante salientar que, para a construção da obra, três das maiores empreiteiras do país foram contratadas, segundo o Ministério Público Federal sem licitação, quais sejam ODEBRECH, ANDRADE GUTIERREZ e CAMARGO CORRÊA. Referida contratação é objeto de Ação Civil Pública movida pelo MPF em 2008, tendo em vista algumas irregularidades, já que há indícios que tais empreiteiras foram beneficiadas pela Eletrobrás com informações privilegiadas sobre o empreendimento, contendo no convênio firmado entre eles, inclusive, uma cláusula de confidencialidade.

O juiz federal que julgou a ação em 1ª instância alegou que não há qualquer justificativa para que a Eletrobrás contrate empresas sem qualquer critério isonômico e, que “estranhamente, a Eletrobrás se baseia na proteção das empresas particulares e não do interesse público”. A ação está pendente de julgamento de um agravo interposto. (BRASIL, 2013)

Estas são algumas das considerações importantes acerca do projeto da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Passemos à análise de algumas polêmicas que surgem sobre a construção de Belo Monte.

1.4. Algumas polêmicas na história da UHE de Belo Monte

De acordo com o disposto acima, a construção da grande obra vêm gerando muitas polêmicas em todo o Estado nacional, levando a diversas manifestações e movimentos buscando a paralisação da obra.

A mídia informativa tem sido o instrumento mais instigante a demonstrar falhas no projeto da UHE de Belo Monte, como será demonstrado a seguir.

Logo após o leilão que definiu que a NESA seria o consórcio responsável pela construção da Usina, um conjunto de especialistas, juntados pelo G1 em abril de 2010, canal de notícias da Globo, se uniu dando pareceres sobre a obra.

A conclusão dos especialistas foi de que esta Hidrelétrica será a menos produtiva e mais cara já realizada, tendo em vista os impactos sociais e ambientais realizados na área, ademais, chegaram a conclusão de que a insegurança jurídica e ambiental poderiam atrapalhar o curso da obra, uma vez que diversas ações estariam sendo propostas na época para findar a construção. (OLIVEIRA, 2010).

Não obstante, alguns movimentos se levantaram com o condão de informar a população brasileira sobre os impactos sociais e ambientais negativos trazidos pela obra, tal como o Movimento Gota D’Água, o qual objetivou ingressar com uma ação popular para a aniquilação da Usina Hidrelétrica, no entanto, até o presente momento, nada foi conseguido.

O Ministério Público Federal é o que mais luta contra o prosseguimento da obra. Ingressou com 15 ações na Justiça Federal demonstrando diversas irregularidades, visando à reparação destas e, inclusive, a paralização da obra.

O Agravo de Instrumento nº2006.01.00.017736-8/PA, movido pelo MPF face ao IBAMA e a Eletronorte, requereu a paralização da obra, uma vez que, durante o planejamento, as comunidades afetadas e as tribos indígenas não foram ouvidas, desrespeitando o Decreto Lei 788/2005, o qual autorizou o Poder Executivo a implantar o aproveitamento hidrelétrico de Belo Monte desde que fossem devidamente efetuados o EIA, RIMA, AAI (Avaliação Ambiental Integrada) e a oitiva das comunidades localizadas na área influenciada pelo empreendimento.

De acordo com o voto da Desembargadora Federal, Relatora do julgamento, Selene Maria de Almeida, houve vício formal em relação ao disposto no decreto, uma vez que os índios e comunidades ribeirinhas foram ouvidos pelo IBAMA sendo que a competência cabia ao Congresso Nacional.

O Agravo recebeu parcial provimento, declarando a invalidade do DL 788/2005 e, proibindo o IBAMA de realizar as oitivas, bem como determinando a realização do EIA, o qual foi efetuado posteriormente. (BRASIL, 2006)

Em junho de 2012 índios e ambientalistas, ainda inconformados com a obra, protestaram no município de Altamira – PA. De acordo com o canal de notícias G1, cerca de 300 índios e ambientalistas protestaram contra a construção da hidrelétrica, no entanto, o consórcio responsável pela obra não se pronunciou acerca do ocorrido. (CASTRO, 2012).

Neste passo, a polêmica está travada. Muitos ativistas, ambientalistas e cidadãos que se sentem prejudicados decidem reivindicar seus direitos, por outro lado, engenheiros, empresários e o governo do país prezam pela continuidade da construção da usina, por entenderem ser uma necessidade maior e de todos.

O ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no ano de 2010, afirmou que as manifestações ocorridas não passavam de fantasias criadas pela falta de informação dos manifestantes e, os aconselhou a passar a metade de seus dias colocando a energia positiva para pensar em alguma coisa importante. (MAGALHÃES, 2010)

De acordo com o MPF há uma inconsistência nas alegações governamentais acerca de Belo Monte, uma vez que “ora Belo Monte será debatida com democracia, ora a democracia não pode atrapalhar o desenvolvimento.”(BRASIL, 2013, p. 67)

A ex-ministra do meio ambiente, Marina Silva, quando candidata à presidência da República,se pronunciou acerca do tema, ressaltando pontos que valem a pena ser registrados, conforme segue:

“Belo Monte está na agenda do país há 20 anos. Fazem 20 anos que a índia Tuíra botou o facão no pescoço do diretor da Eletrobrás.

Lamentavelmente 20 anos se passaram e a licença foi dada sem que os problemas de Belo Monte tivessem sido resolvidos, em relação aos impactos sociais e aos impactos ambientais e o processo que afeta a terra das comunidades indígenas.

Os aproveitamentos hídricos para geração de energia são importantes? São importantes! E quem foi que disse que eles só podem ser realizados se forem em prejuízo das comunidades indígenas, da proteção ambiental e do respeito à população local?

É perfeitamente possível fazer isso de uma forma sustentável, do ponto de vista ambiental, do ponto de vista cultural e do ponto de vista social.

E Belo Monte, para além dos problemas ambientais e sociais acabou revelando um outro problema que não estava posto no inicio, que é a questão da própria viabilidade econômica do empreendimento, que hoje é um empreendimento praticamente subsidiado, porque tudo que se dizia a respeito da viabilidade econômica começa também a ser questionado.

Qualquer pessoa com responsabilidade e probidade, não teria dado a licença sem resolver os problemas.

Então, eu te respondo da seguinte forma: É necessária a energia para o país e é preciso planejamento, acabar com essa historia de ficar fazendo, a cada ameaça de apagão você corre atrás de um empreendimento como se ele fosse o salvador da pátria.

Não sei se as pessoas lembram, mas quem ia salvar a pátria era o Madeira, agora é Belo Monte, daqui a pouco vai ser um outro, o que isso revela? Falta de planejamento.

A gente precisa criar uma sinergia entre as possibilidades de geração de energia, a gente pode ter de eólica, de solar, de biomassa, de hidroeletricidade.

E no campo da biomassa o próprio Ministro Roberto Rodrigues disse que nós poderíamos produzir três Belo Monte só utilizando o bagaço da cana-de-açúcar, que hoje é desperdiçado na sua maior parte. O que eu faria são os investimentos corretos e os planejamentos corretos.”(SILVA, 2010, p. 1)

Veremos nos próximos capítulos, especificamente os direitos e garantias que devem ser preservados para que ocorra uma pacificação acerca da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte.

Sobre a autora
Gabriela Pinheiro de Sousa

Advogada. Bacharel em Direito pela Faculdade de Ensino Superior e Formação Integral - FAEF Garça/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Gabriela Pinheiro. A Usina Hidrelétrica de Belo Monte à luz das normas constitucionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3841, 6 jan. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26325. Acesso em: 23 dez. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!