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Game over, Gideon!

04/04/2014 às 12:22
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Relatam-se as histórias de dois homens com situações semelhantes, réus em processos criminais, sem condições de custear um advogado. O primeiro foi julgado nos Estados Unidos. O segundo, no Brasil. Um viu a justiça diante de si. O outro, nada viu.

Trataremos sobre dois homens. Ambos se chamam Gideon. O primeiro é norte-americano. O segundo sul-africano. Eles responderam a processos criminais. O primeiro, em 1961. O segundo, em 2008.

Ambos tiveram que bater às portas de uma Suprema Corte para ver prevalecer direitos assegurados pela Constituição. Os dois sofreram.  Um mais do que o outro.

Tanto o Gideon norte-americano, quanto o Gideon sul-africano não tinham condições de custear um advogado. Ou suas defesas seriam feitas por defensores públicos ou então não seriam feitas. O primeiro foi julgado nos Estados Unidos. O segundo, no Brasil. Um viu a justiça diante de si. O outro, nada viu.


1. Gideon e os Estados Unidos

Houve um assalto em 3 de junho de 1961 em Bay Harbor Pool, na Cidade do Panamá, Flórida, no qual o criminoso teria quebrado a janela para furtar uma carteira de cigarros e dinheiro. A quantia alvo do furto impressiona: US $ 5,00 (cinco dólares). 

Após investigações, uma testemunha apontou que teria visto Clarence Earl Gideon no mesmo dia e no mesmo local do crime, o que levou a polícia a detê-lo, acusando-o de ter cometido o delito. Gideon foi conduzido à Corte para julgamento.

Na data designada pelo juiz, ele compareceu sem advogado, pois não tinha recursos financeiros suficientes para suportar os gastos referentes à condução do processo. A Corte, então, retrucou afirmando que não poderia apontar um advogado para representar Gideon, tendo em vista que as previsões legais do Estado da Flórida dispunham que a designação judicial de advogado apenas se daria nas hipóteses em que o réu fosse acusado de um crime hediondo, o que não ocorria no caso.

Gideon realizou sua própria defesa por toda a ação penal, arguindo que não cometera o delito. O júri o considerou culpado pelo crime, aplicando-lhe a pena de cinco anos de reclusão.

Não sei se Gideon era supersticioso, mas o mês de agosto sempre atravessava o seu caminho. Para sua alegria e tristeza. A condenação ocorreu em 25 de agosto de 1961. Cinco dias depois, dia 30 de agosto, ele fez aniversário. Completou 51 anos. Estava preso. Não tinha o que comemorar.

Após sua condução ao presídio, Gideon impetrou habeas corpus perante a Suprema Corte, argumentando que o Secretário do Departamento de Execuções da Flórida, Louie Wainwright, teria violado seu direito a ter um advogado no processo penal, assegurado pelo devido processo legal.

Gideon, em verdade, mandou uma carta ao Tribunal na qual narrava sua história e clamava por justiça. A correspondência teve a sorte de ser aberta, lida e convertida num habeas corpus, em face da ausência de formalidades para este tipo de instrumento constitucional voltado para a liberdade de locomoção.

A Corte tinha jurisprudência sedimentada em sentido contrário. No caso Betts v. Brady, 316 U.S. 455 (1942), definiu-se que a presença de advogado nos processos seria necessária apenas nos crimes hediondos e de repercussão nacional, não sendo um direito subjetivo do cidadão americano. O direito garantido pela 6ª Emenda, no sentido de garantir a todos os réus um advogado ad hoc, poderia ser restrito aos crimes federais, sem que o direito constitucional ao devido processo legal fosse atingido.

Mas a Suprema Corte não silenciou. O ministro Hugo Black indagou aos seus pares se seria o momento de revisitar essa jurisprudência e modificá-la. Estamos em março de 1963. A Corte declarou que o direito do réu a ser assistido por um advogado durante todo o rito processual seria um direito fundamental dos cidadãos, essencial para a condução do julgamento, eis que asseguraria as garantias processuais necessárias para a concretização do direito ao devido processo legal.

Segundo a Corte, qualquer réu, rico ou pobre, não poderia ser condenado em processo penal sem que sua defesa fosse realizada por um advogado.

O ministro Douglas assinalou que a Constituição americana não faz distinção entre casos de repercussão nacional e regional para fins da aplicação do direito ao devido processo legal e do direito do réu ser assistido por um advogado na condução do processo penal, sendo que o direito à ampla defesa deveria ser assegurado a todos.

Já o ministro Harlan consignou que, quando a Corte reconhece um direito ao cidadão, revogando entendimento anterior sedimentado por um estado-membro (no caso, a Flórida), não está interferindo na legitimidade regional, mas, ao contrário, aplicando os princípios constitucionais (no caso, o direito ao devido processo legal).

A Suprema Corte invocou princípios relacionados à garantia de um sistema paritário de justiça, especialmente no processo criminal. Qualquer pessoa submetida a processo criminal tem o direito à presença de um advogado para acompanhá-la, nada obstante não possua verbas para custear referido serviço.

Os ministros pontuaram que se o governo gasta soma considerável de dinheiro com o pagamento de promotores para realizar a acusação, é necessário que seja reconhecido direito semelhante a todos os acusados.

O ministro Black afirmou que o direito do réu ser assistido por um advogado não se trata de um luxo, mas de uma garantia mínima necessária à concretização do direito assegurado pela 14ª Emenda: “Não apenas em razão da tradição, mas a Constituição requer que reconheçamos que em nosso sistema criminal dialético, qualquer pessoa submetida a julgamento perante o Judiciário, ainda que não possa contratar advogado, não pode ser processada sem a presença de um advogado, sendo dever da Corte fornecê-lo. Governos federal e estadual gastam soma considerável de dinheiro para manter o salário dos promotores públicos. Do mesmo modo, advogados são essenciais à administração da justiça, essencialmente para proteção do interesse público. Aqueles que possuem dinheiro para contratar advogados o fazem […] Mas, de fato, a presença de advogados nos processos criminais são necessários, não um luxo” – afirmou em seu voto.

O placar foi fabuloso: 9 X 0. A Suprema Corte definiu que os acusados perante tribunais estaduais têm direito a assistência judiciária patrocinada pelo Estado, caso não tivessem condições de contratar um advogado. Este caso sedimentou regra do direito processual penal, considerando-se nula a condução de processo penal sem a presença de um advogado para realização da defesa do réu, sob o fundamento de que este direito seria corolário do devido processo legal, inserto na Constituição pela 14ª Emenda[1].

Meses depois, Gideon foi submetido a um novo julgamento. Dessa vez para a apreciação do mérito da causa, ou seja, para saber se ele tinha ou não cometido o crime de furto. Lembremos novamente o valor em discussão: US$ 5,00 (cinco dólares). 

O julgamento durou uma hora. Gideon foi absolvido. Era dia 5 de agosto de 1963. Novamente o mês de agosto cruza o seu caminho.


2. Gideon e o Brasil

A noite se aproximava. O relógio digital preso a um suporte no teto marcava 18h. Era dia 16 de junho de 2008, uma segunda-feira.

Não estamos mais em Bay Harbor Pool, na Cidade do Panamá, Flórida. Estamos no Aeroporto Internacional de São Paulo – Cumbica, localizado em Guarulhos, no Brasil. Foi ali onde Gideon Johannes Maartens, um sul-africano que morava em Johannesburg, foi preso sob a acusação de tráfico internacional de drogas.

Vindo da cidade de Lima e partindo para Johannesburg, ele trazia consigo aproximadamente oito quilos de cocaína. Ao que consta em seu interrogatório, era utilizado como “mula” para o tráfico internacional por um nigeriano. Desempregado, disse ter aceitado a proposta pelo dinheiro que lhe fora oferecido[2].

Gideon não falava português. Ele foi preso em flagrante, o que deu ensejo à Ação Penal nº 2008.61.19.004545-0, que tramitou na 6ª Vara Federal da 19ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo, distribuída em 17 de junho de 2008. A Defensoria Pública da União iniciou a sua defesa. 

Depois de preso, foi intimado a participar de uma audiência de instrução e julgamento que se daria por meio de um mecanismo de videoconferência, onde o preso, do presídio, falaria com o julgador, que estaria na sua sala em algum fórum longe dali. No caso, no Fórum Federal de Guarulhos, na Sala de Audiências da 6ª Vara Federal.  Data e hora devidamente marcadas: 14 de outubro de 2008, às 13h. Neste ponto, precisamos voltar um pouco no tempo.

Em 14 de agosto de 2007, mais de um ano antes da data prevista para a realização da audiência de Gideon, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional a realização de um interrogatório por sistema de videoconferência[3]. A concessão do habeas corpus com a consequente ordem para anular o processo-crime que tramitou pela 30ª Vara Criminal do Foro Central da comarca da capital-SP, a contar do interrogatório do paciente, teve por fundamento a ausência de expressa previsão legal para a realização do procedimento de interrogatório on line[4].

Na oportunidade, o ministro Cezar Peluso afirmou: “Política criminal não é tarefa que caiba ao Poder Judiciário, cuja função específica ‘é solucionar conflitos, tutelando a liberdade jurídica, e não socorrer o Poder Executivo, em suas falhas e omissões’. E não posso deixar de advertir que, quando a política criminal é promovida à custa de redução das garantias individuais, se condena ao fracasso mais retumbante”.[5]

Somente em janeiro de 2009 a questão da inconstitucionalidade de leis estaduais que tratavam sobre interrogatório criminal por meio de sistema de videoconferência foi sanada[6]. Não custa lembrar que o dilema de Gideon se deu em agosto de 2008.

Além de ter sido obrigado a se submeter a um interrogatório por videoconferência, ele tinha outro receio. Ele temia a utilização de algemas.

Acontece que o STF, ao julgar o Habeas Corpus nº 91.952/SP, viu o ministro Cezar Peluso pedir a palavra e sugerir: “Senhor Presidente, consulto a Vossa Excelência e à Corte se não seria caso de, diante dos precedentes e de mais esse julgamento pelo Plenário, editarmos súmula que sintetize o pensamento do Tribunal, a despeito de ter sido aprovado, porque nem sabemos se isso se converterá em lei, recente projeto do Senador Demóstenes Torres e que basicamente atende a todas as exigências da decisão da Corte. Talvez fosse oportuno que a Corte editasse uma súmula”.[7]

O Ministro propunha, ali, o que posteriormente virou a Súmula Vinculante nº 11, que dispõe: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”.

 A Súmula foi aprovada em 13 de agosto de 2008, antes da realização da audiência de instrução designada. Dois dias antes, 11 de agosto, Gideon fez aniversário. Ele completou 39 anos.  Estava preso. Não tinha o que comemorar.

No julgamento do referido Habeas Corpus que ensejou a Súmula Vinculante das Algemas, o ministro Cezar Peluso registrou:

Senhor Presidente, eu tinha feito também anotação para recorrer às duas normas constitucionais que, a meu ver, com a abstração de todo ordenamento infraconstitucional, já seriam suficientes para qualificar como ilícito o uso indevido e desnecessário das algemas: as disposições do artigo 5º, III – aliás, é conhecidamente a repetição do artigo 5º da Declaração Universal dos Direitos do Homem -, e o inciso XLIX, que assegura a integridade física e moral do preso, isto é, do preso sob qualquer título.

Portanto, Senhor Presidente, não há dúvida nenhuma de que, perante o ordenamento jurídico brasileiro, no plano constitucional e infraconstitucional, o uso desnecessário das algemas constitui ato ilícito que pode configurar, no mínimo, abuso de autoridade e, no máximo, crime de tortura. Os autores – não vou citá-los – referem-se à possibilidade de que, diante das circunstâncias, o uso das algemas seja tal, que se equipare ao crime de tortura.[8]

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O cenário era o melhor possível. No processo de Gideon, foram determinadas duas providências: 1) a realização da audiência de instrução por meio de videoconferência, decisão cuja base o STF já havia se manifestado contrariamente; 2) a utilização de algemas, outra medida sobre a qual o Supremo também tinha posição contrária e, neste caso, por meio de Súmula Vinculante. Não tinha como dar errado.

No entanto, o resultado brasileiro foi diverso. Negou-se os dois pedidos que foram, no momento da audiência, formulados pelo defensor público.

Ele foi algemado pelas mãos e pelos pés. Como a audiência seria pelo sistema de videoconferência, o que impunha ao acusado segurar um aparelho telefônico, Gideon fê-lo com as duas mãos, durante todo o tempo, levando-as próximo ao seu ouvido, raspando sua face. Ele era casado, primário e tinha bons antecedentes.

A Defensoria Pública da União formulou junto ao STF a Reclamação nº 6963 contra as determinações, requerendo a anulação da audiência de instrução e julgamento. Ela foi distribuída dia 5 de novembro de 2008, pouco depois das 15h. A relatoria cabia ao ministro Cezar Peluso, o mesmo julgador que se manifestara firmemente contra o interrogatório por vídeo-conferência e que sugeriu a Súmula Vinculante das Algemas.

Dia 10 de novembro o site do Supremo estampou a manchete: “Sul-africano algemado pelos pés e mãos durante interrogatório reclama ao STF”:

Sul-africano algemado pelos pés e mãos durante interrogatório reclama ao STF

A Defensoria Pública da União apresentou no Supremo Tribunal Federal (STF) Reclamação (RCL 6963) contra uma juíza paulista por desrespeito à Súmula Vinculante nº 11 ao determinar o uso de algemas nos pés e nas mãos do sul-africano Gideon Johannes Maartens durante o depoimento.

Gideon Maartens foi preso no aeroporto de Guarulhos por tráfico internacional de drogas portando oito quilos de cocaína. Na ocasião de seu depoimento, a Defensoria pediu que fosse observada a súmula que limita o uso de algemas a casos excepcionais e também pediu que a audiência não ocorresse por meio de videoconferência.

No entanto, a juíza entendeu ‘perfeitamente justificável’ o uso das algemas em razão do depoimento ter ocorrido numa sala, trancada, dentro do presídio, somente na companhia do operador do equipamento de videoconferência. ‘A manutenção do réu algemado é imprescindível para acautelar-se a integridade física de tal servidor e também a dele próprio’, afirmou a juíza.

Para a Defensoria, a decisão desrespeitou a dignidade do réu e, por isso, pede que o STF anule a audiência por causa da ‘restrição de mobilidade física’ e pela ‘impossibilidade de exercer plenamente sua defesa’[9].

Era impossível perder. Gideon tinha como relator o ministro Peluso, o mesmo que havia se manifestado de forma tão contundente tanto contra a realização de audiências por vídeo-conferência como que sugerira a edição da Súmula Vinculante das Algemas.

No dia seguinte, 11 de novembro, o caso foi decidido. Era a grande aposta de Gideon e da Defensoria Pública no ideal de justiça. O caso era simples: bastava que o STF seguisse seus próprios precedentes. O ministro Peluso, na decisão, registrou: “(...) A decisão impugnada não afronta a autoridade da Súmula Vinculante nº 11 na medida em que justifica, por escrito, a excepcionalidade do uso de algemas, sobretudo pelas circunstâncias em que realizada a audiência de instrução e julgamento. Acrescente-se que a licitude do uso de algemas, na hipótese, é lastreada por recomendação expressa subscrita pela autoridade responsável pela unidade prisional, em cujas dependências se realizou o ato processual”.

Era o fim da linha. A Reclamação foi negada. Nenhum dos direitos invocados assistia ao acusado. Fora mantida a audiência por videoconferência e a utilização das algemas nas mãos e nos pés de Gideon. 

Posteriormente, em entrevista à Revista Eletrônica Consultor Jurídico, o ministro Cezar Peluso falou a respeito da Súmula Vinculante das Algemas e expôs sua opinião sobre cidadãos sem antecedentes criminais serem algemados pelas mãos e pés: “(...) O piloto brasileiro Hélio Castro Neves agora está sendo processado nos Estados Unidos por problemas de impostos. Ele é conhecidíssimo lá, campeão de automobilismo. Noticiaram que foi preso e algemado, não apenas pelas mãos, mas também pelos pés. A pergunta é: para quê? O que os órgãos policiais, o Estado e a sociedade ganharam com isso? Nada. Se ele tinha que ser preso, provavelmente teria acompanhado o policial da captura andando normalmente ao seu lado. O que o Supremo quis reprimir, com aquela súmula vinculante, foi exatamente isso: o excesso ou abuso (...)”[10] - comentou.

Enquanto o Gideon norte-americano é lembrado como alguém que viu seus direitos serem assegurados, o outro não é sequer lembrado. Nem será.


Notas

[1] Gideon v. Wainwright, 372 U.S 335 (1963). Disponível em: <http://www.oyez.org/cases/1960-1969/1962/1962_155/>. Acesso em: 10 set. 2008.

[2] Interrogatório no auto de prisão em flagrante no Inquérito Policial nº 21.0490/08.

[3] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 88.914/SP, DJ: 05-10-2007: EMENTA: AÇÃO PENAL. Ato processual. Interrogatório. Realização mediante videoconferência. Inadmissibilidade. Forma singular não prevista no ordenamento jurídico. Ofensa a cláusulas do justo processo da lei (due process of law). Limitação ao exercício da ampla defesa, compreendidas a autodefesa e a defesa técnica. Insulto às regras ordinárias do local de realização dos atos processuais penais e às garantias constitucionais da igualdade e da publicidade. Falta, ademais, de citação do réu preso, apenas instado a comparecer à sala da cadeia pública, no dia do interrogatório. Forma do ato determinada sem motivação alguma. Nulidade processual caracterizada. HC concedido para renovação do processo desde o interrogatório, inclusive. Inteligência dos arts. 5º, LIV, LV, LVII, XXXVII e LIII, da CF, e 792, caput e § 2º, 403, 2ª parte, 185, caput e § 2º, 192, § único, 193, 188, todos do CPP. Enquanto modalidade de ato processual não prevista no ordenamento jurídico vigente, é absolutamente nulo o interrogatório penal realizado mediante videoconferência, sobretudo quando tal forma é determinada sem motivação alguma, nem citação do réu.

[4] Pouco mais de um ano depois, em 30 de outubro de 2008, novamente estava o STF diante de um caso que reclamava manifestação sobre a constitucionalidade ou não da utilização da videoconferência em interrogatórios tomados em processos criminais. A Corte declarou formalmente inconstitucional a Lei Estadual nº 11.819, de 2005, que estabelecia a possibilidade da utilização do sistema de videoconferência no Estado de São Paulo. O placar foi de 9 X 1. O tema foi debatido no Habeas Corpus nº 90.900/SP, de relatoria da Ministra Ellen Gracie. Os ministros entenderam que cabe somente à União legislar sobre a matéria (processo penal). A Relatora ficou vencida. Com a decisão, o Plenário anulou o processo, declarou a inconstitucionalidade formal da norma paulista e concedeu alvará de soltura em favor do acusado.

[5] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 88.914/SP, DJ: 05-10-2007.

[6] Foi aprovada a Lei nº 11.900, de 8 de janeiro de 2009, que “Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, para prever a possibilidade de realização de interrogatório e outros atos processuais por sistema de videoconferência, e dá outras providências”.

[7] Transcrição do acórdão prolatado no julgamento do referido HC. Cf. página 899. 

[8] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 91.952/SP, de relatoria do ministro Marco Aurélio, julgado em 07.08.2008 (DJe-241 19.12.200): ALGEMAS - UTILIZAÇÃO. O uso de algemas surge excepcional somente restando justificado ante a periculosidade do agente ou risco concreto de fuga. JULGAMENTO - ACUSADO ALGEMADO - TRIBUNAL DO JÚRI. Implica prejuízo à defesa a manutenção do réu algemado na sessão de julgamento do Tribunal do Júri, resultando o fato na insubsistência do veredicto condenatório.

[9] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Notícias do sítio do STF. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=98777&caixaBusca=N.

[10] HAIDAR, Rodrigo. O justo e o legal: Há completo desprezo pela legalidade no Brasil. Revista Consultor Jurídico, 1º fev. 2009. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2009-fev-01/entrevista-cezar-peluso-ministro-supremo-tribunal-federal Acesso em: 04 mai. 2009.

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Sobre o autor
Saul Tourinho Leal

Professor de Direito Constitucional do Intituto de Ensino Superior de Brasília (IESB). Mestrando em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEAL, Saul Tourinho. Game over, Gideon!. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3929, 4 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27432. Acesso em: 22 dez. 2024.

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