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Paradigmas traçados pela jurisprudência do STF para condução de demandas por medicamentos não padronizados pelo SUS.

Casos polêmicos do canabidiol e fosfoetanolamina

Paradigmas traçados pela jurisprudência do STF para condução de demandas por medicamentos não padronizados pelo SUS. Casos polêmicos do canabidiol e fosfoetanolamina

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Reflexão sobre as definições trazidas pela STA n.º 175 do STF que nortearam a maioria dos julgamentos de demandas por medicamentos e tratamentos médicos não padronizados pelo SUS. Considerações sobre o caso do Canabidiol e da Fosfoetanolamina.

Resumo: Este trabalho se propõe a refletir sobre as definições trazidas pela Suspensão de Tutela 175 julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que balizou grande parte das decisões judiciais sobre medicamentos e tratamentos médicos depois de sua prolação, fazendo uma esquematização das diferentes situações e o cotejo com casos práticos atuais e de grande repercussão, como o do Canabidiol e da Fosfoetanolamina Sintética.

Palavras-chave: Direito à Saúde. Jurisprudência do STF sobre concessão de medicamentos não padronizados pelo SUS. Suspensão de Antecipação de Tutela n.º 175. Canabidiol. Fosfoetanolamina Sintética.


INTRODUÇÃO

O escritor português José Saramago, em sua obra Intermitências da Morte1, desenvolve uma história fantástica, onde a morte, dita “indesejada das gentes”, magoada com constante incompreensão, cansada de ser detestada pela humanidade, resolve fazer greve, e naquele estranho canto do mundo que serve de cenário, ninguém mais morre, o que inicialmente é festejado, mas logo se revela um problema de efeito cascata, porque as pessoas continuavam a ficar doentes e lotar os hospitais, só não morriam. Os idosos avançavam na decrepitude sem esperança de descanso nem para eles, nem para as suas famílias. Os serviços funerários ficaram sem trabalho e a própria igreja, desacreditada sem a esperança da ressureição. O capricho da morte em se negar a trabalhar, implicou em questões previdenciárias, econômicas, etc., que nos conduzem a inúmeras reflexões.

Trabalhar com pretensões relacionadas ao direito à saúde e as suas limitações, de forma menos fantasiosa, também nos conduz por labirintos de difícil saída, justamente porque são reais e nos causam empatia.

A concretização, pelo Estado, de ações eficientes de saneamento, campanhas de vacinação e, em geral, foco na saúde básica da população ensejaram, com o seu desenvolvimento, a erradicação e/ou controle de doenças mais simples, elevando a expectativa de vida da população, retardando a morte de um modo geral. Essa situação, de forma menos fantasiosa do que a fábula de Saramago, também traz consequências. Uma delas é que, devido às diferenças regionais brasileiras, e a maneira não uniforme com que esse desenvolvimento chega à população, como aponta Gustavo Amaral2, uma parte da sociedade brasileira sofre de doenças “modernas” ou “da riqueza” (consideradas típicas de países desenvolvidos), ao passo que outra parcela da população ainda sofre com as “doenças da miséria” (como febre amarela, cólera e malária). Todas essas situações, porém, concorrem pelos mesmos recursos estatais, que tem de ser alocados planejadamente, levando em consideração fatores estatísticos, como o número de cidadãos atingidos pela política eleita, a efetividade e a eficácia do serviço a ser prestado, a maximização dos resultados. Políticas públicas são uma questão de macro justiça.

O direito à saúde é universal, portanto, mesmo os integrantes da parcela do Brasil que sofre das “doenças da riqueza”, têm direito à concretização de seu direito constitucional. Normalmente, até porque essa parcela da população está em um outro patamar de esclarecimento, eventualmente não se contenta com os tratamentos disponíveis em condições de igualdade para todos os usuários do sistema de saúde pública, e buscam na Justiça, o custeio, pelo SUS, de tratamentos não incorporados às diretrizes terapêuticas estabelecidas para a sua doença. Esses medicamentos ou tecnologias diferenciadas são frequentemente caríssimos e de eficácia não comprovada, mas o seu pleito judicial coloca os magistrados na dificílima situação de, sendo responsáveis pelo micro justiça, ter de negar ou deferir medicamentos a uma pessoa com nome, sobrenome, identidade, ou seja, uma vida humana determinada, o que é muito diferente de trabalhar com estatísticas.

Nada é simples nessa seara. Basta ver a grande discussão do momento, que é a distribuição da Fosfoetanolamina Sintética, propalada como o milagre contra o câncer, e que levou o STF a contradizer suas próprias recentes afirmações e determinar o custeio, pelo Estado, de uma droga que estava em fase de estudos e que sequer havia sido testada em humanos, enquanto boa parte dos mais renomados oncologistas do país critica o emprego de verbas públicas na pesquisa da Fosfoetanolamina. Em extensa matéria veiculada no jornal Zero Hora3, a comunidade médica gaúcha atesta receber com desconforto a decisão do governo do Estado do Rio Grande do Sul de dedicar esforços e recursos do laboratório farmacêutico do estado (LAFERGS) para o estudo da substância, considerando que o Rio Grande do Sul estaria “quebrado”, sem dinheiro sequer para fornecer aos pacientes do SUS as drogas que já estão liberadas, que dirá para fazer pesquisas a fundo perdido. Já os doentes terminais de câncer, bem como seus familiares, veem como absurdo não desenvolver o estudo da fosfoetanolamina, cujo uso compassivo pode ser a sua única esperança.

O comprometimento do nosso país com o direito fundamental social à saúde, um dos pilares da dignidade da pessoa humana, está acertado, inclusive, em acordos internacionais. O Brasil é firmatário do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 16 de dezembro de 1966 (ratificado pelo Decreto n.º 591 de 6/07/1992), cujo artigo 12 impõe aos estados o dever de adotar medidas apropriadas de caráter legislativo, administrativo, orçamentário, judicial ou de outra natureza para conferir plena efetividade ao direito à saúde, ainda que com certa margem de discricionariedade para adaptação às circunstâncias específicas de cada país4. O Brasil também é signatário do Protocolo de São Salvador adicional à Convenção Interamericana de Direitos Humanos de (CIDH) de 1988 (promulgado em 30/12/1999 pelo D. n.º 3.321), em cujo artigo décimo é afirmado que toda pessoa tem direito à saúde, entendida como o gozo do mais alto nível de bem‑estar físico, mental e social. Os compromissos internacionais assumidos se coadunam com o que a nossa Constituição assegurou, ou seja, a saúde como direito social fundamental previsto no artigo 6º, e explicitado melhor no artigo 196, que baliza as políticas públicas na área da saúde pelos princípios da universalidade, integralidade e isonomia no atendimento.

O Legislador constituinte delineou as políticas públicas para a saúde no art. 196. e 198 da Constituição, remetendo, no art. 197, a sua disciplina mais específica para a lei. Cidadãos brasileiros e também estrangeiros que estiverem no país (CF, 5º, caput) tem assegurado o direito à saúde.

Ao Poder Executivo, coube, e cabe, cumprir essas políticas públicas, o que é feito através do Sistema Único de Saúde, regulamentado pelas leis n.º 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde) e 8.142/90 (que dispõe sobre a participação da comunidade e transferências intergovernamentais), pelas Normas Operacionais Básicas (NOBs) 91, 93, 96 e Normas Operacionais da Assistência à Saúde (NOAS-SUS) 01/01 e 01/02; Pacto pela Saúde 2006; Decreto 7.508/11 e as atualizações constantes como a Portaria 2.488/11, Lei Complementar 141/12 e Lei 12.401/11, além, é claro de uma gama de atos normativos que delineiam de forma mais abrangente todas as especificidades do sistema.

Ao Judiciário, por sua vez, cabe dizer o direito nos casos em que for provocado, observando a legislação de regência sobre a matéria e, sobretudo, a Constituição.

A provocação do Judiciário para a efetivação de pretensões relativas à salvaguarda e promoção da saúde dos cidadãos é constante e cresceu de tal forma nos últimos anos, que o Comitê Estadual de Saúde do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS) hoje comemora a redução do “estoque” de aproximadamente trinta mil (30.000) ações judiciais relacionadas a medicamentos e tratamentos médicos, só na Justiça Estadual. Essa diminuição é atribuída a adoção da Recomendação nº 36 do CNJ e a Resolução n.º 107, que instituiu o Fórum Nacional do Judiciário para monitoramento e resolução dessas ações.

A preocupação do Conselho Nacional de Justiça é plenamente justificada. Levantamento5 do número de ações judiciais dessa natureza feito em 2011 revelava que no Brasil, apenas na Justiça Estadual, em 2011, haviam 240.980 (duzentas e quarenta mil, novecentos e oitenta ações), sendo que o Estado do Rio Grande do Sul concentrava quase a metade do número delas. Ao mesmo tempo, outro tanto de ações começou a migrar ou ser ajuizado diretamente na Justiça Federal, com a inclusão da União no polo passivo dessas demandas, legitimidade passiva que ficou assentada de forma cristalizada com o recente julgamento do tema 793 do STF pelo sistema de recursos representativos de controvérsia.

Segundo levantamento divulgado em 25/11/2015, no Blog do Jornalista Fernando Rodrigues para o site UOL6, os gastos do Ministério da Saúde com decisões judiciais aumentaram 744% (em valores reais, isto é, corrigidos pela inflação) de 2005 a 2015, segundo dados levantados junto ao Ministério da Saúde. Em 2005, a pasta gastou R$ 62,6 milhões (valor da época) para cumprir determinações da Justiça relativas a tratamentos e medicamentos. Em 2015, até agora, o valor é de pelo menos R$ 922,4 milhões, sendo que das vinte drogas mais demandadas, dez sequer possuem registro na ANVISA.

O cálculo do próprio Ministério é de que o valor já superou R$ 1 bilhão de reais em 2015, sendo que apenas 38 pacientes consumiram R$ 56.000.000,00 (cinquenta e seis milhões de reais), e o paciente que consumiu mais recursos consumiu, sozinho, R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais).

Registre-se que a judicialização das questões relativas à proteção do direito à saúde não são um fenômeno exclusivamente brasileiro. Ricardo Perlingeiro7 ressalta que há semelhante proporção em países como Uruguai, Argentina, Chile, Paraguai, Colômbia, Equador, Venezuela, Bolívia, Peru e México. Isso ocorre, como afirmou o Ministro Luis Roberto Barroso8 porque as normas constitucionais deixaram de ser percebidas como integrantes de um documento estritamente político, mera convocação à atuação do Legislativo e do Executivo, e passaram a desfrutar de aplicabilidade direta e imediata por juízes e tribunais. Nesse ambiente, os direitos constitucionais em geral, e os direitos sociais em particular, converteram-se em direitos subjetivos em sentido pleno, comportando tutela judicial específica.

No Brasil, inicialmente, as demandas judiciais na área da saúde, em sua maioria, diziam respeito a medicamentos e/ou insumos (lato sensu) constantes das listas do SUS, de modo que ações de planejamento e gestão sistêmicos conseguiram reduzir esse contingente. Apesar de as falhas do serviço, como falta de leitos hospitalares de urgência e emergência (inclusive UTI) e filas de espera excessivamente demoradas, ainda representarem boa parte dos processos ajuizados, se “evoluiu” para uma “segunda fase” da judicialização. Hoje parcela significativa da judicialização diz respeito à pretensão de obter do SUS o custeio de medicamentos, insumos, órteses, próteses ou tratamentos não incorporados ao Sistema e, portanto, indisponíveis em condições de igualdade para toda a população.

Via de regra, são demandas por tecnologias, medicamentos, tratamentos ou técnicas novas, que pelos mais diversos motivos, ainda não foram (e talvez sequer sejam) incorporadas ao SUS. Outras vezes, o objeto demandado sequer possui registro na ANVISA, e, portanto, não podem ser comercializados no país, trata-se de medicamento ou tratamento importado ou experimental.

As demandas por tratamentos diferentes dos disponíveis crescem exponencialmente, em sua maioria patrocinadas pelo Ministério Público e Defensoria Pública, embora também a advocacia privada tenha larga participação na judicialização. É interessante observar que “hipossuficiência” em matéria de saúde é algo muito relativo: mesmo uma pessoa com boas condições financeiras pode não ter condições de custear tratamentos médicos excessivamente caros, os chamados “medicamentos de alto custo”.

O foco do presente trabalho, que tem um viés bastante prático, porque a autora trabalha na COREMED (Coordenação Regional de Medicamentos) da Procuradoria Regional da União na 4ª Região, defendendo a União justamente em ações judiciais versando sobre direito à saúde, é demonstrar como a decisão na Suspensão de Tutela n.º 175 proferida pelo STF traçou limites que foram absorvidos e aplicados pelos operadores do direito, e como os mais recentes e polêmicos casos de judicialização se enquadram nas definições traçadas por essa antológica decisão.


1. A Suspensão de Tutela Antecipada n.º 175 – Comentários às definições trazidas pela decisão.

Como salientam Gilmar Ferreira Mendes e Paulo Gustavo Gonet Branco9, os contornos do direito à saúde há tempos vem sendo delineados em diversos julgados do Supremo Tribunal Federal. A legitimidade e a solidariedade entre os entes federativos (União, Estado e/ou Distrito Federal e Município demandados) no que diz respeito ao cumprimento das decisões deferindo medicamentos, órteses, próteses, suplementos alimentares, ações e serviços de saúde, etc., foi inicialmente assentada no ano de 2000, no Recurso Extraordinário n.º 195.192-3/RS, cuja ementa do acórdão referia que Incumbe ao Estado (gênero) proporcionar meios visando a alcançar a saúde, especialmente quando envolvida criança e adolescente. O Sistema Único de Saúde torna a responsabilidade linear alcançando a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Esse entendimento foi recentemente reafirmado no RE 855178, (tema 793 do STF), julgado, em 16/03/2015, pela sistemática dos recursos repetitivos.

O STF, por unanimidade, reputou constitucional a questão e reconheceu a repercussão geral do tema 793. No mérito, por maioria, vencidos os Ministros Teori Zavascki, Roberto Barroso e Marco Aurélio, reafirmou que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados, podendo o polo passivo ser composto por qualquer um deles, isolada ou conjuntamente.

De fato, a explosão de ações judiciais buscando medicamentos e tratamentos médicos junto ao Sistema único de Saúde (SUS), tem implicado em um protagonismo significativo do Judiciário sobre a questão, inclusive ensejando reconfigurações orçamentárias e estratégicas no âmbito governamental10, diante do volume de recursos que as condenações judiciais movimentam. As liminares antecipatórias em matéria de saúde, principalmente em ações coletivas, cedo bateram às portas do STF, mediante a utilização de Procedimentos Excepcionais: Suspensão de Execução de Liminar (Lei 8.437/92), Suspensão de Execução de Tutela Antecipada (Lei 9.494/97) e Suspensão de Segurança ou de Sentença (Lei 4348/64). Foi através do julgamento de um desses procedimentos excepcionais que o STF delineou boa parte dos parâmetros que são utilizados até hoje para julgamento de ações de postulando prestações em saúde.

Esses procedimentos ajuizados perante a presidência dos Tribunais Superiores, STF e STJ, conforme a matéria seja constitucional ou infraconstitucional, não possuem natureza jurídica de recurso, e não se prestam à cassação da decisão guerreada ou à análise do mérito da causa, mas à simples “suspensão” de decisões cuja extrema gravidade à ordem pública possa ser demonstrada documentalmente. As suspensões são uma forma de uma “contracautela”, embasada em aspectos políticos que não “devolvem” o conhecimento da matéria de fundo para a reforma. São procedimentos acautelatórios especiais, incidentes processuais de cunho cautelar11, cuja análise deve-se restringir à verificação de efetiva e grave lesão à ordem pública (ordem jurídica, administrativa, econômica ou saúde pública).

Pois bem, aqui começa a história da Suspensão de Tutela Antecipada n.º 175, para a qual se dedica este capítulo.

Principalmente a partir do ano de 2005, muitas ações coletivas vinham sendo ajuizadas pelo Ministério Público, e posteriormente também pela Defensoria Pública, em face dos entes federativos visando a concessão de medicamentos não previstos nas políticas públicas de saúde. Temendo o chamado “efeito multiplicador” dessas decisões e o decorrente temor de abalo à ordem pública (organização do SUS) e econômica (desvio de verbas da saúde para tratamentos não previstos), e atentas ao fato de que a matéria de fundo das ações em questão era eminentemente de fundo Constitucional, as Procuradorias dos entes públicos demandados, esgotadas as vias ordinárias de recurso contra as liminares, que passaram a ser sistematicamente concedidas, ajuizavam perante o Supremo Tribunal Federal, suspensões de segurança, ou suspensões de tutela antecipada, conforme fosse a figura apropriada, em razão da sede em que proferida a decisão: se uma liminar em mandado de segurança, ou se uma antecipação de tutela.

A Ministra Ellen Grace Northfleet, que sucedeu o Ministro Nelson Jobim na presidência da Suprema Corte, a partir de 2006, tal qual seu imediato antecessor, julgou inúmeros pedidos de suspensão, como, p.ex., o requerido pelo Estado da Paraíba12, em relação a suspensão de diversas liminares em mandado de segurança que ordenaram àquele ente federado que fornecesse, gratuitamente, Citrato de Sildenafil (nome comercial Viagra). O fundamento residia no alegado prejuízo à ordem administrativa, uma vez que estariam sendo subvertidas as regras previstas pela Portaria Ministerial n° 1.318/2002, que estipulam quais medicamentos devem ser distribuídos à população, ilegitimidade passiva do ente demandado em razão da repartição de competências do SUS, vulneração à economia pública, pela absorção de recursos muito elevados para um pequeno número de beneficiários, interferindo no orçamento para a saúde do Estado, bem como o chamado efeito multiplicador . Considerando que decisões liminares estavam amparadas nos princípios constitucionais garantidores da inviolabilidade do direito à vida e à saúde (arts. 5°, caput e 196 da Constituição Federal a presidência do STF reconheceu sua competência e julgou no sentido de que a grave lesão não poderia ser presumida, devendo ser demonstrada, o que não teria ocorrido. Ademais, configurava-se o chamado periculum in mora inverso aos impetrantes, uma vez que a opção era por prestigiar o direito à vida e à saúde. Já em 2006, a Presidência do STF citando o parecer da Procuradoria-Geral da República:

"9. De forma reiterada, esse Supremo Tribunal Federal, por meio de sua Presidência, tem se pronunciado no sentido de que o deferimento da medida da contracautela, em casos como este, acarretaria o chamado periculum in mora inverso ao beneficiário, uma vez comprovada a necessidade vital do medicamento e a impossibilidade do custeio da aquisição da medicação ora pleiteada, pelo particular. À propósito, SS 2793, SS 2842, SS 2873, entre outras. (...)"

Sucedeu a Ministra Ellen Gracie Northfleet, em 2008, o Ministro Gilmar Ferreira Mendes sendo que não tardou a se deparar com semelhantes pedidos de suspensão de segurança e de tutela antecipada que viraram rotina na suprema corte, o que o motivou a convocar uma Audiência Pública para discutir a questão, oportunidade em que ocorreram cinquenta e uma palestras sobre o tema, sendo que o objetivo precípuo foi identificar potenciais medidas para contornar o problema da massiva judicialização das demandas por medicamentos e tratamentos médicos.

Mendes e Branco13 referem que foi justamente a existência de um número significativo de demandas judiciais relacionadas ao direito à saúde que motivou a convocação pela Presidência do STF da audiência pública que ocorreu entre os dias 27 a 29 de abril e 4 a 7 de maio de 2009, transformando a Suprema Corte em um Fórum para reflexão e argumentação entre elaboradores e executores de políticas públicas, profissionais da área da saúde e a sociedade civil como um todo.

A conclusão, referem indigitados autores, é que restou clara a necessidade de redimensionar a questão da judicialização da saúde no Brasil. Isso porque, como já indicado, na maioria dos casos, a intervenção judicial não ocorre tendo em vista uma omissão (legislativa) absoluta em matéria de políticas públicas voltadas à proteção do direito à saúde, mas ao cumprimento inadequado de políticas já existentes.

A oportunidade de uma nova diretriz em relação às ações postulando medicamentos e tratamentos médicos veio em seguida, em setembro de 2009, com o julgamento de um pedido de suspensão ajuizado ainda em 2007, contra decisão da 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que deferiu, nos autos da Apelação Cível no 408729/CE, antecipação de tutela recursal para determinar à União, ao Estado do Ceará e ao Município de Fortaleza o fornecimento do medicamento denominado Zavesca (Miglustat), em favor de CLARICE ABREU DE CASTRO NEVES, portadora da doença Niemann-Pick Tipo “C”. O medicamento em questão, à época, sequer possuía registro na ANVISA. Apenas a título de curiosidade, atualmente, trata-se de medicamento registrado na ANVISA, passível de comercialização no Brasil, porém não incorporado ao SUS.

Essa antecipação de tutela ensejou o ajuizamento do pedido de suspensão de tutela antecipada nº 175, (pela União), e nº 178 (pelo Município de Fortaleza), que vieram a ser julgados conjuntamente. Tratava-se de uma ação civil pública, com pedido de extensão dos efeitos para todos os pacientes em semelhantes condições, que necessitassem do medicamento.

A decisão na STA 17514 redimensionou a questão da judicialização da saúde no Brasil, trazendo de forma sistemática diversas definições importantíssimas para a solução segura desse tipo de demanda. Já se passaram vários anos desde a publicação da decisão em questão, e até hoje ela vem sendo o principal precedente invocado nos julgamentos destas ações. Note-se que apesar de a suspensão de segurança ter sido indeferida, o Ministro Gilmar Mendes estabeleceu uma série de parâmetros muito úteis para conter o abuso na judicialização, estimulado por precedentes ilimitadamente favoráveis, que acarretam uma situação nociva à própria manutenção e mesmo existência do sistema de saúde pública.

Sueli Gandolfi Dallari15 resumiu muito bem os parâmetros sistematizados pela STA 175, para serem utilizados como uma espécie de guia na condução dos processos judiciais sobre direito à saúde:

  1. Verificar se existe política pública que diga respeito à prestação de saúde pleiteada no caso concreto.

  1. Na hipótese de que não haja a política estatal específica, o Judiciário deve considerar:

a) a existência de vedação legal para o fornecimento do medicamento, ou seja, os juízes devem verificar se o medicamento possui registro na ANVISA;

b) a existência de decisão do SUS de não fornecer o medicamento, expressa em Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas do SUS atualizados;

c) se o medicamento encontra-se em fase de testes clínicos na indústria farmacêutica;

d) se o tratamento alternativo oferecido pelo sistema público é adequado para o caso específico do paciente;

e) se o Executivo comprovou se haveria grave lesão à ordem, à economia, à saúde e à segurança pública na hipótese de concessão da tutela jurisdicional pretendida pelo paciente. Nesse voto o Ministro Gilmar Mendes insiste em que nenhum dos parâmetros é irrecorrível, mas que nas hipóteses suscitadas é imprescindível que haja instrução processual, com ampla produção de provas, o que poderá configurar-se um obstáculo à concessão de medida cautelar.

Se a salvaguarda ilimitada à saúde do indivíduo, em um ambiente de natural escassez, foge à razoabilidade, se existem limites, vemos a necessidade de sedimentar a compreensão desses parâmetros traçados pelo STF, bem como trazê-los para o estudo das diferentes situações vivenciadas no dia-a-dia forense, em relação aos tratamentos postulados pelos jurisdicionados.

1.1. Comentários à primeira definição – A existência de política pública e os diferentes casos de demandas por medicamentos.

O primeiro dado a ser considerado é a existência, ou não, de política estatal que abranja a prestação de saúde pleiteada pela parte. Ao deferir uma prestação de saúde incluída entre as políticas sociais e econômicas formuladas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o Judiciário não está criando política pública, mas apenas determinando o seu cumprimento. Nesses casos, a existência de um direito subjetivo público a determinada política pública de saúde parece ser evidente.

Se a prestação de saúde pleiteada não estiver entre as políticas do SUS, é imprescindível distinguir se a não prestação decorre de uma omissão legislativa ou administrativa, de uma decisão administrativa de não fornecê-la ou de uma vedação legal a sua dispensação.

O STF estabelece, nesse trecho, que o passo inicial para a análise de um pleito por medicamentos e/ou tratamentos médicos (lato sensu) é verificar se o SUS possui algum tratamento para a patologia apresentada pelo demandante. Em outras palavras, é aferir se o SUS possui uma política pública para tratamento da doença apresentada pela parte. A princípio, pelo princípio da integralidade, não deve existir doença sem tratamento no SUS, o que também não significa que todo e qualquer tratamento existente deve estar disponível.

Então a pergunta inicial a ser feita é: existe no SUS previsão de tratamento para esta doença (teoricamente tem que existir) e qual é esse tratamento previsto? Este tratamento já foi tentado no paciente? Sim ou Não? Se sim, porque não é possível que ele utilize o tratamento disponível em condições de igualdade para toda a população?

Essas perguntas são cruciais na medida em que, como Refere Luciano Benetti Timm16, analisando a questão sob a perspectiva econômica do Direito, há um conflito de interesses entre quem está pleiteando um medicamento e a coletividade (contribuinte que está sendo tributado pelo Estado com vistas ao fornecimento de bens ou serviço público alternativo àquele discutido em um processo judicial). Trata-se de analisar o tema sob a perspectiva das chamadas externalidades inerentes a essa situação, como bem ressalta Suélen Farenzena17, ao pontuar que o argumento de que apenas a decisão justa entre as partes é que interessa é falacioso, pois, se terceiros são atingidos pela decisão, o caso não é mais apenas entre as partes. Por suposto que deferir, judicialmente, um medicamento e/ou tratamento diferenciado daquele disponível na via administrativa (sem socorro judicial), importa em remanejo de recursos escassos e traz consequentes efeitos reflexos.

O Ministério da Saúde refere que a gravidade do quadro da judicialização da saúde no Brasil não está limitada ao gasto irracional que promove (tendo como consequências a perda da capacidade de administrar compras, a ineficiência em relação à escala, mas também, e principalmente, refere-se aos prejuízos à própria lógica do Sistema, o que induz novos gastos e a criação de um atendimento ao cidadão absolutamente diverso do estabelecido pelas Políticas traçadas.18

Assim, se há uma política pública, a princípio, é ela que tem de ser aplicada, e só em caso de comprovada ausência pontual de efetividade do tratamento disponível, é que se pode passar a pensar em uma solução diferenciada.

O STF entende, que pelo princípio da universalidade, o Judiciário ao deferir uma prestação de saúde que esteja prevista nas políticas públicas, não está criando (e com isso interferindo) em uma política pública, mas apenas assegurando seu cumprimento. Mas e quando o tratamento determinado não é previsto?

Se a prestação de saúde pleiteada não estiver prevista entre as políticas do SUS para tratamento daquela doença (pois eventualmente os tratamentos estão disponíveis para outras doenças, mas não para aquela de que padece o autor da ação), é imprescindível distinguir se a não prestação desse tratamento decorre de uma omissão legislativa ou administrativa, de uma decisão administrativa de não fornecê-la ou de uma vedação legal a sua dispensação, como é o caso, por exemplo, dos medicamentos utilizados de modo off label (grosso modo, utilizados para fins diferentes da previsão da bula e autorizada pela ANVISA).

Então, dentre os tratamentos não previstos nas políticas públicas, é possível vislumbrar as mais diferentes situações, a seguir descritas.

1.1.1. Medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado ao SUS para a patologia apresentada pelo autor da ação, embora previsto para outras patologias.

Considerando que os medicamentos de um modo geral possuem mais de uma indicação, para tratar de diferentes doenças, é bastante comum que um determinado remédio ou tratamento não esteja incorporado ao SUS para a patologia apresentada pelo autor da ação, embora esteja previsto para outra (s) patologia (s). Esse é, por exemplo, o caso envolvendo o Medicamento Rituximabe (nome comercial Mabthera, da Roche) que está previsto para ser fornecido pelo SUS para tratamento de linfoma não-hodgkin de células “b”, folicular, cd20 positivo, em 1ª e 2ª linha e para artrite reumatoide. Embora o SUS forneça este medicamento de alto custo para esses casos específicos, a medicação possui registro na ANVISA, e indicação em bula para tratar diversas outras patologias, tais como outras subespécies de linfoma não Hodgkin, leucemia mielóide crônica e granulomatose de Wegener.

Em suma aqui temos os casos em que o medicamento tem registro na ANVISA e indicação em bula para a finalidade perseguida, mas não é fornecido pelo SUS, para a doença apresentada pelo autor da ação, e tão-somente para outros casos.

Isso vai ocorrer porque a incorporação de novas tecnologias ao SUS depende de uma proposta de incorporação (que pode ser feita pelos próprios laboratórios ou por outros agentes) para tratamento de uma determinada doença, e do trâmite regular e resultado de um processo administrativo disciplinado em lei19, que vai analisar a relação custo-efetividade dessa inclusão para um sistema de saúde pública.

1.1.2. Medicamento registrado na ANVISA para o uso pretendido, mas não incorporado ao SUS.

O registro de um medicamento na ANVISA é requisito sine qua non para que um medicamento possa ser comercializado dentro do território nacional, o que não significa, em absoluto, que esse fato garanta a disponibilidade desse medicamento no sistema público de saúde. O registro na ANVISA pode ser um primeiro passo, mas propicia apenas que o produto possa ser adquirido legalmente dentro do Brasil.

A incorporação de um medicamento ao sistema público de saúde pode ser considerada uma segunda etapa, independente da primeira (registro na ANVISA) e que pode ou não acontecer, mas é o que viabiliza a disponibilização gratuita e universal aos pacientes que necessitarem. Trata-se de um processo administrativo rigoroso que se desenvolve com base em análises técnico-científicas a partir das melhores evidências disponíveis, acompanhadas por estudos de impacto financeiro para o sistema público de saúde. Esse processo hoje disciplinado pela Lei 8.080/90, com a redação dada pela Lei n.º 12.401/2011, é fundamental para a disponibilização de medicamentos eficazes, seguros e com uma relação custo-benefício adequada.

Desde a edição lei 12.401, o Ministério da Saúde incluiu, em um ano, 29 medicamentos e procedimentos no Sistema Único de Saúde (SUS), o que equivale ao dobro da média de incorporações feitas nos últimos seis anos antes da criação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec). A CONITEC já analisou quatro vezes mais tecnologias do que a média entre 2006 e 2011. Mais de 20% das tecnologias foram aprovados e observados os prazos foram colocados à disposição na rede pública20.

A relação custo-benefício é um pré-requisito fundamental utilizado não só no Brasil, mas na maioria dos sistemas de saúde semelhantes, uma vez que a prioridade é o interesse público de atender bem à coletividade. Acima de tudo, porém, está a questão da segurança, eficácia e qualidade dos tratamentos de saúde disponibilizados à população.

Note-se que no tipo de caso que estamos abordando neste item, assim como no caso abortado no item anterior, porque há registro na ANVISA, se o autor da ação tivesse condições, poderia tranquilamente comprar o medicamento de forma privada, em uma farmácia. A questão é que o medicamento, embora registrado e prescrito conforme a bula, não está disponível na rede pública de saúde, em condições de igualdade, para todos os pacientes em igual condição, porque não foi incorporado ao sistema ou, pelo menos, não para o caso do autor.

Assim, não raras vezes acontece de um paciente demandar em juízo medicamentos que, embora possuam registro na ANVISA para o uso pretendido, não foram incorporados ao SUS para nenhuma patologia. Isso não significa que o SUS não disponibilize nenhum tratamento para a doença que o autor apresenta. Até pelo princípio da integralidade da assistência, no SUS não se deve conceber uma doença sem tratamento. O fato de um determinado medicamento não estar incorporado ao sistema, e não estar disponível na rede pública, deve significar que o SUS optou por disponibilizar outro (s) tratamento (s), outra (s) alternativa (s) terapêutica (s).

Gilmar Ferreira Mendes21 refere-se às “questões delicadas” que geram a individualização da demanda, em relação aos casos em que o medicamento, pleiteado para tratamento de determinada doença, possui registro na ANVISA, mas não está incorporado ao SUS, e não existe outro tratamento disponível no sistema para aquele paciente. Nesse caso considerando que um dos significados do princípio da integralidade é o de que toda doença deve ter tratamento na rede pública, a exceção deve ser tratada como tal, gerando a necessidade de que a instrução da demanda deixe clara a situação que leva à necessidade de tratamento diferenciado.

Essas circunstâncias podem decorrer da mais variada gama de causas: o paciente pode ter alergia ao medicamento disponível na rede pública, pode padecer de alguma variação da doença para a qual o medicamento disponível não se aplique, pode já ter adquirido resistência à medicação disponível, pode mesmo ter, simplesmente, utilizado sem êxito a medicação disponível. Há casos também em que um medicamento novo apresenta resultados mais promissores ou com menos efeitos colaterais.

Atualmente, sem dúvida alguma, a demanda por medicamentos não incorporados ao sistema soma um volume de ações tão importante quanto as questões atinentes às falhas do sistema (ausência de leitos, demora nas filas de espera, etc.). São casos de judicialização tão frequentes que se tornaram um crescente problema para a saúde pública, além de uma contradição ao princípio constitucional de que o SUS deve prestar atendimento universal, igualitário e integral (a todos, indistintamente, e para todos os males).

A guarida às demandas por medicamentos e tratamentos não incorporados ao sistema geram despesas que forçam o Poder Público a realocar recursos não previstos para atender casos específicos, desorganizando o sistema e criando duas classes de usuários: a dos que obtém tratamentos diferenciados (e invariavelmente mais caros) na via judicial, e os demais.

1.1.3. Medicamentos com pretensão de uso “off label”

Uma terceira situação é a do chamado uso “off label” de uma medicação que possui registro na ANVISA, mas não para a finalidade prescrita e que o paciente/autor pretende.

Cada medicamento registrado no Brasil recebe aprovação para uma ou mais indicações, as quais passam a constar na sua bula, e que são as respaldadas pela Agência, pois foram comprovadas a qualidade, a eficácia e a segurança do medicamento. Quando o medicamento é empregado fora dessas situações descritas está caracterizado o uso off label do medicamento, ou seja, o uso ainda não aprovado, que não consta da bula.

Esse uso não é necessariamente errado, até porque novas funcionalidades para uma mesma droga são descobertas frequentemente, como foi o caso Viagra (substância Sildenafila), inicialmente sintetizado pela Pfizer para tratamento da hipertensão arterial pulmonar, descobriu-se, posteriormente, que também auxiliava no tratamento da disfunção eréctil masculina, funcionalidade que culminou por ser aprovada pela ANVISA.

Antes da aprovação e registro, a prescrição, todavia, é feita por conta e risco do médico que prescreve, e pode eventualmente vir a caracterizar um erro médico, embora em grande parte das vezes trate-se de uso essencialmente correto, apenas ainda não aprovado. De qualquer forma, é vedado o custeio desse tipo de tratamento pelo SUS (Lei 8.080/90 art. 19-T).22

1.1.4. Medicamentos não registrados na ANVISA, mas registrados em outras agências internacionais.

Existem, ainda, os medicamentos que não possuem registro na ANVISA, mas possuem registro em outra (s) agência (s) de regulação mundo a fora, como a americana Food and Drug Administration23 (FDA) ou a Agência Europeia de Medicamentos24 (European Medicines Agency – EMA). Esses medicamentos podem estar ou não incorporados aos sistemas de saúde pública de outros países, ou apenas possuir registro para a comercialização em outros países.

Um medicamento que está em evidência no momento, e que se encontra nesta situação, é a melatonina sintética. Essa substância amplamente utilizada na Europa e Estados Unidos ainda não está registrada no Brasil, até porque não foi postulado, por nenhuma indústria farmacêutica o registro na ANVISA25. Todavia, muitos brasileiros têm importado para uso próprio a substância que nada mais é do que um hormônio sintetizado, cuja produção natural pelo organismo está ligada ao ciclo de iluminação ambiental característico do dia e da noite (pico da produção). A melatonina é essencial no processo de sincronização circadiana do organismo, em particular, do sono e vigília e do metabolismo energético e tem seu uso estabelecido na clínica médica no tratamento de alguns distúrbios do sono, bem como no papel de importante agente antioxidante e coadjuvante terapêutico em doenças neurológicas e degenerativas (como doenças do espectro do autismo, síndrome de déficit de atenção e hiperatividade, etc.). A melatonina é vista como um poderoso cronobiótico (agente capaz de influir no ritmo biológico), podendo sincronizar muitas funções do organismo. Por isso tem, também, sido usada na correção dos distúrbios causados pelo "jet-lag". Em muitos casos, porém, a melatonina sintética está em fase de experimentação clínica: tratamento de certos tipos de enxaqueca, distúrbios depressivos, anestesia, como um coadjuvante no tratamento antitumoral e/ou antimetastático, como um poderoso agente limitador das lesões pós-isquêmicas (associadamente à hipotermia no caso da hipóxia e isquemia perinatais, na displasia broncopulmonar do prematuro, AVC), em doenças metabólicas, síndrome do ovário policístico, etc.26

O Ministério Público Federal em Canoas (MPF/RS) está questionando a ANVISA sobre a eventual proibição da melatonina no Brasil em um Inquérito Civil Público27 deflagrado por representação de interessado que pede a liberação do produto no país, justificando não haver motivos para a proibição do comércio e manipulação da substância. A resposta preliminar da ANVISA recebida pelo MPF informa que não ocorreu nenhum pedido de registro do princípio ativo para análise dos especialistas na vigilância sanitária.

A melatonina vem sendo postulada em juízo, tendo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro28, no início de 2015 publicado acórdão que analisa didaticamente a questão, ao referir que o fármaco melatonina não possui registro na ANVISA e, apesar de o autor possuir direito à saúde, e os entes federativos o dever de sua prestação (o que incluiria o fornecimento dos medicamentos necessários), o verbete n. 180. da Súmula do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro diz que: "A obrigação dos entes públicos de fornecer medicamentos não padronizados, desde que reconhecidos pela ANVISA e por recomendação médica, compreende se no dever de prestação unificada de saúde e não afronta o princípio da reserva do possível." Assim, muito embora o medicamento seja indicado para a doença que acomete o Autor, bem como receitado pelo médico assistente que lhe atende, não possuem os Réus o dever de prestá-lo.

1.1.5. Medicamentos experimentais.

Finalmente, temos os medicamentos ainda experimentais, e que além de não possuírem registro na ANVISA, não possuem registro em nenhuma das grandes agências reguladoras internacionais. São medicamentos ainda muito novos e carentes de comprovação de eficácia e segurança.

Pela legislação nacional, para que haja pesquisas científicas envolvendo seres humanos, é necessário o preenchimento de alguns requisitos dispostos na Resolução n° 196 de 10 de outubro de 1996 do Conselho Nacional de Saúde – CNS.

Na referida norma são adotadas as seguintes definições sobre os participantes:

  • Sujeito da pesquisa - é o(a) participante pesquisado (a), individual ou coletivamente, de caráter voluntário, vedada qualquer forma de remuneração.

  • Protocolo de Pesquisa - Documento contemplando a descrição da pesquisa em seus aspectos fundamentais, informações relativas ao sujeito da pesquisa, à qualificação dos pesquisadores e à todas as instâncias responsáveis.

  • Pesquisador responsável - Pessoa responsável pela coordenação e realização da pesquisa e pela integridade e bem integridade e bem integridade e bem estar dos sujeitos da pesquisa.

  • Instituição de pesquisa - organização, pública ou privada, legitimamente constituída e habilitada na qual são realizadas investigações científicas.

  • Promotor - indivíduo ou instituição responsável pela promoção da pesquisa.

  • Patrocinador - pessoa física ou jurídica que apoia financeiramente a pesquisa. Consentimento livre e esclarecido - anuência do sujeito da pesquisa e/ou de seu representante legal, livre de vícios (simulação, fraude ou erro), dependência, subordinação ou intimidação, após explicação completa e pormenorizada sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos, potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, formulada em um termo de consentimento, formulada em um termo de consentimento, autorizando sua participação voluntária na pesquisa autorizando sua participação voluntária na pesquisa29

A pesquisa sobre um medicamento é um negócio jurídico que impõe ao patrocinador da pesquisa (laboratório farmacêutico, na maioria dos casos) a obrigação de, ao final do teste clínico, manter o fornecimento do tratamento clínico integral ao sujeito da pesquisa (inclusive as drogas utilizadas no experimento), até o final do tratamento, sob pena de estar excedendo os limites da boa-fé, eis que não é concebível a utilização do ser humano como mero objeto de pesquisa.

O medicamento em fase de pesquisa é um medicamento experimental e não pode ser comercializado, mas tão-somente testado para fins científicos, de acordo com a legislação de regência.

Na STA 175, assim se pronunciou o Ministro Gilmar Ferreira Mendes:

Os tratamentos experimentais (sem comprovação científica de sua eficácia) são realizados por laboratórios ou centros médicos de ponta, consubstanciando-se em pesquisas clínicas. A participação nesses tratamentos rege-se pelas normas que regulam a pesquisa médica e, portanto, o Estado não pode ser condenado a fornecê-los.

Como esclarecido pelo Médico Paulo Hoff na Audiência Pública realizada, Diretor Clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, essas drogas não podem ser compradas em nenhum país, porque nunca foram aprovadas ou avaliadas, e o acesso a elas deve ser disponibilizado apenas no âmbito de estudos clínicos ou programas de acesso expandido, não sendo possível obrigar o SUS a custeá-las. No entanto, é preciso que o laboratório que realiza a pesquisa continue a fornecer o tratamento aos pacientes que participaram do estudo clínico, mesmo após seu término.

A posição do STF foi clara ao fazer distinção entre os medicamentos novos e os medicamentos ainda experimentais, referindo que estes, por não terem segurança e eficácia comprovadas, não poderiam ter seu fornecimento imposto ao Estado (e também não aos planos de saúde privados), inclusive em razão do risco potencial à saúde do próprio requerente e titular do direito à saúde. Diariamente, porém, são ajuizadas ações na Justiça pedindo que o SUS forneça, tanto medicamentos novos, quanto os experimentais, e liminares são frequentemente deferidas em afronta ao art. 19-T da Lei 8.080/90, como é o caso das substâncias Canabidiol e Fosfoetanolamina

Mariana Filchtiner Figueiredo30, trazendo a experiência do direito comparado, faz importante menção a decisões do Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH) sobre o uso compassivo de medicamentos experimentais. A autora analisa dois casos recentes: Hristozov and others v. Bulgaria (applications nº 47039/11 and 358/12) o qual tinha por objetivo declarar que o Tribunal Búlgaro violara o art. 8º da Convenção Europeia de Direitos Humanos31 (CEDH) ao não permitir a utilização compassiva do medicamento de combate ao câncer MBVax Coley Fluid, desenvolvido por um laboratório canadense e ainda sem registro; e Durisotto v. Italy (application nº 62804/13) onde era alegada a violação dos artigos 2º32 e 8º da mesma convenção, pela negativa de autorização judicial para uso experimental de terapia com células tronco. Em ambos os casos, da Bulgária e da Itália, as decisões judiciais guerreadas haviam negado os pleitos de uso experimental baseados em legislação interna, voltada à proteção da saúde pública, tendo o Tribunal Europeu de Direitos Humanos confirmado as decisões, afirmando que não incumbiria ao juiz internacional se substituir às autoridades nacionais competentes para determinar o nível de risco aceitável pelos pacientes que desejem aceder aos cuidados compassivos no quadro de uma terapia experimental, e que não se estava diante de casos de pura e simples negativa de assistência à saúde.

1.2. O registro na ANVISA como requisito para a comercialização de medicamentos no Brasil, situação que precede e condiciona a análise para incorporação de um tratamento ao SUS.

A STA 175 destaca:

Como ficou claro nos depoimentos prestados na Audiência Pública, é vedado à Administração Pública fornecer fármaco que não possua registro na ANVISA.

A Lei Federal nº 6.360/76, ao dispor sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, determina em seu artigo 12 que “nenhum dos produtos de que trata esta Lei, inclusive os importados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde”. O artigo 16 da referida Lei estabelece os requisitos para a obtenção do registro, entre eles, que o produto seja reconhecido como seguro e eficaz para o uso a que se propõe. O Art. 18. ainda determina que, em se tratando de medicamento de procedência estrangeira, deverá ser comprovada a existência de registro válido no país de origem.

O registro de medicamento, como lembrado pelo Procurador-Geral da República, é uma garantia à saúde pública. E, como ressaltou o Diretor-Presidente da ANVISA, a agência, por força da lei de sua criação, também realiza a regulação econômica dos fármacos. Após verificar a eficácia, segurança e qualidade do produto e conceder o registro, a ANVISA passa a analisar a fixação do preço definido, levando em consideração o benefício clínico e o custo do tratamento. Havendo produto assemelhado, se o novo medicamento não trouxer benefício adicional, não poderá custar mais caro do que o medicamento já existente com a mesma indicação.

Por tudo isso, o registro na ANVISA mostra-se como condição necessária para atestar a segurança e o benefício do produto, sendo a primeira condição para que o Sistema Único de Saúde possa considerar sua incorporação.

Claro que essa não é uma regra absoluta. Em casos excepcionais, a importação de medicamento não registrado poderá ser autorizada pela ANVISA. A Lei nº 9.782/99, que criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), permite que a Agência dispense de “registro” medicamentos adquiridos por intermédio de organismos multilaterais internacionais, para uso de programas em saúde pública pelo Ministério da Saúde.

A decisão da STA 175 é de setembro de 2009 e já alçava o registro na ANVISA como condição de partida para a possível inclusão de um medicamento no rol dos fornecidos pelo SUS. Anos depois, o artigo 19-T da Lei 8.080/90 (que foi incluído pela Lei nº 12.401, de 2011) deixa claro que é vedado à Administração Pública fornecer fármaco que não possua registro na ANVISA:

Art. 19-T. São vedados, em todas as esferas de gestão do SUS:

I - o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento, produto e procedimento clínico ou cirúrgico experimental, ou de uso não autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA;

II - a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na Anvisa.”

A norma do art. 19-T até hoje não teve inconstitucionalidade declarada pelo STF, então presume-se constitucional e não pode deixar de ser aplicada sob pena de infração à Súmula Vinculante nº 10 do STF:

"Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta a sua incidência no todo ou em parte."

Em sendo assim, toda a decisão que determina ao Poder Público o custeio de medicamento sem registro na ANVISA é ilegal, e se essa norma não for expressamente declarada inconstitucional, em procedimento que observe a cláusula de reserva de plenário, não há justificativa para a lei não ser respeitada.

Os três últimos casos mencionados no tópico anterior (itens “c”, “d” e “e”), ou seja, medicamentos com pretensão de uso off label, medicamentos sem registro na ANVISA, e medicamentos em fase experimental, tem as mesmas consequências no ordenamento jurídico nacional: o impedimento legal33 para a sua comercialização no país, salvo exceções expressas na legislação, bem como o expresso impedimento para o seu fornecimento pelo SUS.

Em síntese apertada, o registro de um medicamento na ANVISA tem por objetivo: 1. Analisar sua segurança; 2. Analisar sua eficácia; 3. Analisar sua qualidade; 4. Analisar e monitorar o seu preço34.

Para que haja registro de medicamentos no Estado brasileiro, com a respectiva autorização para comercialização e circulação do produto em território nacional, o laboratório farmacêutico deverá instar a ANVISA para tal fim, comprovando, minimamente, que o medicamento é: seguro, eficaz e de qualidade, bem como deverá apresentar informações a respeito do preço que pretende praticar, a fim de que a ANVISA possa realizar análise prévia acerca do preço que será fixado para o produto, bem como monitorar a evolução dos preços dos medicamentos, coibindo eventuais abusos.

O processo de aprovação e registro de fármacos pela Anvisa é de fundamental importância para a garantia do próprio sistema de saúde no Brasil, a exemplo do que ocorre nas demais grandes agências internacionais, como a FDA americana e a EMA europeia. Dentre as competências da ANVISA, está a de conceder registros de medicamentos e produtos, segundo as normas de sua área de atuação, procedendo-se à análise a respeito de sua segurança e eficácia, concluindo se o uso do medicamento traz mais benefícios que malefícios para a saúde do paciente (segurança), assim como se o medicamento utilizado traz efetivamente combate à doença a que se propõe tratar (eficácia).35

Claro está que se o medicamento já possui registro em outras agências internacionais, boa parte desse caminho já foi trilhado no estrangeiro, e essa experiência servirá de norte para a ANVISA, donde, à contrario sensu, a ausência total de registro em outras partes do mundo, é situação ainda mais “grave” em termos de permitir a comercialização de um medicamento no território nacional.

Cabe mencionar aqui os recentes e polêmicos casos relacionados às substâncias Canabidiol e Fosfoetanolamina, ambas sob intensos e recentes holofotes da mídia brasileira, por se apresentarem como medicamentos revolucionários.


2.CASOS

2.1. O caso do Canabidiol.

O Canabidiol (CBD) - composto derivado da Cannabis Sativa, popularmente conhecida como maconha – não possui registro na ANVISA, e até recentemente estava incluído no rol das substâncias de uso proscrito no Brasil, nas listas E e F2, que elencam plantas que podem gerar substâncias entorpecentes e psicotrópicas, e as próprias substâncias entorpecentes e psicotrópicas. Essa inclusão não era nominal, mas por ser o CBD um derivado da Cannabis (planta) e considerado isômero ao Tetraidrocanabinol (THC – substância psicotrópica). Em janeiro de 2015 a Anvisa decidiu, pela retirada do Canabidiol da lista de substâncias proibidas no Brasil reclassificando-o como substância controlada e enquadrada na lista C1 da Portaria 344/98, que regula define os controles e proibições de substâncias no país.

Nessa altura dos acontecimentos, o uso medicinal ou terapêutico do canabidiol já era considerado lícito em diversos países, dentre os quais: Israel, Itália, Holanda, Portugal, Noruega, Polônia, Suécia, Dinamarca, Suíça, Austrália, Áustria, Reino Unido, Canadá, República Checa, Finlândia, Alemanha, Nova Zelândia e Espanha.36

Ocorre que o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo – CREMESP, em de 07 de outubro de 2014 publicou a Resolução CREMESP Nº 268 autorizando o uso do Canabidiol nas epilepsias mioclônicas graves do lactente e da infância, refratárias a tratamentos convencionais já registrados na ANVISA e, posteriormente, em dezembro de 2014 o Conselho Federal de Medicina havia autorizado a prescrição do Canabidiol a pacientes portadores de epilepsia ou que sofressem de convulsões, sem apresentar melhora no quadro clínico após passar por tratamentos convencionais. Mas apesar de os médicos passarem a poder receitar o canabidiol, a substância continuava classificada pela Anvisa como “de uso proscrito”. Em 14/01/2015, após referências científicas indicarem que o CBD não possuía efeito psicoativo semelhante aos efeitos do THC/Cannabis37, a ANVISA deliberou por alterar a classificação do Canabidiol, passando a permitir que a substância seja importada mediante a expedição, caso a caso, de autorização especial concedida pelo diretor da agência, precedida da apresentação de prescrição médica e de uma série de documentos.

O posicionamento da ANVISA em relação ao Canabidiol foi se alterando ao longo do tempo, ora estendendo as possibilidades de prescrição, ora restringindo. Até agosto de 2015, a Anvisa havia autorizado 894 dos 1.036 pedidos para importar canabidiol, mas muitas das autorizações foram para pacientes com problemas como dores crônicas e mal de Parkinson, que obtiveram receitas médicas para usar o medicamento. Atualmente a ANVISA está aceitando o uso compassivo (tratamento ainda não totalmente avaliado, destinado a pacientes que não têm outras opções) do canabidiol para crianças e adolescentes com epilepsia refratária a tratamentos convencionais38.

O uso compassivo de um medicamento é um meio de tornar disponíveis aos pacientes, com uma necessidade médica não atendida, um medicamento promissor, porém ainda não registrado, ou mesmo em fase experimental, quando as chances de êxito com medicamentos convencionais estão esgotadas.39 Essa utilização não interfere no procedimento de avaliação para registro de um determinado produto medicinal, apenas admite que doentes terminais ou desenganados, que já utilizaram tudo o que estava regularmente disponível, tenham chance de tentar a utilização da substância ainda em fase de estudos e sem registro, ainda que não façam formalmente parte de uma pesquisa.

Assim, o fato de a ANVISA admitir a importação excepcional do canabidiol não significa que essa substância tenha obtido registro para comercialização no Brasil. Muito menos significa que esse medicamento tenha sido, ou esteja apto a ser incorporado ao SUS, eis que o art. 19-T da Lei 8.080/90 permanece como impeditivo do custeio de medicamentos experimentais e sem registro na ANVISA. Até por isso a importação do Canabidiol depende sempre de autorização especial, concedida após um processo administrativo, ainda que bastante célere.

2.2. O caso da Fosfoetanolamina sintética “a pílula contra câncer”.

A fosfoetanolamina sintética, substância que foi estudada de forma independente pelo Prof. Dr. Gilberto Orivaldo Chierice, outrora ligado ao Grupo de Química Analítica e Tecnologia de Polímeros da Universidade de São Paulo (já aposentado), recentemente ficou conhecida como a “pílula do câncer”. Esses estudos independentes envolveram a metodologia de síntese da substância e contaram com a participação de outras pessoas, inclusive sem vínculo com a Universidade de São Paulo e acabaram por ser utilizados para fins medicamentosos, por conta e risco do docente em questão. Como alguns pacientes relataram melhora e a notícia se espalhou como um rastilho de pólvora. Apesar de a Universidade de São Paulo não possuir acesso aos elementos técnico-científicos necessários para a produção da substância, cujo conhecimento é restrito ao docente aposentado e à sua equipe, além de protegido por patentes (PI 0800463-3 e PI 0800460-9) ocorreu que a Universidade passou a ser sistematicamente demandada, inclusive judicialmente, para o fornecimento da substância a doentes dos mais diversos tipos de câncer, como se configurasse um tratamento revolucionário e comprovado para a cura da doença.40 A Universidade foi obrigada a se manter produzindo o medicamento, mesmo sem condições para isso, de forma que passou a tentar cassar na justiça de São Paulo as decisões que a obrigavam ao fornecimento.

A USP argumenta que não desenvolveu estudos sobre reação dessa substância em seres vivos, muito menos estudos clínicos controlados em humanos, de forma que a fosfoetanolamina sintética não pode ser sequer classificada como medicamento, tanto que não tem bula e a dosagem está sendo administrada conforme os técnicos que produzem a substância entendem.

Provocada pela USP, a presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu as decisões de antecipação de tutela para o fornecimento da fosfoetanolamina sintética, com o que advogados e familiares de pacientes com câncer buscaram a reversão da decisão no STF.

Em 6 de outubro de 2015, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), na Petição (PET) 5828 concedeu medida liminar suspendendo decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que impedia uma paciente de ter acesso à substância contra o câncer fornecida pela Universidade de São Paulo (Campus de São Carlos). A manifestação do STF incendiou a discussão sobre o assunto e a situação foi amplamente divulgada na mídia, levando o Ministério da Saúde a publicar na sexta-feira, dia 30 de outubro de 2015, a Portaria n.º 1.767 de 29 de outubro de 201541, instituindo um grupo de trabalho para apoiar os estudos clínicos necessários ao desenvolvimento clínico da fosfoetanolamina.

Segundo o Ministro Fachin, o fundamento da suspensão da tutela guerreada seria “apenas” a falta de registro na ANVISA da substância requerida, e que, por o tema pender de análise sob o sistema de repercussão geral (RE 657.718-RG, Relator Ministro Marco Aurélio, Dje 12.03.2012 - tema 500), isto emprestaria plausibilidade à tese suscitada pela recorrente, recomendando a concessão da medida cautelar, para suspender decisão proferida pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.42

A decisão do STF contradiz o que o próprio Conselho Nacional de Justiça, órgão de cúpula do Poder Judiciário, considerou ao emitir a Recomendação n.º 31/2010, visando melhor subsidiar os operadores do direito, para assegurar maior eficiência na solução das demandas judiciais envolvendo a saúde. Na Recomendação 31/2010, no item “b.2”, ficou consignada a orientação aos magistrados para evitar a autorização de fornecimentos ainda não registrados na ANVISA, ou em fase experimental, ressalvadas as exceções expressamente previstas em lei.

O pensamento do Ministro Fachin parece não se coadunar também com a linha seguida pelo Ministro Barroso43, que parece criticar as “decisões extravagantes ou emocionais que condenam a Administração ao custeio de tratamentos não razoáveis:

O sistema, no entanto, começa a apresentar sintomas graves de que pode morrer da cura, vítima do excesso de ambição, da falta de critérios e de voluntarismos diversos. Por um lado, proliferam decisões extravagantes ou emocionais, que condenam a Administração ao custeio de tratamentos irrazoáveis – seja porque inacessíveis, seja porque destituídos de essencialidade –, bem como de medicamentos experimentais ou de eficácia duvidosa, associados a terapias alternativas.

(...)

Tais excessos e inconsistências não são apenas problemáticos em si. Eles põem em risco a própria continuidade das políticas de saúde pública, desorganizando a atividade administrativa e impedindo a alocação racional dos escassos recursos públicos. No limite, o casuísmo da jurisprudência brasileira pode impedir que políticas coletivas, dirigidas à promoção da saúde pública, sejam devidamente implementadas. Trata-se de hipótese típica em que o excesso de judicialização das decisões políticas pode levar à não realização prática da Constituição Federal. Em muitos casos, o que se revela é a concessão de privilégios a alguns jurisdicionados em detrimento da generalidade da cidadania, que continua dependente das políticas universalistas implementadas pelo Poder Executivo.

Ingo Sarlet se manifestou sobre a decisão do Ministro Luiz Edson Fachin em coluna no site Consultor Jurídico44, afirmando que não é possível desconsiderar o fato de que o critério da excepcionalidade da situação, tal como defendido pelo prolator da decisão, não afasta a correção da justificativa adotada para afastar a possibilidade de via judicial impor ao Estado ou mesmo aos planos de saúde o fornecimento de medicamentos em fase experimental, pelos riscos para a própria saúde do autor da demanda ou mesmo em virtude da ainda não comprovada eficácia do medicamento, ademais de seu custo em relação a medicamentos devidamente aprovados e reconhecidos pela comunidade médica e pelas autoridades sanitárias nacionais. Ainda segundo o renomado autor, mesmo a aquisição particular, por conta e risco do paciente, de um medicamento que sequer foi testado em humanos, já seria questionável, quanto mais impor ao Poder Público e aos planos de saúde o ônus de custear esse tratamento que não pode ser tido como exigência da dignidade da pessoa humana e do direito à vida (quanto mais em face da ausência de comprovação de eficácia).

Em início de novembro de 2015, o Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP) chegou a autuar o laboratório da Universidade de São Paulo (USP), no campus de São Carlos (SP), pela ausência de farmacêuticos no local onde é produzida a fosfoetanolamina sintética, registrando as precárias condições sanitárias e ausência de controle na produção45.

Em 11/11/2015 o site Consultor Jurídico veiculou notícia de que o TJ-SP no Agravo Regimental 2194962-67.2015.8.26.0000/50080, cassou todas as liminares de primeira instância que mandavam USP fornecer "cápsula contra câncer" ao argumento de que seria irresponsável liberar substância química que promete cura de uma doença sem o mínimo rigor científico e ainda com duvidosa eficácia. Os desembargadores também proibiram que juízes do estado tomem decisões futuras com o mesmo tema46.

Apesar de toda a polêmica criada, e de a decisão do STF já ter se repetido em outro caso, a recomendação do Ministério da Saúde segue sendo de que as pessoas não façam uso da Fosfoetanolamina até que os estudos sejam concluídos47, sendo que o Ministério da Ciência anuncia um investimento de dez milhões de reais na pesquisa desta substância para os próximos dois anos. A ideia é que os estudos sejam conduzidos por laboratórios que têm parcerias firmadas com o ministério, o Instituto Butantã e os institutos ligados ao Ministério da Saúde48.


3. INCORPORAÇÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS EM SAÚDE.

3.1. O processo de Avaliação de Tecnologias em Saúde e a sua incorporação ao SUS.

Os avanços tecnológicos na área da medicina trazem constantes novidades para o tratamento das mais diversas doenças, ou a melhoria da qualidade de vida dos pacientes. A ANVISA, atendendo a pleitos de registro de medicamentos feitos pelos laboratórios farmacêuticos está sempre analisando, avaliando e permitindo a comercialização de novos medicamentos, que nem sempre são totalmente inovadores ou superiores aos que já existem no mercado. Todavia, como já foi reiteradas vezes dito, o registro de um medicamento e a permissão de comercialização no país não significam que esse medicamento está incorporado para dispensação pelo SUS. ANVISA e CONITEC são instâncias complementares de regulação. Perante a ANVISA é feita a proposta de registro do medicamento no país, analisadas as evidências científicas, definida a bula do medicamento e regulamentado o preço no mercado interno. Em termos de saúde pública, contudo, a inclusão das novas tecnologias deve ser apreciada sob diversos outros prismas, incluindo a relação custo-benefício desses avanços, de modo a harmonizar as “novidades” com os princípios constitucionais e legais do SUS.

Maria Inês Pordeus Gadelha49 em seu artigo “Escolhas Públicas e Protocolos Clínicos – O Orçamento, as Renúncias Necessárias e os Novos Projetos De Leis” alerta que, ao se fazer da medicina um bem de mercado e da saúde um bem de consumo, perde-se o norte moral que deve reger as ações e interações humanas. A autora aponta questionamentos que resumem o espírito do processo de incorporação:

Quatro questões se fazem essenciais para a incorporação de uma nova tecnologia: funciona? (eficácia); o quão bem funciona? (efetividade); a que custo? (eficiência); e para quantos (equidade). Desafortunadamente, são questões cujas respostas são pouco valorizadas no âmbito da Justiça, o que concorre para que decisões judciais ganhem um caráter de injustiça e iniquidade.

Na STA 175 o Ministro Gilmar Ferreira Mendes faz reflexão sobre o tema do registro de medicamentos e a sua incorporação ao SUS:

“Após verificar a eficácia, a segurança e a qualidade do produto e conceder-lhe o registro, a ANVISA passa a analisar a fixação do preço definido, levando em consideração o benefício clínico e o custo do tratamento.

Havendo produto assemelhado, se o novo medicamento não trouxer benefício adicional, não poderá custar mais caro do que o medicamento já existente com a mesma indicação.

Por tudo isso, o registro na ANVISA configura-se como condição necessária para atestar a segurança e o benefício do produto, sendo o primeiro requisito para que o Sistema Único de Saúde possa considerar sua incorporação”. Grifamos.

O segundo dado a ser verificado pelo juízo então seria o da “existência de motivação para o não fornecimento de determinada ação de saúde pelo SUS”.

O STF avaliou que o “Sistema Único de Saúde se filiou à corrente da Medicina com base em evidências”, com a conclusão de que a política pública deverá privilegiar o tratamento do SUS “sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente”. Senão, vejamos o trecho correspondente do voto condutor:

“Isso porque o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da ‘Medicina com base em evidências’. Com isso, adotaram-se os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, que consistem num conjunto de critérios que permitem determinar o diagnóstico de doenças e o tratamento correspondente com os medicamentos disponíveis e as respectivas doses. Assim, um medicamento ou tratamento em desconformidade com o Protocolo deve ser visto com cautela, pois tende a contrariar um consenso científico vigente.

Ademais, não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário às ações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante a elaboração de políticas públicas que repartam os recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível.

Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendimento médico da parcela da população mais necessitada. Dessa forma, podemos concluir que, em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente”.

Sublinhamos.

Diante do evidente prestígio do STF à política pública estabelecida, pode-se afirmar que se uma tecnologia foi avaliada e a conclusão do processo administrativo foi pela sua não incorporação ao SUS, existe uma motivação para o seu não fornecimento aos pacientes que demandam por esse medicamento e/ou tecnologia. Diante do rigor científico, agilidade e transparência no processo de avaliação das propostas de incorporação de novas tecnologias, o processo decisório é mais célere e confiável, tendo como objetivo a melhor alocação de recursos disponíveis.

Para esclarecer e ordenar o processo de incorporação de novas tecnologias foi criada, com a Lei nº 12.401, de 28 de abril de 2011, a CONITEC: Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS. Essa lei veio alterar a Lei 8.080/90 e dispor sobre a assistência terapêutica e a incorporação de tecnologia em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Indigitado diploma legal refere em seu artigo 19-Q

(...)

“Art. 19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.

§ 1o A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, cuja composição e regimento são definidos em regulamento, contará com a participação de 1 (um) representante indicado pelo Conselho Nacional de Saúde e de 1 (um) representante, especialista na área, indicado pelo Conselho Federal de Medicina.

§ 2o O relatório da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS levará em consideração, necessariamente:

I - as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança do medicamento, produto ou procedimento objeto do processo, acatadas pelo órgão competente para o registro ou a autorização de uso;

II - a avaliação econômica comparativa dos benefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas, inclusive no que se refere aos atendimentos domiciliar, ambulatorial ou hospitalar, quando cabível.”

Esse órgão colegiado de caráter permanente que é a CONITEC, teve sua criação disciplinada pelo Decreto 7.646 de 21/12/2011, que também regulamentou o processo administrativo de incorporação, exclusão e alteração de tecnologias do SUS. Já o Regimento Interno da CONITEC ficou por conta da Portaria MS 2009 de 13/09/2012.

A avaliação das novas tecnologias em saúde trabalha com a Medicina Baseada em Evidências50 (MBE), um movimento médico iniciado pelo Professor escocês Archibald Leman Cochrane (1909-1988), que revolucionou a medicina ao defender o uso do método científico para investigar a eficiência e eficácia dos tratamentos para as doenças, na importante obra “Effectiveness and Efficiency: Random Reflections on Health Services (1972)” ou, em tradução livre, Eficácia e Eficiência: Reflexões Randômicas sobre Serviços de Saúde.

A MBE foi introduzida no Brasil pelo Prof. Dr. Álvaro Nagib Atallah fundador do Centro Cochrane do Brasil, um dos 14 centros da Colaboração Cochrane ao redor do mundo. O Centro Cochrane do Brasil é a principal organização não governamental e sem fins lucrativos a promover o ensino, pesquisa e extensão em MBE, prática baseada em evidências e saúde baseada em evidências do Brasil51. O seu objetivo é contribuir para o aprimoramento da tomada de decisões em Saúde, com base nas melhores informações disponíveis. O Centro Cochrane do Brasil é parceiro do Ministério da Saúde, está ligado à Escola Paulista de Medicina da USP e tem produção científica comparável às instituições similares dos países europeus, tendo propiciado ao Brasil cerca de duas centenas de publicações internacionais.

A Medicina Baseada em Evidências adota técnicas científicas tais como: meta-revisões da literatura existente (também conhecidas como meta-análises), análise de risco-benefício, experimentos clínicos aleatorizados e controlados, estudos naturalísticos populacionais, dentre outros, objetivando o "uso consciencioso, explícito e judicioso da melhor evidência atual" quando fazem decisões em seu trabalho de cuidado individual dos pacientes.

É com base nesse criterioso método científico que a CONITEC analisa a eficiência e eficácia das tecnologias em saúde que o SUS irá disponibilizar, visando o uso racional dos recursos para alcançar à população as mais seguras e comprovadamente eficientes práticas clínicas. Trata-se, portanto, de um processo administrativo vinculado e bastante característico.

Saliente-se que pessoas físicas e jurídicas, vinculadas ou não ao SUS podem propor análise de incorporação de uma nova tecnologia, devendo ser encaminhado o pedido à CONITEC, juntamente com a documentação legalmente exigida, que inclui estudos científicos referenciados sobre o que está sendo proposto. Esses estudos serão analisados e, se for necessário, a CONITEC solicita estudos complementares. Posteriormente, o plenário da comissão analisa o relatório, vota, faz recomendações e um parecer conclusivo que será submetido à consulta pública52, que é um mecanismo de publicidade e transparência utilizado pela Administração Pública para obter informações, opiniões e críticas da sociedade a respeito de determinado tema, permitindo a ampla participação da sociedade no processo de tomada de decisão para a inclusão de medicamentos e outras tecnologias ao SUS.

Após a consulta pública, as contribuições são organizadas e inseridas nos relatórios técnicos para análise dos membros do plenário da CONITEC, que emitirão uma recomendação final sobre o medicamento/tecnologia avaliado. Esse relatório técnico com a recomendação da CONITEC é, então, encaminhado ao Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde (SCTIE), que decide se o medicamento/tecnologia será incorporado ao SUS, decisão que será publicada no Diário Oficial da União.

3.2. A especificidade do tratamento do câncer pelo SUS e o caso do medicamento Trastuzumabe.

O que comumente se conhece simplesmente por “Câncer”, na verdade é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado (maligno) de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se (metástase) para outras regiões do corpo. Essas células se dividem rapidamente e tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, determinando a formação de tumores (acúmulo de células cancerosas) ou neoplasias malignas.

Os diferentes tipos de câncer correspondem aos vários tipos de células do corpo. Por exemplo, existem diversos tipos de câncer de pele porque a pele é formada de mais de um tipo de célula. Se o câncer tem início em tecidos epiteliais como pele ou mucosas ele é denominado carcinoma. Se começa em tecidos conjuntivos como osso, músculo ou cartilagem é chamado de sarcoma.

Outras características que diferenciam os diversos tipos de câncer entre si são a velocidade de multiplicação das células e a capacidade de invadir tecidos e órgãos vizinhos ou distantes (metástases).53

O tratamento do câncer segue a lógica da doença, sendo que cada tipo de câncer vai ter um protocolo específico, no mais das vezes multiprofissional e multidisciplinar. Isso demanda a disponibilidade de estruturas hospitalares (de internação e ambulatorial) com serviços gerais e especializados. Normalmente o doente é tratado com mais de uma modalidade terapêutica (cirurgia, radioterapia e/ou quimioterapia).

A Portaria GM/MS nº 2.439, de 08/12/2005 instituiu a atual Política Nacional de Atenção Oncológica, que se encontra em permanente revisão, razão pela qual a atualização dos procedimentos de cirurgia oncológica, a expansão da radioterapia e a implantação de um novo modelo de assistência farmacêutica em oncologia conjugam-se com a organização de redes para a melhoria do acesso à prevenção, ao diagnóstico e ao cuidado integral e dos sistemas de informação e vigilância em saúde, educação e pesquisa, buscando que a atenção e os serviços especializados se integrem verdadeiramente em uma linha de cuidados devidamente regulados, denotando que somente a mobilidade do poder regulamentar do executivo tem condições de disciplinar com o dinamismo necessário as normas complementares à lei e necessárias a sua fiel execução.

O atendimento oncológico no SUS fica a cargo de entidades que podem ser CACON’s ou UNACON’s, definidos na Portaria 741/2005 54 da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde. Os Centros de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) são unidades hospitalares que possuem condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência especializada de Alta Complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento de todos os tipos de câncer. Estes hospitais devem, obrigatoriamente, contar com assistência radioterápica em sua estrutura física.

O CACON designado para exercer o papel auxiliar, de caráter técnico, ao gestor do SUS nas políticas de atenção oncológica, chama-se Centro de Referência de Alta Complexidade em Oncologia, e deve ser um Hospital de Ensino, certificado pelo Ministério da Saúde e Ministério da Educação, com uma base territorial de atuação pré-definida, uma estrutura de ensino organizada, programas e protocolos estabelecidos, estrutura gerencial capaz de zelar pela eficiência, eficácia e efetividade das ações prestadas, entre outros requisitos.

Mais simples, as Unidades de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia, ou UNACON, são hospitais com condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência especializada de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento dos cânceres mais prevalentes. Estas unidades hospitalares podem ter em sua estrutura física a assistência radioterápica ou então, referenciar formalmente os pacientes que necessitarem desta modalidade terapêutica.

Os CACON/UNACON são pessoas jurídicas credenciadas e habilitadas para prestar atendimento gratuito e universal à população pelo SUS. Essas entidades são credenciadas pela Secretaria de Saúde responsável pela rede de saúde local (estado ou município) conforme as necessidades identificadas na região. Os hospitais habilitados como UNACON ou CACON são indicados, na Comissão Intergestores Bipartite – CIB, pelos respectivos gestores municipais e estadual, que encaminham a indicação do credenciamento (ou descredenciamento) para o gestor federal avaliar e proceder à sua habilitação (ou desabilitação). A habilitação, ato do gestor federal, depende apenas da averiguação do cumprimento dos requisitos estabelecidos na Portaria, por meio de documentos enviados pelo gestor local ao gestor federal55.

O SUS financia o tratamento completo e especializado do câncer como um todo, ou seja: tratamento cirúrgico, radioterapia, quimioterapia, iodoterapia e transplantes, sendo que a remuneração dos estabelecimentos que prestam esses serviços é feita por Autorização de Internação Hospitalar (dita AIH) em relação aos tratamentos cirúrgico, os transplantes e a iodoterapia e; Autorização de Procedimento de Alta Complexidade (dita APAC) para radioterapia e quimioterapia.

Os estabelecimentos de saúde credenciados no SUS registram, respectivamente a suas habilitações, os tratamentos em AIH (hospital) e APAC (hospital e serviço isolado de radioterapia), conforme procedimentos tabelados. A valoração dos procedimentos é única para todos os estabelecimentos de saúde credenciados no SUS.

Os medicamentos para tratamento do câncer − inclusive a quimioterapia de uso via oral – fazem parte do tratamento e são de escolha do CACON/UNACON onde o paciente é tratado, devendo ser por eles ser fornecidos. O paciente realiza a totalidade do tratamento no CACON ou UNACON em que estiver vinculado, e é lá que receberá a medicação, até porque a administração e acondicionamento de tais fármacos requer conhecimentos especializados para manter a esterilidade do produto e a segurança dos trabalhadores responsáveis pela manipulação. Existem recomendações científicas relativas ao manuseio de quimioterápicos antineoplásicos, sendo que o Instituto Nacional do Câncer (INCA) possui um manual de normas técnicas e administrativas para a manipulação segura de tais produtos.

Pela especificidade do tratamento do câncer, não existe no SUS a possibilidade de fornecimento de um medicamento pura e simplesmente, como acontece com outras doenças. O medicamento antineoplásico faz parte do “pacote” do tratamento do câncer, que é coberto pela APAC, e não pelos Componentes da Assistência Farmacêutica do SUS como, por exemplo, o Componente Básico ou o Componente Especializado (antigos “medicamentos excepcionais‟).56

Por outro lado, no caso do câncer não há uma tabela de procedimentos que refira medicamentos específicos que devam ser utilizados em cada caso. As situações tumorais específicas, que orientam a codificação para ressarcimento dos CACON/UNACON são descritas independentemente de qual esquema terapêutico e medicamento for utilizado. A codificação e a remuneração dos procedimentos, por sua vez, se baseia em esquemas quimioterápicos indicados nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), ou Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT), que funcionam como “manuais” e trazem informações detalhadas sobre como se proceder quanto ao diagnóstico, tratamento, controle e acompanhamento dos pacientes que são constantemente revisados57.

Os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), são utilizados quando há possibilidade de se estabelecer critérios, parâmetros e padrões. Se isso não é possível, diante da existência de muitas opções de tratamento, adotam-se Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT) para orientar o que é válido e não válido técnico-cientificamente e, com isso, orientar condutas e protocolos institucionais. 58

A partir da criação e implantação da CONITEC, em 2012, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS passou a ter vital importância no processo de elaboração dos PCDT e DDT. Os textos dos protocolos e diretrizes são criados por especialistas nas áreas específicas da oncologia, com a assessoria direta de internistas com experiência em Medicina Baseada em Evidências, cirurgiões, radioterapeutas, oncologistas clínicos e uma equipe de farmacêuticos, todos externos ao Ministério da Saúde.59 Esse grupo de trabalho multissetorial e multiprofissional, em que ficam sempre claramente expressas as declarações de ausência de conflitos de interesse de todos os atores, é uma das principais estratégias para a obtenção de consenso na elaboração dos protocolos.

Contudo, cabe exclusivamente ao médico assistente a prerrogativa e a responsabilidade pela prescrição, conforme as condutas institucionais adotadas no âmbito do estabelecimento que trabalhe. Ao CACON ou UNACON cabe a aquisição e o fornecimento do medicamento prescrito por seu médico, devendo codificar o respectivo procedimento conforme a situação nele descrita.

Feitas essas considerações iniciais necessárias à compreensão da especificidade do tratamento de câncer pelo SUS, insta trazer o caso do medicamento Herceptin, de nome comercial Trastuzumabe (Laboratório Roche), utilizado para o tratamento do câncer de mama, que foi incorporado às diretrizes terapêuticas do SUS pelas portarias nº 18 e 19, de 25 de julho de 2012, da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, para tratamento de câncer de mama localmente avançado (fase III) e para o câncer de mama em estágio inicial (fases I e II).

Segundo a conclusão da incorporação60, o trastuzumabe pode ser utilizado no tratamento de pacientes com câncer de mama localmente avançado HER-2 positivo após cirurgia, quimioterapia (neoadjuvante ou adjuvante) e radioterapia (quando aplicável), sendo exigida a confirmação do status HER-2, por meio de exame molecular (FISH ou CISH), em tumores com expressão imunohistoquímica, com resultado de 2 a 3 cruzes.

A posologia do quimioterápico Trastuzumabe é calculada de acordo com o volume corporal do paciente, mas o preço de cada ampola (normalmente uma mulher de 70 kg utiliza uma ampola e meia por sessão de quimioterapia) varia entre R$ 10.700,00 (dez mil e setecentos reais) e R$ 11.100,00 (onze mil e cem reais).61

Dentro das condições impostas na incorporação, o quimioterápico Trastuzumabe está disponível no âmbito do SUS, para as pacientes que estiverem em tratamento, sendo administrado diretamente no CACON ou UNACON a que estiver vinculada.

Todavia, em relação ao câncer de mama estágio metastático, na qual a doença já se expandiu a outras partes do corpo, como fígado, pulmões, ossos, cérebro e outros órgãos, os membros da CONITEC presentes na reunião do plenário do dia 05/07/2012 decidiram, por unanimidade, não recomendar a incorporação do trastuzumabe para a quimioterapia paliativa do câncer de mama metastático – em virtude de seu caráter paliativo e com resultado modesto, e ainda diante dos múltiplos esquemas terapêuticos disponíveis e da opção de maior impacto da alocação de recursos na detecção precoce do câncer de mama. Trata-se, portanto de uma decisão técnica, tomada em termos de saúde pública, levando em consideração as diretrizes do SUS, especialmente os artigos 2º, 5º e 7º da Lei 8.080/90.

Essa decisão técnica, fundamentada, de não incorporação do trastuzumabe para os casos de câncer de mama em estágio metastático pode se considerar o que o Ministro Gilmar Mendes chama de “motivação para o não fornecimento de determinada ação de saúde pelo SUS”? Relembremos a passagem da STA 175 em que é abordada a questão:

O segundo dado a ser considerado é a existência de motivação para o não fornecimento de determinada ação de saúde pelo SUS. Há casos em que se ajuíza ação com o objetivo de garantir prestação de saúde que o SUS decidiu não custear por entender que inexistem evidências científicas suficientes para autorizar sua inclusão.

Nessa hipótese, podem ocorrer, ainda, duas situações distintas: 1º) o SUS fornece tratamento alternativo, mas não adequado a determinado paciente; 2º) o SUS não tem nenhum tratamento específico para determinada patologia.

A princípio, pode-se inferir que a obrigação do Estado, à luz do disposto no artigo 196 da Constituição, restringe-se ao fornecimento das políticas sociais e econômicas por ele formuladas para a promoção, proteção e recuperação da saúde.

Isso porque o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da “Medicina com base em evidências”. Com isso, adotaram-se os “Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas”, que consistem num conjunto de critérios que permitem determinar o diagnóstico de doenças e o tratamento correspondente com os medicamentos disponíveis e as respectivas doses. Assim, um medicamento ou tratamento em desconformidade com o Protocolo deve ser visto com cautela, pois tende a contrariar um consenso científico vigente.

Ademais, não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário às ações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante a elaboração de políticas públicas que repartam os recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível. Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendimento médico da parcela da população mais necessitada. Dessa forma, podemos concluir que, em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente.

Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso. Inclusive, como ressaltado pelo próprio Ministro da Saúde na Audiência Pública, há necessidade de revisão periódica dos protocolos existentes e de elaboração de novos protocolos. Assim, não se pode afirmar que os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas do SUS são inquestionáveis, o que permite sua contestação judicial.

Entendemos que a resposta ao questionamento antes feito é sim. No caso de um medicamento ter sido analisado e ter ficado clara a posição da CONITEC pela sua não incorporação no sistema público de saúde, como foi o caso do antineoplásicos Trastuzumabe para o tratamento do câncer de mama em estágio metastático, isso é motivação para o indeferimento de eventual pleito judicial no sentido de alcançar individualmente essa medicação, quanto mais se existem outras opções terapêuticas.

Aparentemente, o Ministro Luis Roberto Barroso tem entendimento semelhante, o que se denota quando ele afirma:

A extração de deveres jurídicos a partir de normas dessa natureza e estrutura deve ter como cenário principal as hipóteses de omissão dos Poderes Públicos ou de ação que contravenha a Constituição. Ou, ainda, de não atendimento do mínimo existencial.

Ressalvadas as hipóteses acima, a atividade judicial deve guardar parcimônia e, sobretudo, deve procurar respeitar o conjunto de opções legislativas e administrativas formuladas acerca da matéria pelos órgãos institucionais competentes.

Em suma: onde não haja lei ou ação administrativa implementando a Constituição, deve o Judiciário agir. Havendo lei e atos administrativos, e não sendo devidamente cumpridos, devem os juízes e tribunais igualmente intervir. Porém, havendo lei e atos administrativos implementando a Constituição e sendo regularmente aplicados, eventual interferência judicial deve ter a marca da autocontenção.


Conclusões

Difícil algo transtornar mais o ser humano do que a morte, ou do que a dor. Apesar de se tratar de uma das poucas certezas da vida (senão a única), imaginar a morte como um fardo prestes a desabar sobre o nosso destino é insuportável. Conviver com a impressão de que ela nos espreita é tão angustiante que organizamos nossa rotina diária como se fôssemos imortais, e ainda criamos teorias fantásticas para nos convencer de que a vida é eterna. 62

De fato, a empatia com o sofrimento do outro, com a falta de saúde, com a dor, com a tristeza da perda de um ente querido, e com o medo da própria morte faz parte do instinto humano, e não tem fronteiras, de forma que a salvaguarda do direito à vida e à saúde, não só é compreensível, como desejável em uma sociedade comprometida com a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos. No Brasil a garantia do direito à vida e à saúde é amplamente amparada na Constituição e na Legislação Ordinária, que reafirmam os pactos internacionais dos quais nosso país é signatário.

No presente trabalho, buscamos fazer breves reflexões sobre como o Judiciário tem tratado os limites às pretensões deduzidas em matéria de tecnologias em saúde e tratamentos médicos, trazendo casos atuais de grande repercussão na mídia (como o Canabidiol e a Fosfoetanolamina) e de bastante frequência no dia-a-dia forense (como o caso do Trastuzumabe para o tratamento de câncer de mama em estágio metastático). Nesse ensejo, buscamos caracterizar e classificar as diferentes situações que se apresentam, fazendo o cotejo com as definições traçadas pelo antológico julgamento da Suspensão de Antecipação de Tutela n.º 175 do STF de forma traçar uma esquematização a partir do que também a Lei 8.080/90 estipulou em seu artigo 19-T a vedação de custeio pelo SUS daquilo que não estiver registrado na ANVISA.


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Notas

1 Saramago, José. As intermitências da Morte. Companhia das Letras. Ano da Edição 2005.

2 AMARAL, Gustavo. Direito, Escassez Escolha. Critérios jurídicos para lidar com a Escassez de Recursos e as Decisões Trágicas. Lumen Juris, 2ª Edição, 2010.

3 Zero Hora de Terça-Feira 24 de novembro de 2015, página 26

4 PERLINGEIRO, Ricardo. Novas Perspectivas para a judicialização da saúde no Brasil. Disponível em https://www.ufjf.br/siddharta_legale/files/2014/07/novas-perspectivas-para-judicializao-da-saude-no-Brasil.pdf, consulta em 13/11/2015.

5 Fonte CNJ: https://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/79186-tribunal-de-justica-consegue-reduzir-numero-de-acoes-com-demandas-de-saude, consulta em 21/10/2015.

6 https://fernandorodrigues.blogosfera.uol.com.br/2015/11/25/em-10-anos-gasto-do-sus-com-decisoes-judiciais-cresce-744/ consulta em 27/11/2015, data da notícia 25/11/2015.

7 PERLINGEIRO, Ricardo. A tutela judicial do direito público à saúde no Brasil. Revista Direito, Estado e Sociedade n.41 p. 184. a 203 jul/dez2012, disponível em https://direitoestadosociedade.jur.puc-rio.br/media/9artigo41.pdf, consulta em 21/10/2015.

8 BARROSO, Luiz Roberto. DA FALTA DE EFETIVIDADE À JUDICIALIZAÇÃO EXCESSIVA: DIREITO À SAÚDE, FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS E PARÂMETROS PARA A ATUAÇÃO JUDICIAL. Disponível em https://www.luisrobertobarroso.com.br/wpcontent/themes/LRB/pdf/da_falta_de_efetividade_a_judicializacao_excessiva.pdf

9 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo : Saraiva, 2014. P. 653

10 ASENSI, Felipe Dutra. Judicialização da Saúde e Conselho Nacional de Justiça: perspectivas e desafios. In NOBRE, Milton Augusto de Brito; SILVA, Ricardo Augusto Dias da (Coord.). O CNJ e os desafios da efetivação do direito à saúde. 2ª ed. Belo Horizonte: Forum, 2013, p. 85-110.

11 TOMBINI, Carla Fernanda Leão Barcellos. Suspensão de segurança na visão dos Tribunais Superiores. Belo Horizonte, Fórum, 2009 p. 20.

12 (SS 2944, Relator(a): Min. PRESIDENTE, Decisão Proferida pelo(a) Ministro(a) ELLEN GRACIE, julgado em 17/08/2006, publicado em DJ 24/08/2006 PP-00020)

13 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo : Saraiva, 2014. P. 657-658

14 DECISÃO: Trata-se do pedido de suspensão de tutela antecipada nº 175, formulado pela União, e do pedido de suspensão de tutela antecipada nº 178, formulado pelo Município de Fortaleza, contra acórdão proferido pela 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, nos autos da Apelação Cível no 408729/CE (2006.81.00.003148-1), que deferiu a antecipação de tutela recursal para determinar à União, ao Estado do Ceará e ao Município de Fortaleza o fornecimento do medicamento denominado Zavesca (Miglustat), em favor de CLARICE ABREU DE CASTRO NEVES.

Na origem, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública, com pedido de tutela antecipada, contra a União, o Estado do Ceará e o Município de Fortaleza, com o fim de obter o fornecimento do medicamento Zavesca (Miglustat) em favor de Clarice Abreu de Castro Neves, portadora da doença Niemann-Pick Tipo “C” (fl. 3).

O Juízo da 7ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Ceará determinou a extinção do processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC, por ilegitimidade ativa do Ministério Público, com base na maioridade da pessoa doente e no fato de que o Ministério Público Federal não poderia substituir a Defensoria Pública (fls. 90-95).

Interposto recurso de apelação pelo Ministério Público Federal (fls. 96-111), a 1ª Turma do TRF da 5ª Região, reconhecendo a legitimidade ativa do Ministério Público para a propositura da ação civil pública, deferiu antecipação de tutela para que a União, o Estado do Ceará e o Município de Fortaleza fornecessem o medicamento Zavesca (Miglustat) à jovem de 21 anos portadora da doença neurodegenerativa progressiva (Niemann-Pick Tipo “C”).

Contra essa decisão a União ajuizou pedido de suspensão, alegando, em síntese, a ilegitimidade ativa do Parquet Federal e a ilegitimidade passiva da União. Sustentou a ocorrência de grave lesão à ordem pública - uma vez que o medicamento requerido não foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária e não consta da Portaria no 1.318 do Ministério da Saúde - e de grave lesão à economia pública, em razão do alto custo do medicamento (R$ 52.000,00 por mês). Inferiu, ainda, a possibilidade de ocorrência do denominado “efeito multiplicador”.

Em 8 de novembro de 2007, a Ministra Ellen Gracie determinou o apensamento da STA 178/DF a estes autos, por considerar idênticas as decisões formuladas.

Na Suspensão de Tutela Antecipada nº 178, o Município de Fortaleza requereu a suspensão da decisão liminar com base, igualmente, em alegações de lesão à ordem pública, em virtude da ilegitimidade do Ministério Público para propositura de ação civil pública a fim de defender interesse individual de pessoa maior de 18 anos (fls. 2-9 da STA 178).

A Procuradoria-Geral da República, em parecer de fls. 135-149, manifestou-se pelo indeferimento do pedido de suspensão. Salientou a existência do periculum in mora inverso.

No despacho de fls. 153-155, determinei que o Ministério Público Federal informasse se a substituída Clarice Abreu de Castro Neves ainda realizava tratamento com o medicamento ZAVESCA (Miglustat), tendo em vista que a Agência Europeia de Medicamentos (EMEA) havia divulgado a retirada do pedido de indicação de uso do medicamento pelo Laboratório Actelion Registration.

A Procuradoria-Geral da República, às fls. 162-166, informou que a paciente ainda realiza tratamento com o medicamento ZAVESCA, conforme relatório médico do neurologista da Rede SARAH de Hospitais do Aparelho Locomotor, Doutor Dalton Portugal. Juntou, ainda, o comunicado da Agência de Medicina Europeia, de 18 de dezembro de 2008, que confirma a indicação do medicamento em questão para o tratamento da doença Niemann-Pick Tipo C.

Decido.

A base normativa que fundamenta o instituto da suspensão (Leis nos 12.016/2009, 8.437/1992, 9.494/1997 e art. 297. do RI-STF) permite que a Presidência do Supremo Tribunal Federal, a fim de evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, suspenda a execução de decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos tribunais locais ou federais, quando a discussão travada na origem for de índole constitucional.

Assim, é a natureza constitucional da controvérsia que justifica a competência do Supremo Tribunal Federal para apreciar o pedido de contracautela, conforme a pacificada jurisprudência desta Corte.

No presente caso, reconheço que a controvérsia instaurada na ação em apreço evidencia a existência de matéria constitucional: alegação de ofensa aos arts. 2º, 6º, caput, 167, 196 e 198 da Constituição.

Destaco que a suspensão da execução de ato judicial constitui medida excepcional, a ser deferida, caso a caso, somente quando atendidos os requisitos autorizadores (grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas). Nesse sentido, confira-se trecho de decisão proferida pela Ministra Ellen Gracie no julgamento da STA no 138/RN:

“[...] os pedidos de contracautela formulados em situações como a que ensejou a antecipação da tutela ora impugnada devem ser analisados, caso a caso, de forma concreta, e não de forma abstrata e genérica, certo, ainda, que as decisões proferidas em pedido de suspensão se restringem ao caso específico analisado, não se estendendo os seus efeitos e as suas razões a outros casos, por se tratar de medida tópica, pontual” – (STA no 138/RN, Presidente Min. Ellen Gracie, DJ 19.9.2007).

Ressalte-se, não obstante, que, na análise do pedido de suspensão de decisão judicial, não é vedado ao Presidente do Supremo Tribunal Federal proferir um juízo mínimo de delibação a respeito das questões jurídicas presentes na ação principal, conforme tem entendido a jurisprudência desta Corte, da qual se destacam os seguintes julgados: SS-AgR no 846/DF, Rel. Sepúlveda Pertence, DJ 8.11.1996 e SS-AgR no 1.272/RJ, Rel. Carlos Velloso, DJ 18.5.2001.

O art. 4º da Lei no 8.437/1992 c/c art. 1º da Lei 9.494/1997 autoriza o deferimento do pedido de suspensão da execução da tutela antecipada concedida nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

A decisão liminar que a União e o Município de Fortaleza buscam suspender determinou que a União, o Estado do Ceará e o Município de Fortaleza fornecessem o medicamento Zavesca (Miglustat) à paciente Clarice Neves, com fundamento na aplicação imediata do direito fundamental social à saúde.

O direito à saúde é estabelecido pelo artigo 196 da Constituição Federal como (1) “direito de todos” e (2) “dever do Estado”, (3) garantido mediante “políticas sociais e econômicas (4) que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos”, (5) regido pelo princípio do “acesso universal e igualitário” (6) “às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação”.

A doutrina constitucional brasileira há muito se dedica à interpretação do artigo 196 da Constituição. Teses, muitas vezes antagônicas, proliferaram-se em todas as instâncias do Poder Judiciário e na seara acadêmica. Tais teses buscam definir se, como e em que medida o direito constitucional à saúde se traduz em um direito subjetivo público a prestações positivas do Estado, passível de garantia pela via judicial.

O fato é que a judicialização do direito à saúde ganhou tamanha importância teórica e prática que envolve não apenas os operadores do Direito, mas também os gestores públicos, os profissionais da área de saúde e a sociedade civil como um todo.

Se, por um lado, a atuação do Poder Judiciário é fundamental para o exercício efetivo da cidadania e para a realização do direito à saúde, por outro as decisões judiciais têm significado um forte ponto de tensão perante os elaboradores e executores das políticas públicas, que se veem compelidos a garantir prestações de direitos sociais das mais diversas, muitas vezes contrastantes com a política estabelecida pelos governos para a área da saúde e além das possibilidades orçamentárias.

Em 5 de março de 2009, convoquei Audiência Pública em razão dos diversos pedidos de suspensão de segurança, de suspensão de tutela antecipada e de suspensão de liminar em trâmite no âmbito desta Presidência, com vistas a suspender a execução de medidas cautelares que condenam a Fazenda Pública ao fornecimento das mais variadas prestações de saúde (fornecimento de medicamentos, suplementos alimentares, órteses e próteses; criação de vagas de UTIs e leitos hospitalares; contratação de servidores de saúde; realização de cirurgias e exames; custeio de tratamento fora do domicílio, inclusive no exterior, entre outros).

Após ouvir os depoimentos prestados pelos representantes dos diversos setores envolvidos, entendo ser necessário redimensionar a questão da judicialização do direito à saúde no Brasil. Isso porque, na maioria dos casos, a intervenção judicial não ocorre em razão de uma omissão absoluta em matéria de políticas públicas voltadas à proteção do direito à saúde, mas tendo em vista uma necessária determinação judicial para o cumprimento de políticas já estabelecidas. Portanto, não se cogita do problema da interferência judicial em âmbitos de livre apreciação ou de ampla discricionariedade de outros Poderes quanto à formulação de políticas públicas.

Esse dado pode ser importante para a construção de um critério ou parâmetro para a decisão em casos como este, no qual se discute, primordialmente, o problema da interferência do Poder Judiciário na esfera dos outros Poderes.

O primeiro dado a ser considerado é a existência, ou não, de política estatal que abranja a prestação de saúde pleiteada pela parte. Ao deferir uma prestação de saúde incluída entre as políticas sociais e econômicas formuladas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o Judiciário não está criando política pública, mas apenas determinando o seu cumprimento. Nesses casos, a existência de um direito subjetivo público a determinada política pública de saúde parece ser evidente.

Se a prestação de saúde pleiteada não estiver entre as políticas do SUS, é imprescindível distinguir se a não prestação decorre de uma omissão legislativa ou administrativa, de uma decisão administrativa de não fornecê-la ou de uma vedação legal a sua dispensação.

Não raro, busca-se no Poder Judiciário a condenação do Estado ao fornecimento de prestação de saúde não registrada na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

Como ficou claro nos depoimentos prestados na Audiência Pública, é vedado à Administração Pública fornecer fármaco que não possua registro na ANVISA.

A Lei Federal nº 6.360/76, ao dispor sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, determina em seu artigo 12 que “nenhum dos produtos de que trata esta Lei, inclusive os importados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde”. O artigo 16 da referida Lei estabelece os requisitos para a obtenção do registro, entre eles, que o produto seja reconhecido como seguro e eficaz para o uso a que se propõe. O Art. 18. ainda determina que, em se tratando de medicamento de procedência estrangeira, deverá ser comprovada a existência de registro válido no país de origem.

O registro de medicamento, como lembrado pelo Procurador-Geral da República, é uma garantia à saúde pública. E, como ressaltou o Diretor-Presidente da ANVISA, a agência, por força da lei de sua criação, também realiza a regulação econômica dos fármacos. Após verificar a eficácia, segurança e qualidade do produto e conceder o registro, a ANVISA passa a analisar a fixação do preço definido, levando em consideração o benefício clínico e o custo do tratamento. Havendo produto assemelhado, se o novo medicamento não trouxer benefício adicional, não poderá custar mais caro do que o medicamento já existente com a mesma indicação.

Por tudo isso, o registro na ANVISA mostra-se como condição necessária para atestar a segurança e o benefício do produto, sendo a primeira condição para que o Sistema Único de Saúde possa considerar sua incorporação.

Claro que essa não é uma regra absoluta. Em casos excepcionais, a importação de medicamento não registrado poderá ser autorizada pela ANVISA. A Lei nº 9.782/99, que criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), permite que a Agência dispense de “registro” medicamentos adquiridos por intermédio de organismos multilaterais internacionais, para uso de programas em saúde pública pelo Ministério da Saúde.

O segundo dado a ser considerado é a existência de motivação para o não fornecimento de determinada ação de saúde pelo SUS. Há casos em que se ajuíza ação com o objetivo de garantir prestação de saúde que o SUS decidiu não custear por entender que inexistem evidências científicas suficientes para autorizar sua inclusão.

Nessa hipótese, podem ocorrer, ainda, duas situações distintas: 1º) o SUS fornece tratamento alternativo, mas não adequado a determinado paciente; 2º) o SUS não tem nenhum tratamento específico para determinada patologia.

A princípio, pode-se inferir que a obrigação do Estado, à luz do disposto no artigo 196 da Constituição, restringe-se ao fornecimento das políticas sociais e econômicas por ele formuladas para a promoção, proteção e recuperação da saúde.

Isso porque o Sistema Único de Saúde filiou-se à corrente da “Medicina com base em evidências”. Com isso, adotaram-se os “Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas”, que consistem num conjunto de critérios que permitem determinar o diagnóstico de doenças e o tratamento correspondente com os medicamentos disponíveis e as respectivas doses. Assim, um medicamento ou tratamento em desconformidade com o Protocolo deve ser visto com cautela, pois tende a contrariar um consenso científico vigente.

Ademais, não se pode esquecer de que a gestão do Sistema Único de Saúde, obrigado a observar o princípio constitucional do acesso universal e igualitário às ações e prestações de saúde, só torna-se viável mediante a elaboração de políticas públicas que repartam os recursos (naturalmente escassos) da forma mais eficiente possível. Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendimento médico da parcela da população mais necessitada. Dessa forma, podemos concluir que, em geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente.

Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso. Inclusive, como ressaltado pelo próprio Ministro da Saúde na Audiência Pública, há necessidade de revisão periódica dos protocolos existentes e de elaboração de novos protocolos. Assim, não se pode afirmar que os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas do SUS são inquestionáveis, o que permite sua contestação judicial.

Situação diferente é a que envolve a inexistência de tratamento na rede pública. Nesses casos, é preciso diferenciar os tratamentos puramente experimentais dos novos tratamentos ainda não testados pelo Sistema de Saúde brasileiro.

Os tratamentos experimentais (sem comprovação científica de sua eficácia) são realizados por laboratórios ou centros médicos de ponta, consubstanciando-se em pesquisas clínicas. A participação nesses tratamentos rege-se pelas normas que regulam a pesquisa médica e, portanto, o Estado não pode ser condenado a fornecê-los.

Como esclarecido pelo Médico Paulo Hoff na Audiência Pública realizada, Diretor Clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, essas drogas não podem ser compradas em nenhum país, porque nunca foram aprovadas ou avaliadas, e o acesso a elas deve ser disponibilizado apenas no âmbito de estudos clínicos ou programas de acesso expandido, não sendo possível obrigar o SUS a custeá-las. No entanto, é preciso que o laboratório que realiza a pesquisa continue a fornecer o tratamento aos pacientes que participaram do estudo clínico, mesmo após seu término.

Quanto aos novos tratamentos (ainda não incorporados pelo SUS), é preciso que se tenha cuidado redobrado na apreciação da matéria. Como frisado pelos especialistas ouvidos na Audiência Pública, o conhecimento médico não é estanque, sua evolução é muito rápida e dificilmente acompanhável pela burocracia administrativa.

Se, por um lado, a elaboração dos Protocolos Clínicos e das Diretrizes Terapêuticas privilegia a melhor distribuição de recursos públicos e a segurança dos pacientes, por outro a aprovação de novas indicações terapêuticas pode ser muito lenta e, assim, acabar por excluir o acesso de pacientes do SUS a tratamento há muito prestado pela iniciativa privada.

Parece certo que a inexistência de Protocolo Clínico no SUS não pode significar violação ao princípio da integralidade do sistema, nem justificar a diferença entre as opções acessíveis aos usuários da rede pública e as disponíveis aos usuários da rede privada. Nesses casos, a omissão administrativa no tratamento de determinada patologia poderá ser objeto de impugnação judicial, tanto por ações individuais como coletivas. No entanto, é imprescindível que haja instrução processual, com ampla produção de provas, o que poderá configurar-se um obstáculo à concessão de medida cautelar.

Portanto, independentemente da hipótese levada à consideração do Poder Judiciário, as premissas analisadas deixam clara a necessidade de instrução das demandas de saúde para que não ocorra a produção padronizada de iniciais, contestações e sentenças, peças processuais que, muitas vezes, não contemplam as especificidades do caso concreto examinado, impedindo que o julgador concilie a dimensão subjetiva (individual e coletiva) com a dimensão objetiva do direito à saúde.

No caso dos autos, ressalto os seguintes dados fáticos como imprescindíveis para a análise do pleito:

a) a interessada, jovem de 21 anos de idade, é portadora da patologia denominada NIEMANN-PICK TIPO C, doença neurodegenerativa rara, comprovada clinicamente e por exame laboratorial, que causa uma série de distúrbios neuropsiquiátricos, tais como, “movimentos involuntários, ataxia da marcha e dos membros, disartria e limitações de progresso escolar e paralisias progressivas” (fl. 29);

b) os sintomas da doença teriam se manifestado quando a paciente contava com cinco anos de idade, sob a forma de dificuldades com a marcha, movimentos anormais dos membros, mudanças na fala e ocasional disfagia (fl. 29);

c) os relatórios médicos emitidos pela Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação relatam que o uso do ZAVESCA (miglustat) poderia possibilitar um aumento de sobrevida e a melhora da qualidade de vida dos portadores de Niemann-Pick Tipo C (fl. 30);

d) a família da paciente declarou não possuir condições financeiras para custear o tratamento da doença, orçada em R$ 52.000,00 por mês; e

e) segundo o acórdão impugnado, há prova pré-constituída de que o medicamento buscado é considerado pela clínica médica como único capaz de deter o avanço da doença ou de, pelo menos, aumentar as chances de vida da paciente com uma certa qualidade (fl. 108).

A decisão impugnada, ao deferir a antecipação de tutela postulada, aponta a existência de provas quanto ao estado de saúde da paciente e a necessidade do medicamento indicado, nos seguintes termos:

“(...) No caso concreto, a verossimilhança da alegação é demonstrada pelos documentos médicos que restaram coligidos aos autos. No de fl. 24, consta que ‘o miglustato (Zavesca) é o único medicamento capaz de deter a progressão da Doença de Niemann-Pick Tipo C, aliviando, assim, os sintomas e sofrimentos neuropsiquiátricos da paciente’. A afirmação é seguida de indicação das bases nas quais se assentou a conclusão: estudos que remontam ao ano 2000. Além dele, convém apontar para o parecer exarado pela Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação – Associação das Pioneiras Sociais, sendo essa instituição de referência nacional. Nessa manifestação (fl. 28) consta: ‘Atualmente o tratamento é, preponderantemente, de suporte, mas já há trabalhos relatando o uso do Zavesca (miglustat), anteriormente usado para outras doenças de depósito, com o objetivo de diminuir a taxa de biossíntese de glicolipídios e, portanto, a diminuição do acúmulo lisossomol destes glicolípidios que estão em quantidades aumentadas pelo defeito do transporte de lipídios dentro das células; o que poderia possibilitar um aumento de sobrevida e/ou melhora da qualidade de vida dos pacientes acometidos pela patologia citada’. Acrescente-se que o medicamento pretendido tem sido ministrado em casos idênticos. (...) Esse quadro mostra que há prova pré-constituída de que a jovem CLARICE é portadora da doença Niemann-Pick Tipo C; de que a medicação buscada (miglustat) é considerada pela clínica médica como único capaz de deter o avanço da doença ou de, ao menos, aumentar as chances de vida do paciente com uma certa qualidade; de que tem sido ministrado em outros pacientes, também em decorrência de decisões judiciais.” (fls. 107-108)

O argumento central apontado pela União reside na falta de registro do medicamento Zavesca (miglustat) na Agência Nacional de Vigilância Sanitária e, consequentemente, na proibição de sua comercialização no Brasil.

No caso, à época da interposição da ação pelo Ministério Público Federal, o medicamento ZAVESCA ainda não se encontrava registrado na ANVISA (fl. 31).

No entanto, em consulta ao sítio da ANVISA na internet, verifiquei que o medicamento ZAVESCA (princípio ativo miglustate), produzido pela empresa ACTELION, possui registro (nº 155380002) válido até 01/2012.

O medicamento Zavesca, ademais, não consta dos Protocolos e Diretrizes Terapêuticas do SUS, sendo medicamento de alto custo não contemplado pela Política Farmacêutica da rede pública.

Apesar de a União e de o Município de Fortaleza alegarem a ineficácia do uso de Zavesca para o tratamento da doença de Niemann-Pick Tipo C, não comprovaram a impropriedade do fármaco, limitando-se a inferir a inexistência de Protocolo Clínico do SUS.

Por outro lado, os documentos juntados pelo Ministério Público Federal atestam que o medicamento foi prescrito por médico habilitado, sendo recomendado pela Agência Europeia de Medicamentos (fl. 166).

Ressalte-se, ainda, que o alto custo do medicamento não é, por si só, motivo para o seu não fornecimento, visto que a Política de Dispensação de Medicamentos excepcionais visa a contemplar justamente o acesso da população acometida por enfermidades raras aos tratamentos disponíveis.

A análise da ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal e da ilegitimidade passiva da União e do Município refoge ao alcance da suspensão de tutela antecipada, matéria a ser debatida no exame do recurso cabível contra o provimento jurisdicional que ensejou a presente medida.

Inocorrentes os pressupostos contidos no art. 4º da Lei no 8.437/1992, verifico que a suspensão da decisão representa periculum in mora inverso, podendo a falta do medicamento solicitado resultar em graves e irreparáveis danos à saúde e à vida da paciente.

Reforçando esse entendimento, a Procuradoria-Geral da República asseverou:

“[...] A suspensão dos efeitos da decisão pode, portanto, ocasionar danos graves e irreparáveis à saúde e à vida da paciente, parecendo indubitável, na espécie, o chamado perigo de dano inverso, a demonstrar a elevada plausibilidade da pretensão veiculada na ação originária, minando, em contrapartida, a razoabilidade da suspensão requerida” - (fl. 148).

Assim, não é possível vislumbrar grave ofensa à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas a ensejar a adoção da medida excepcional de suspensão de tutela antecipada.

Ante o exposto, indefiro o pedido de suspensão.

Publique-se.

Brasília, 18 de setembro de 2009.

Ministro GILMAR MENDES

Presidente

15 DALLARI, Sueli Gandolfi. O Judiciário e o Direito à Saúde. In NOBRE, Milton Augusto de Brito; SILVA, Ricardo Augusto Dias da (Coord.). O CNJ e os desafios da efetivação do direito à saúde. 2ª ed. Belo Horizonte: Forum, 2013. P 463-484.

16 TIMM, Luciano Benetti . Judicialização da Saúde e Conselho Nacional de Justiça: perspectivas e desafios. In NOBRE, Milton Augusto de Brito; SILVA, Ricardo Augusto Dias da (Coord.). O CNJ e os desafios da efetivação do direito à saúde. 2ª ed. Belo Horizonte: Forum, 2013, p. 283-300.

17 FARENZENA, Suélen. A BUSCA PELA EFETIVIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS E A PROBLEMÁTICA ATINENTE AO CONTROLE JUDICIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS E ORÇAMENTOS ESTATAIS. Revista de Direitos e Garantias Fundamentais, Vitória, n. 9, p. 77-104, jan./jun. 2011.

18 “Intervenção Judicial na saúde pública”, Parecer da Consultoria Jurídica do Ministério da Saúde, disponível em: https://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/maio/29/Panorama-da-judicializa----o---2012---modificado-em-junho-de-2013.pdf, consulta em 05/11/2015

19 A incorporação de novas tecnologias em saúde no SUS depende avaliação da CONITEC, Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, criada com a Lei nº 12.401, de 28 de abril de 2011, que dispõe sobre a assistência terapêutica e a incorporação de tecnologia em saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A CONITEC é vinculada à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE) do Ministério da Saúde o qual é responsável pela incorporação de tecnologias no SUS e assistida pelo Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde (DGITS).Esse órgão colegiado de caráter permanente, integrante da estrutura regimental do Ministério da Saúde, tem por objetivo assessorar o Ministério nas atribuições relativas à incorporação, exclusão ou alteração pelo SUS de tecnologias em saúde, bem como na constituição ou alteração de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas.

Lei 8.080/90 com alteração introduzida pela Lei 12.401/2011:

(...)

“Art. 19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.

§ 1o A Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, cuja composição e regimento são definidos em regulamento, contará com a participação de 1 (um) representante indicado pelo Conselho Nacional de Saúde e de 1 (um) representante, especialista na área, indicado pelo Conselho Federal de Medicina.

§ 2o O relatório da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS levará em consideração, necessariamente:

I - as evidências científicas sobre a eficácia, a acurácia, a efetividade e a segurança do medicamento, produto ou procedimento objeto do processo, acatadas pelo órgão competente para o registro ou a autorização de uso;

II - a avaliação econômica comparativa dos benefícios e dos custos em relação às tecnologias já incorporadas, inclusive no que se refere aos atendimentos domiciliar, ambulatorial ou hospitalar, quando cabível.”

20 https://www.brasil.gov.br/saude/2013/02/dobra-a-inclusao-de-novos-medicamentos-e-tecnologias-no-sus, consulta em 13/11/2015.

21 MENDES, Gilmar Ferreira. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL. São Paulo, Saraiva, 9ª Edição, p.651

22 https://www.anvisa.gov.br/medicamentos/registro/registro_offlabel.htm consulta em 05/11/2015.

23 https://www.fda.gov/

24 https://www.ema.europa.eu/ema/

25 https://www.endocrino.org.br/posicionamento-sobre-uso-da-melatonina/, consulta em 23/11/2015.

26 https://www.endocrino.org.br/media/uploads/PDFs/posicionamento_sobre_melatonina_sbem.pdf, consulta em 23/11/2015.

27 Inquérito Civil Público 1.29.017.000001/2014-13., vide https://noticias.pgr.mpf.mp.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_geral/mpf-em-canoas-questiona-anvisa-e-busca-a-liberacao-de-melatonina-no-brasil, consulta em 23/11/2015

28 (TJ-RJ - RI: 04264765120138190001 RJ 0426476-51.2013.8.19.0001, Relator: JOAO FELIPE NUNES FERREIRA MOURAO, Data de Julgamento: 13/11/2014, Primeira Turma Recursal Fazendária, Data de Publicação: 27/01/2015 00:00) disponível em https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/167906048/recurso-inominado-ri-4264765120138190001-rj-0426476-5120138190001, consulta em 23/11/2015.

29 PARECER No 806/2012 806/2012 –AGU/CONJUR AGU/CONJUR AGU/CONJUR-MS/HRP, disponível em: https://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/novembro/10/PARECER-806.pdf, consulta em 05/11/2015.

30 FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. O DIREITO À SAÚDE EM PERSPECTIVA COMPARADA: O USO COMPASSIVO DE MEDICAMENTOS EXPERIMENTAIS. Revista Temática nº 35: Le Corti Internazionali i Diritti Umani ed il Diritto in Europa, vol. 2. nov./dez. 2014. - Brasília-DF p. 163. a 186. Disponível em https://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/157074

31 Artigo 8.º (Direito ao respeito pela vida privada e familiar)

1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência.

2. Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros.

32 Artigo 2.º (Direito à vida)

1. O direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei. Ninguém poderá ser intencionalmente privado da vida, salvo em execução de uma sentença capital pronunciada por um tribunal, no caso de o crime ser punido com esta pena pela lei.

2. Não haverá violação do presente artigo quando a morte resulte de recurso à força, tornado absolutamente necessário:

a) Para assegurar a defesa de qualquer pessoa contra uma violência ilegal;

b) Para efetuar uma detenção legal ou para impedir a evasão de uma pessoa detida legalmente;

c) Para reprimir, em conformidade com a lei, uma revolta ou uma insurreição.

33 Lei 6.360/76 art. 6º e 16º, C/C art. 200. da Constituição da República, Art. 6º I “a” e VII da Lei 8.080/90, Lei 9.782/99 artigos 6º, 7º e 8º

34 PARECER Nº802/2012-AGU/CONJUR AGU/CONJUR AGU/CONJUR-MS/HRP disponível em: https://portalsaude.saude.gov.br/images/pdf/2014/novembro/10/PARECER-802.pdf , consulta em 05/11/2015

35 ARANHA, Marina Domingues de Castro Camargo, PINTO, Felipe Chiarello de Souza. JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE E O FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO APROVADOS PELA ANVISA. Revista de Direito do Consumidor | vol. 96/2014 | p. 139. - 154 | Nov - Dez / 2014 | DTR\2014\18731

36 Apresentação de Ivo Bucaresky, Diretor-Presidente Substituto da ANVISA na Câmara dos Deputados. Seminário: Uso Medicinal do Canabidiol, disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cssf/seminario-e-outros-eventos/seminarios-2014/uso-medicinal-do-canabidiol-cbd/apresentacao-1, consulta em 05/11/2015.

37 Apresentação de Ivo Bucaresky. Idem.

38 https://oglobo.globo.com/sociedade/saude/anvisa-muda-postura-so-autoriza-canabidiol-para-epilepsia consulta em 05/11/2015

39 FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. O DIREITO À SAÚDE EM PERSPECTIVA COMPARADA: O USO COMPASSIVO DE MEDICAMENTOS EXPERIMENTAIS. Revista Temática nº 35: Le Corti Internazionali i Diritti Umani ed il Diritto in Europa, vol. 2. nov./dez. 2014. - Brasília-DF p. 163. a 186. Disponível em https://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/157074

40 Fonte Esclarecimentos à Sociedade feitos pelo Instituto de Química São Carlos, da USP, disponível em: https://www5.iqsc.usp.br/esclarecimentos-a-sociedade/, consulta em 05/11/2015.

41 Diário Oficial da União - Seção 1 Edição nr 208 de 30/10/2015 Pág. 43

42 (Pet 5828 MC, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, julgado em 06/10/2015, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-203 DIVULG 08/10/2015 PUBLIC 09/10/2015)

43BARROSO, Luiz Roberto. DA FALTA DE EFETIVIDADE À JUDICIALIZAÇÃO EXCESSIVA: DIREITO À SAÚDE, FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS E PARÂMETROS PARA A ATUAÇÃO JUDICIAL. Disponível em https://www.luisrobertobarroso.com.br/wpcontent/themes/LRB/pdf/da_falta_de_efetividade_a_judicializacao_excessiva.pdf

44 https://www.conjur.com.br/2015-out-30/direitos-fundamentais-remedios-fase-experimental-mostramlimites-tutela-saude, consulta em 13/11/2015.

45 https://www.ebc.com.br/noticias/2015/11/conselho-autua-usp-por-falta-de-condicoes-para-producao-da-fosfoetanolamina, consulta em 13/11/2015.

46 https://www.conjur.com.br/2015-nov-11/tj-sp-cassa-liminares-mandavam-usp-fornecer-capsula-cancer consulta em 13/11/2015.

47 https://portalsaude.saude.gov.br/index.php/cidadao/principal/agencia-saude/20455-ministerio-da-saude-cria-grupo-de-trabalho-para-apoiar-estudo-da-fosfoetanolamina, consulta em 05/11/2015.

48 https://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2015/11/governo-investira-r-10-milhoes-em-pesquisas-da-fosfoetanolamina-4901071.html?utm_source=Redes+Sociais&utm_medium=Hootsuite&utm_campaign=Hootsuite, consulta em 12/11/2015.

49 GADELHA, Maria Inêz Pordeus. Escolhas públicas e protocolos clínicos: o orçamento, as renúncias necessárias e os novos projetos de leis. In NOBRE, Milton Augusto de Brito; SILVA, Ricardo Augusto Dias da (Coord.). O CNJ e os desafios da efetivação do direito à saúde. 2ª ed. Belo Horizonte: Forum, 2013. P 367-374.

50 https://pt.wikipedia.org/wiki/Medicina_baseada_em_evid%C3%AAncias

51 https://www.centrocochranedobrasil.org.br/cms/index.php?option=com_content&view=article&id=13&Itemid=4

52 https://conitec.gov.br/index.php/consultas-publicas

53 https://www1.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=322

54 Disponível em: https://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/3092aa80474594909c3fdc3fbc4c6735/PORTARIA%2BN%C2%BA%2B741-2005.pdf?MOD=AJPERES

55 Os conceitos e definições encontram-se no Anexo I da Portaria SAS 741/2005).

56 PONTAROLLI, Deise Regina Sprada (Coordenação do Livro). ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA NO SUS – PROJETO DE PARCERIA DO CONASS E DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, Coleção Progestores, para entender a gestão do SUS. Brasília 2007. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/colec_progestores_livro7.pdf

57 https://www.inca.gov.br/wps/wcm/connect/agencianoticias/site/home/noticias/2010/ministerio_saude_lanca_protocolos_que_definem_diagnostico_tratamento_de_33_doencas

58 https://conitec.gov.br/images/Protocolos/livro-pcdt-oncologia-2014.pdf

59 https://conitec.gov.br/images/Protocolos/livro-pcdt-oncologia-2014.pdf

60 https://conitec.gov.br/images/Relatorios/Portaria/2012/Portaria18e19_2012.pdf

61 https://consultaremedios.com.br/herceptin/p

62 Varella, Drauzio. POR UM FIO, Companhia das Letras, São Paulo, 2004. P.8


Autor


Informações sobre o texto

O presente texto foi elaborado como um dos papers para o curso de Pós Graduação em Direito Público e Advocacia de Estado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORSCH, Renata. Paradigmas traçados pela jurisprudência do STF para condução de demandas por medicamentos não padronizados pelo SUS. Casos polêmicos do canabidiol e fosfoetanolamina. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4546, 12 dez. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45096. Acesso em: 26 abr. 2024.