Um casal de adquirentes de duas unidades residenciais na planta no empreendimento denominado Condomínio VN Casa Gomes de Carvalho, na zona sul da cidade de São Paulo, perante a incorporadora Vitacon Participações S/A., obteve vitória perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, através da manutenção da sentença de primeira instância que havia decretado a rescisão das “Escrituras de Promessa de Venda e Compra de unidade autônoma e outros pactos” por ato dos compradores que já não mais suportavam arcar com o pagamento das parcelas, determinando à incorporadora a devolução à vista de 90% sobre os valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária até o momento da efetiva devolução.
A aquisição dos projetos de imóveis na planta ocorreu em junho de 2014, quando então os compradores assinaram os contratos perante a incorporadora.
Passados cerca de 1 ano da data da compra, os adquirentes não mais conseguiram arcar com o pagamento das parcelas e procuraram pela incorporadora, a fim de obter o distrato amigável do negócio. Para sua surpresa, foram informados pelo depto. financeiro da incorporadora de que até seria possível o cancelamento do negócio, porém, dos valores pagos em contrato, devolveria apenas o equivalente a 40% (quarenta por cento) dos valores pagos.
Incrédulos com a resposta da incorporadora, os compradores procuraram o Poder Judiciário.
O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Central de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato dos compradores, bem como a condenação da incorporadora na restituição de grande parte dos valores pagos.
A Juíza de Direito da 44ª Vara Cível, Dra. Anna Paula Dias da Costa, em decisão datada de 25 de outubro de 2016, afirmou textualmente que, de fato, os compradores tinham o direito à rescisão do negócio por insuportabilidade financeira e a incorporadora deveria restituir boa parte das importâncias pagas, condenando-a em primeira instância na restituição à vista do equivalente a 90% (noventa por cento) dos valores pagos em contrato, acrescido de correção monetária desde a data da sentença até o momento da efetiva devolução.
Inconformada com a decisão de primeiro grau, a incorporadora decidiu seguir com o processo mediante recurso de apelação interposto perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Recurso processado e devidamente distribuído perante a 5ª Câmara de Direito Privado, tendo como Relator o Desembargador Moreira Viegas, acompanhado dos Desembargadores Fábio Podestá e Fernanda Gomes Camacho, para analisar se a Juíza de Direito na primeira instância agiu corretamente ou não ao condenar a incorporadora na restituição de grande parte dos valores pagos em contrato.
Por votação unânime datada de 05 de abril de 2017, os Desembargadores entenderam por bem manter integralmente a sentença de primeira instância para condenar a incorporadora na devolução do equivalente a 90% (noventa por cento) dos valores pagos em contrato.
Para o Desembargador Relator, com a rescisão do negócio motivada por ato dos compradores, as partes devem retornar ao estado anterior à compra, observando que no caso em análise a incorporadora deve devolver parte considerável dos valores pagos pelos compradores, uma vez que estes sequer tomaram posse dos imóveis, o que não gera grandes despesas para a incorporadora.
Nas palavras do Desembargador:
- “A ação objetiva a rescisão de compromisso de compra e venda cumulada com pedido devolução dos valores pagos, em decorrência da inviabilidade dos autores continuarem adimplindo com o pagamento do contrato.
- É de se ressaltar, inicialmente, que se aplica à hipótese o Código de Defesa do Consumidor. Portanto, é de rigor a devolução das parcelas pagas, uma só vez, sob pena de se colocar o consumidor em situação de onerosidade excessiva, conforme dispõe o artigo 53 da citada norma e na esteira das Súmulas nº 1 e 2 deste Tribunal de Justiça:
- “A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição”.
- “O compromissário comprador do imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem”.
- Assim, cristalino admitir-se a resolução até pelo simples inadimplemento dos adquirentes, por insuportabilidade do contrato, devendo o vendedor receber o imóvel objeto do contrato e o comprador os valores que pagou.
- Mas o percentual a ser restituído deve ser variável, e isso somente o caso concreto pode explicitar.
- O adquirente que não obrou, em tempo algum, em mora, suspendendo o pagamento quando do vencimento dos prazos contratuais para entrega da obra, notificando, de imediato, sua intenção em não mais prosseguir no contrato, não pode ser tratado como aquele que, simplesmente, deixa de pagar e, quando instado, toma alguma iniciativa. Quem simplesmente deixa de pagar e não diz porque o faz, quebra a expectativa de recebimento do credor e pode causar outros prejuízos que não exclusivamente aqueles decorrentes da falta do valor devido.
- Quando o comprador, todavia, pela insuportabilidade do contrato, acaba por colocar-se em mora, causou, com o inadimplemento, prejuízo ao credor, não só pelo não pagamento, mas pelo conjunto de consequências que aí decorrem. Pode, por exemplo, comprometer todo o empreendimento. Pode causar prejuízo a todos os participantes. Ou pode gerar um custo financeiro para o credor, que haverá de suportar aquela parcela para a continuidade do empreendimento.
- É óbvio, não se desconhece, que essa prova demandaria debate amplo e específico, nem sempre possível ou de interesse das partes. Mas - e como é o caso - não se verificando quer a onerosidade excessiva quer a teoria da imprevisão ao contrário, o inadimplemento singelo dos autores por culpa sua, a retenção é devida.
- Aliás, alguma consequência para o descumprimento há de ser fixada, pena de incentivo ao inadimplemento, o que o direito não deve admitir.
- Ademais, sem ciência do intento de rescindir, não pode o credor repassar o bem a terceiro.
- No caso, denota-se que os autores não conseguindo arcar com os pagamento pleitearam a rescisão, a qual não se formalizou pela abusividade das regras de retenção estipulada em contrato. Assim, para que sejam reparados adequadamente os prejuízos sofridos, afigura-se razoável, na hipótese, que a retenção seja mantida no patamar de 10% (dez por cento) dos valores pagos.
- A r. sentença, assim, deve ser mantida na íntegra.
- Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso.”
Ao final, por votação unânime, os Desembargadores da 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negaram provimento ao recurso de apelação interposto pela incorporadora para o fim de manter a sentença que a condenou em primeira instância na restituição à vista de 90% (noventa por cento) dos valores pagos, acrescido de correção monetária desde a data da sentença até o momento da efetiva devolução.
Processo nº 1097884-81.2015.8.26.0100
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
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http://mercadanteadvocacia.com/decisao/rescisaodistrato-do-contrato-por-ato-do-comprador/
* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.