Resumo: O presente artigo trata, legal e hipoteticamente, sobre as alterações sofridas pela Lei Geral de Licitações e Contratos nº 8.666/93, em decorrência da promulgação da Lei Federal nº 13.500/17, a qual acrescentou o Inciso XXXV ao Art. 24, e o § 5º ao artigo 40, e ainda, promoveu alteração no Inciso I, do Parágrafo Único do Art. 26. A metodologia utilizada para confecção foi bibliográfica e legislativa. A respeito da temática, será objeto de estudo: a inclusão de nova hipótese de dispensa de licitação; a análise comparativa do inciso IV frente ao novo inciso XXXV do art. 24 da LLC nº 8.666/93; da ausência de prazo para conclusão de obras e serviços; e, por fim, a faculdade de exigência da contratação de mão de obra oriunda ou egressa do sistema prisional. Nesse diapasão, apresentando pontos positivos com a inovação da Lei 13.500/17 na Lei Geral de Licitações, considerando que o legislador optou por utilizar politicas públicas nas contratações estatais de mão de obra, de forma a estabelecer percentual mínimo de utilização de mão de obra oriunda ou egressa do sistema prisional, e dinamizar as ações nos estabelecimentos penais e socioeducativos, bem como nas ações da segurança pública
Palavras-chave: Alteração. Inovação. Dispensa de Licitação. Ressocialização. Cotas.
1 INTRODUÇÃO
Após a aprovação da Medida Provisória nº 781/2011 pelo Congresso Nacional, foi sancionada pela Presidência da República a Lei nº 13.500, de 26.11.2017, que altera a LC nº 79, de 07.01.1994, para dispor sobre a transferência de recursos financeiros do Fundo Penitenciário Nacional. Bem como altera a Lei nº 11.473, de 10.05.2007, para permitir a prestação de serviços, em caráter excepcional e voluntário, à Secretaria Nacional de Segurança Pública, na qual se inclui a Força Nacional de Segurança Pública, e ainda, as Leis nos 8.666/93 e 10.826/03, temos também, a revogação da Medida Provisória nº 755, de 19.12.2016.
Trataremos aqui somente as alterações que impactam a arcaica Lei nº 8.666/93, que na iminência de ser substituída, continua sendo alterada, aos moldes de uma cocha de retalho, bem como a Lei de Execuções Penais em sua aplicabilidade pertinente ao trabalho dos reeducandos.
Objetivando esclarecer de forma sistemática as alterações e inovações trazidas pela Lei nº 13.500/17, que impactaram a LLC nº 8.666/93, sendo o acréscimo do inciso XXXV ao Art. 24, e do § 5º ao Artigo 40, bem como, a alteração no Inciso I do Parágrafo Único do Art. 26.
Com efeito, temos a inclusão de nova hipótese de dispensa de licitação; a análise comparativa do inciso IV frente ao novo inciso XXXV do art. 24 da LLC nº 8.666/93; da ausência de prazo para conclusão de obras e serviços; e, por fim, a faculdade de exigência da contratação de mão de obra oriunda ou egressa do sistema prisional.
2 DA INCLUSÃO DE NOVA HIPÓTESE
O artigo 24 da lei nº. 8.666/93, que prevê taxativamente as hipóteses de licitação dispensável, de forma que foi inserido em seu rol, por intermédio da Lei nº 13.500/17, mais um inciso, sendo o de número XXXV, a saber.
Art. 24. É dispensável a licitação:
XXXV - para a construção, a ampliação, a reforma e o aprimoramento de estabelecimentos penais, desde que configurada situação de grave e iminente risco à segurança pública. (Incluído pela Lei nº 13.500, de 2017
Em decorrência da inclusão do novo dispositivo, foi alterada a redação do inciso I, parágrafo único, do art. 26, de forma a adequar o modo de instrução processual para justificação da dispensa, acrescentando a caracterização prevista no recente inciso XXXV do art. 24.
A redação anterior a mudança, contava somente com a necessidade de caracterização da situação emergencial ou calamitosa, para justificação da dispensa. Com efeito, a alteração acrescentou “grave e iminente risco à segurança pública”, para agasalhar a nova hipótese taxativa de licitação dispensável (Inciso XXXV do art.24), conforme observamos abaixo.
Art. 26. (...)
Parágrafo único. (...)
I - Caracterização da situação emergencial, calamitosa ou de grave e iminente risco à segurança pública que justifique a dispensa, quando for o caso;
Em sendo uma hipótese de licitação dispensável, o gestor público, poderá, ou não, realizar o procedimento licitatório, sendo um ato discricionário. Salientando que a regra imposta pela lei 8.666/93, é, sempre, licitar.
Os romanos já proferiam a séculos que “non omne quod licet honestum est”, em tradução livre, “nem tudo que é legal é honesto”.
Segundo Professor Dawison Barcelos, em seu artigo “Nova hipótese de dispensa de licitação (art.24, XXXV) – Lei nº 13.500/17”, pode-se extrair da redação da nova Lei os pressupostos abaixo:
I. que o objeto da dispensa seja a construção, a ampliação, a reforma e o aprimoramento de estabelecimentos penais;
II. a situação deve ser grave e apresentar iminente risco à segurança pública. (grifo original)
Acerca da caracterização do objeto da dispensa, entendemos que essa poderá ser aplicada nos pressupostos acima referenciados, devendo ser observado a necessidade da caracterização de grave e iminente risco à segurança pública.
Notório que o sistema de segurança pública, em especial o sistema penitenciário brasileiro, é deficitário em sua estrutura e aparelhamento, de forma que, não rara as situações, vislumbram-se necessidades emergenciais, que, por si só, já seriam um enquadramento constante na hipótese em comento, abrindo margem para dispensas continuas. Temos aqui uma dualidade, imprimidas em aspectos positivos e negativos, sendo o primeiro, a facilidade para o atendimento dos objetos propostos pelo inciso na forma de dispensa, já o segundo, seria a fuga do procedimento licitatório (a regra é licitar), e a ausência da competitividade entre as licitantes.
O Advogado Rogério Correia, especialista em Licitações e Contratos, ao escrever o artigo “NOVAS alterações na lei de licitações e Contratos”, ressaltou bem que “as ações de segurança já dispunham de um tratamento diferenciado, disciplinado pela Lei 12.462/11, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações (RDC)”.
As ações descritas supra, foram incluídas nas hipóteses de aplicação do RDC, através da Lei nº 13.190/15, que acrescentou os incisos VI e VII, que respectivamente tratam de licitações e contratos necessários à realização das obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma e administração de estabelecimentos penais e de unidades de atendimento socioeducativo, e das ações no âmbito da segurança pública.
Ressalta-se a preocupação do legislador em dinamizar as ações nos estabelecimentos penais e socioeducativos, bem como nas ações da segurança pública, uma vez que ao incluir tais hipóteses ao RDC, já demonstrava medidas positivas de diferenciação para esses segmentos. De forma que, a sanção da lei 13.500/17 é uma extensão continuada de políticas públicas para sanar as mazelas da segurança pública, que se conduz de forma deficitária.
Contrário à visão do entendimento do Prof. Dawison Barcelos, o qual diz que “a inclusão do inciso XXXV ao art. 24, materialmente, não cria nova hipótese de dispensa de licitação", afirmando ser "desnecessária a 'novidade' trazida pela Lei nº 13.500/2017”, entendemos que, ocorreu, sim! uma nova hipótese de dispensa de licitação, pois o legislador trata da questão de antever fatos para garantir a segurança pública, diferentemente do que era positivado antes no art. 24, IV, conforme discorreremos adiante.
2.1 Inciso IV versus inciso XXXV da Lei 8.666/93
O inciso IV do artigo 24, trata da possibilidade de, nos casos de emergência ou de calamidade pública, dispensar licitação quando restar a caracterização da urgência de atendimento de situação que possa ocasionar danos ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, tanto da Administração Pública ou particulares.
O inciso limita ainda ao lapso temporal máximo de 180 (cento e oitenta) dias, sendo esses contados de forma consecutiva e ininterruptas, que deverão ser computados da caracterização da emergência ou calamidade, sendo defeso a prorrogação contratual.
No primeiro momento, ao lermos o disposto no inciso XXXV, art.24, podemos entender que a caracterização apresentada na nova hipótese poderia, em tese, ser suprida pelo comando contido no inciso IV, art. 24, conforme entendimento exteriorizado pelo Prof. Dawison Barcelos, a saber.
Tendo em vista que a dispensa do inc. IV serve aos casos de emergência, “quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares”, não vislumbramos hipótese em que a situação possa ser enquadrada no inc. XXXV, mas não no inciso IV. (negrito original)
Seguindo em sua linha de raciocínio, Dawison Barcelos, assevera que “(...) não haveria situação grave com iminente risco à segurança pública que não traga consigo urgência de atendimento de situação que envolva risco à segurança de pessoas, obras, serviços ou equipamentos”.
Contudo, sob a nossa ótica, o objetivo do legislador ao criar o dispositivo, foi de dar ar de especialidade na hipótese de dispensa de licitação, pois no art. 24, IV, tratava somente dos casos de emergência ou de calamidade pública com caracterização de urgência, casos que não abrangiam situações de grave e iminentes riscos.
2.2 Da Ausência de Prazo para Conclusão de Obras e Serviços
Diferente do limite que é estabelecido pelo art. 24, IV, que engessa ao lapso temporal de no máximo de 180 (cento e oitenta) dias para conclusão de obras e serviços, a nova hipótese prevista no inciso XXXV do artigo 24, não delimitou prazo para construção, ampliação, reforma e aprimoramento de estabelecimentos penais.
Diante da ausência da limitação de prazo para conclusão de obras e serviços, entendemos que a Administração Pública está autorizada a contratar com empresas por dispensa de licitação para construção, ampliação, reforma e aprimoramento de estabelecimentos penais, assim, deixando a faculdade ao gestor público, que de forma discricionária poderá optar por essa hipótese, ou optar pela licitação, que, ao nosso ver, essa última, seria a opção mais acertada, tendo em vista que no nosso ordenamento jurídico, a regra é licitar.
Conforme leciona Leandro Cadenas Prado (2015, p.13):
Com efeito, deverá o administrador promover uma licitação para obter maior vantagem para administração. Assim só caberá dispensa do processo licitatório para melhor atender ao interesse da coletividade, nunca para facilitar a contratação de determinada empresa. Em suma, nessa primeira faceta, o princípio da impessoalidade rege-se pelo interesse de todos.
O ordenador de despesa deverá pautar sua escolha, baseado no princípio da impessoalidade, objetivando o interesse de todos, “coletividade”. Por exemplo, se o Gestor decide construir, ampliar, reformar ou aprimorar um estabelecimento penal, deverá fazê-lo para beneficiar a sociedade, não porque tem o poder de dispensar a licitação ou da escolha do fornecedor em suas mãos. Caso isso ocorra, teríamos um ato pessoal do gestor, praticado claramente com desvio de finalidade.
Nessa senda, vale ressaltar existência de aspectos negativos na ausência de limitação de prazo de conclusão das construções, ampliações, reformas e aprimoramentos de estabelecimentos penais, uma vez que pelo valor do empreendimento, poderão passar de uma gestão para outra, de um exercício financeiro a outro, em que pese a lei nao estabelecer prazo delimitativo para a conclusão, o princípio da impessoalidade nas contratações sofre risco de ser ferido na escolha que recai ao gestor.
Esse apontamento pode ser vislumbrado na situação de início de contratações de empresas por dispensa de licitação para construção, ampliação, reforma e aprimoramento de estabelecimentos penais quando avizinhar-se término de mandatos eletivos, deixando canteiros de obras com valores astronômicos iniciados em uma gestão, e conclusão e possíveis aditamentos para gestões posteriores.
Essa preocupação decorre de não raros casos de obras públicas que se iniciam, e na sequência são paralisadas ou interrompidas.
Sobre as condutas corruptas na aplicação dos recursos públicos, Santos e Souza (2016, p.17), lecionam que:
Nos últimos anos, crescentes casos de fraudes têm sido noticiados e amplamente divulgados pela imprensa nacional, traduzindo em episódios como “Sanguessugas”, “Mensalão”, “Ararath” e mais recentemente, a “Lava-Jato”, dentre tantos outros escândalos ocorridos na Administração Pública.
No caso especifico da licitação, a fraude causa estragos diretos à entidade responsável pelo certame, mas, indiretamente, a sociedade inteira suporta os prejuízos. A extensão do dano pode ser imensurável.
O cenário público brasileiro não está para brincadeira, caso o gestor faça a opção pela nova hipótese de dispensa de licitação, deverá revestir de legalidade sua decisão e intensificar a gestão e a fiscalização da obra, de forma a evitar desperdícios de recurso público, que atinge diretamente o órgão, de forma que, quem suporta os prejuízos indiretamente, é a sociedade brasileira.
2.3 Da Faculdade de Exigência da Contratação de mão de obra oriunda ou egressa do sistema prisional
A lei 13.500/17, acresceu o parágrafo 5º ao artigo 40 da lei nº 8.666/93, estabelecendo que a Administração Pública poderá reservar em seus editais de licitação percentual mínimo para fomento de mão de obra oriunda ou egressa do sistema prisional, vejamos.
Art.40. Omissis.
§ 5º A Administração Pública poderá, nos editais de licitação para a contratação de serviços, exigir da contratada que um percentual mínimo de sua mão de obra seja oriundo ou egresso do sistema prisional, com a finalidade de ressocialização do reeducando, na forma estabelecida em regulamento. (grifo nosso)
Observa-se, que o legislador com a finalidade de estabelecer política de ressocialização, deixou a cargo do gestor, a discricionariedade de exigir nos editais de licitação o percentual mínimo de mão de obra oriunda ou egressa do sistema prisional.
No entendimento de Rogério Corrêia, temos que:
a regra intenciona estimular a contratação de ex-detentos, como forma de promover sua ressocialização e reinserção ao mercado de trabalho; atribuindo, portanto, uma nova função social à licitação e ao contrato administrativo, como já se passa, por exemplo, com relação à necessidade de observância às regras de acessibilidade, no curso da execução do contrato. Mas trata-se de exigência discricionária do Ente Licitador, uma vez que a norma estabelece que a Administração Pública “poderá” prever tal exigência em seus editais de licitação, na forma que será estabelecida em regulamento. (sic)
Concordamos, parcialmente, com o entendimento do Professor Rogério, em especial quanto a nova função social à licitação e ao contrato administrativo. Contudo, entendemos que sua análise fora restritiva exclusivamente a contratação de “ex-detentos” (sic), ou seja, limitando a referir ao egresso do sistema prisional, sendo que, na nossa ótica, a lei é mais abrangente, tratando também de reeducandos que estão cumprindo pena, tais como dos regimes fechado, semiaberto, e aberto.
Importante salientar, que a LEP prevê em seu art. 36[1], a possibilidade do trabalho externo ao preso em regime fechado, desde que, tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina, e somente nos casos de serviços ou obras públicas, cabendo informar que a previsão não se restringe somente aos órgãos da Administração Direta ou Indireta, mas também as entidades privadas.
Em seu § 1º, o art. 36 da LEP limita o quantitativo máximo de 10% (dez por cento) de presos do total de empregados na obra, que será de responsabilidade da empreiteira. No § 3º, informa que a prestação de trabalho desse regime, quando utilizada pela entidade privada, depende do consentimento expresso do preso, que ao nosso ver, deverá ser comprovada no momento da formalização do contrato com a Administração Pública.
Nessa ótica, já dizia Foucault[2] que “o prisioneiro que pode e quer trabalhar será libertado não tanto pelo fato de ser novamente útil à justiça, mas porque de novo aderiu ao grande pacto da existência humana”.
Acerca da mão-de-obra do regime semiaberto, a Lei de Execuções Penais não estabeleceu limitações quantitativas para mão-de-obra.
Em suma, a reserva de cotas para o fornecimento de mão de obra, abrange não somente aqueles que já cumpriram pena – egressos – mas também, aqueles que estão em fase de cumprimento de sentença – reeducandos.
Nesse diapasão, o texto da Lei é claro em citar o termo “oriundo ou egresso do sistema prisional”. Assim, a literalidade da norma quanto a utilização de pessoas que estão no cumprimento de pena (oriundo) e pessoas que já foram definitivamente liberados do sistema prisional (egressos).
O Legislador não foi claro ao utilizar a palavra “oriundo” no texto, dando margem a dúbia interpretação, visto que já surgiram entendimentos de que “oriundo ou egresso” seriam sinônimos, a exemplo do entendimento dos professores Dawison Barcelos e Rogério Corrêia, que trataram a matéria como sendo somente permissivo a egressos, sendo que esse último utiliza o termo “ex-detentos”, e aquele utiliza o termo “passaram pelo sistema prisional”.
Contudo, respeitosamente, discordamos do entendimento restritivo de ambos, uma vez que o texto legal trata da palavra “oriundo ou egresso”, de forma que, em análise contextual, temos quatro categorias de mão de obra, sendo o reeducando do regime fechado, o reeducando que está no regime semiaberto, o reeducando do regime aberto e a figura do egresso.
Corroborando nosso entendimento, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, já havia emitido a Recomendação nº 29, em 16 de dezembro de 2009, recomendando aos Tribunais a inclusão nos editais de licitação para obras e serviços públicos de “exigência para a proponente vencedora quando da execução do contrato, disponibilizar vagas aos presos, egressos, cumpridores de pena e medidas alternativas e adolescentes em conflito com a lei”, estabelecendo percentuais de vagas proporcional a contratação de trabalhadores.
A Lei de Execução Penal – LEP, conceitua em seus incisos I e II, do art. 26, o que vem a ser considerado egresso do sistema prisional, vejamos.
Art. 26. Considera-se egresso para os efeitos desta Lei:
I - o liberado definitivo, pelo prazo de 1 (um) ano a contar da saída do estabelecimento;
II - o liberado condicional, durante o período de prova.
Dessa forma, ao tratarmos de egresso, temos duas possibilidades positivadas no art. 26, a primeira que seria a do Inc. I, que trata da pessoa egressa pelo período de 1 (um) ano de sua liberação do sistema prisional, realizada a contagem desse período a partir de sua liberação definitiva. A segunda, disciplinada no Inc. II, que seria o liberado condicionalmente no período de coleta de provas.
Acerca da matéria em comento, anterior a publicação da Lei federal nº. 13.500/17, o Governo do Estado de Rondônia, em 23 de julho de 2009, já havia publicado no Diário Oficial do Estado – DOE nº 1293, datado de 27 de julho de 2009, a Lei nº 2134/09, que dispôs sobre “a reserva de vagas para apenados no regime semiaberto e egressos do sistema penitenciário nas contratações para prestação de serviços com fornecimento de mão-de-obra à Administração Pública do Estado de Rondônia”.
Assim, temos que o Governo do Estado de Rondônia, legislou 8 (oito) anos antes da publicação da Lei federal nº. 13.500/17, de forma que o dispositivo estadual já previa reserva de vagas para os reeducandos no regime semiaberto e egressos do sistema penitenciário de Rondônia, conforme dispositivo abaixo:
Art. 1º. Nas licitações promovidas por órgãos e entidades da Administração Pública do Estado de Rondônia, para contração de prestação de serviços que prevejam o fornecimento de mão-de-obra, constará obrigatoriamente cláusula que assegure reserva de vagas para apenados em regime semi-aberto e egresso do sistema penitenciário, excluindo do disposto nesta Lei os serviços de segurança.
Nota-se a preocupação do legislador estadual em estabelecer a abrangência da Lei aos órgãos e entidades da Administração Pública do Estado de Rondônia, o objeto, sendo a contração de prestação de serviços que prevejam o fornecimento de mão-de-obra, a caracterização do beneficiário: reeducandos em regime semiaberto e egresso do sistema penitenciário, e a exceção da aplicação aos serviços de segurança.
A Lei estadual exclui a sua aplicabilidade somente aos serviços voltados à segurança, de forma que, não resta dúvida o entendimento de obrigatoriedade imposta a todos os demais casos de prestação de serviços que prevejam o fornecimento de mão-de-obra, tais como reforma, construção, ampliação, melhoramento, serviços de conservação e limpeza, e outros correlatos.
Em seu parágrafo único, a Lei estadual estabeleceu o percentual mínimo (cota) de aplicação de 2% (dois por cento) a quantidade de vagas reservadas para apenados em regime semiaberto e egressos do sistema penitenciário do Estado de Rondônia.
Arremata ainda, em seu art. 2º, que os ditames da Lei serão obrigatoriamente observados quando da renovação de contratos de prestação de serviços com fornecimento de mão-de-obra para a Administração Pública do Estado de Rondônia.
2.4 Contextualização da Segurança Pública Brasileira
O sistema prisional Brasileiro é um tema alvo de grandes discussões na sociedade contemporânea, devido à crise atual. A Lei de Execuções Penais brasileira, em que pese ser uma das mais completas no mundo, infelizmente não é devidamente executada em sua integralidade.
A execução da LEP está sendo limitada apenas como meio de cárcere ao indivíduo, sendo que o não cumprimento da inteligência da Lei, ou seja, o descumprimento dos dispositivos de triagem[3], acomodação conforme tipo de crime, ensejam em um meio de castigar o apenado para ser depositado em cárcere, de forma que, temos, ao invés de ressocialização no cumprimento da pena, apenas o aglutinamento de presos no sistema carcerário.
No Brasil, atualmente a prisão não cumpre sua função social de ressocialização, servindo apenas como instrumento de manutenção da estrutura social de dominação.
A assistência ao oriundo e ao egresso do sistema carcerário brasileiro, é papel do Estado, que através da LEP, deve garantir orientação e apoio para reintegração do indivíduo a vida em sociedade. Temos então, que é papel do Estado desenvolver políticas públicas garantidoras do cumprimento do papel de ressocialização, como as medidas adotadas que alteraram a Lei 8.666/93, em especial no que tange a reserva de cotas para mão de obra oriunda e egressa do sistema carcerário brasileiro.
O art. 1º da LEP, trouxe com objetivos basilares, a efetivação dos mandamentos contidos na sentença penal ou outra decisão criminal, destinadas a reprimir e prevenir os delitos, bem como, propiciar aos apenados e egressos condições para reintegração social, oferecendo meios para participação construtiva na comunhão social. O que vem de encontro com parágrafo 5º do artigo 40, da lei nº 8.666/93, quando o legislador trata da cotização de vagas para mão de obra oriunda ou egressa.
O Brasil vivencia atualmente uma grande falha no sistema prisional, que por vezes, torna-se impossível a aplicabilidade efetiva.
Tornando a realidade no interior dos presídios verdadeiro campos de guerra, dominados por facções criminosas que controlam, por vezes, o comando do presídio devido a estrutura estatal arcaica e precária, fatos que somados a superlotações originam rebeliões, fatos que já caracterizariam a hipótese contemplada no art. 24, XXXV da LLC nº 8.666/93, configurando “grave e iminente risco à segurança pública”.
Sempre atual, Michel Foucault em sua obra Vigiar e Punir, sabiamente prevê o futuro dos apenados, ao escrever “o essencial da pena que nós, juízes, infligimos não creiais que consista em punir; o essencial é procurar corrigir, reeducar, “curar”; uma técnica de aperfeiçoamento recalca, na pena, a estrita expiação do mal, e liberta os magistrados do vil ofício de castigadores”.