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Do redirecionamento da execução fiscal nos termos do artigo 135 do CTN e a jurisprudência do STJ e STF

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05/09/2012 às 10:42
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4.Da Decisão do STF no julgamento do RE nº. 608.426/PR

Como visto a jurisprudência do E. STJ tem funcionado como combustível à sanha arrecadatória do Fisco, pois quando o Estado não consegue cobrar as dívidas fiscais em face das empresas, redirecionam arbitrariamente as cobranças as pessoas ligadas às empresas com o peculiar agravante de que, em já constando os seus nomes das respectivas certidões de dívida ativa das cobranças executivas, passam a deter a totalidade do intricado ônus probatório quanto ao não cometimento (prova negativa) de qualquer ato pessoal ilícito e doloso, nos termos daquele dispositivo legal, com suporte no que vem sendo decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme REsp nº 1.104.900, EDREsp nº 960.456 e outros julgados relatados anteriormente.

Agindo assim, o Fisco e Tribunal Superior deixam de aplicar os princípios do contraditório e da ampla defesa que são garantias constitucionalmente asseguradas aos cidadãos.

Inobstante a esse árido e espinhoso cenário que é apresentado aos empresários pelas jurisprudências encampadas pelo Superior Tribunal de Justiça, recentemente houve importante reviravolta na matéria, principalmente em favor dos administradores e gerentes de empresas, cuja situação fora enfrentada, agora, a luz dos princípios basilares de nossa Carta Constitucional.

Essa reviravolta se deve ao julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Ag. Reg. no Recurso Extraordinário nº. 608.426/PR, cuja relatoria coube ao Ministro Joaquim Barbosa, membro da 2º Turma do STF e que foi disponibilizada em 04 de outubro de 2011.

Com efeito, o acórdão em pauta houve por bem deixar expressamente consignado que “os princípios do contraditório e da ampla defesa aplicam-se plenamente à constituição do crédito tributário em detrimento de qualquer categoria de sujeito passivo (contribuintes, responsáveis, substitutos, devedores solidários etc.)”.

Vale dizer, segundo proclamado pelo Tribunal guardião máximo da Constituição Federal brasileira, qualquer intenção atinente ao redirecionamento de dívida fiscal às pessoas dos mencionados administradores, com base naquele artigo 135, III do Código Tributário Nacional, haveria de trafegar em meio à defesa ampla e ao contraditório – conforme previsto no artigo 5º, LV da Constituição Federal – sendo indispensável a prévia existência de um processo administrativo fiscal no qual o sócio, gerente ou administrador figurem no pólo passivo, para que o Fisco comprove através de todas as provas admitidas em direito uma eventual e inequívoca ocorrência material dos requisitos delineados no artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional.

Somente dessa forma, portanto, estaríamos diante da possibilidade de um efetivo controle administrativo de legalidade da cobrança, inerente ao ato de inscrição das certidões de dívida ativa, para que seja possível justificar a presunção de liquidez e certeza que as mesmas possuem sob a ótica dos artigos 2º, § 3º, e 3º da Lei nº 6.830/80 e do artigo 204 do Código Tributário Nacional.

Dito de outra forma, a presunção de liquidez e de certeza, inerente à certidão de dívida ativa, também para os administradores, diretores e gerentes das empresas, há de pressupor, sempre e sem qualquer exceção, a ocorrência de um prévio e efetivo controle administrativo de legalidade, para alcançar o momento anterior ao próprio ato de inscrição em dívida ativa.

Outro ponto indispensável na análise das questões posta até aqui, cinge-se no fato de que os créditos tributários declarados pelo contribuinte – pessoa jurídica – foram definitivamente constituídos em relação ao próprio declarante e não aos seus funcionários. Assim, para que o Fisco possa ingressar com um processo de execução fiscal contra o sócio, administrador ou gerente, é necessário que haja constituição do crédito tributário em relação a estes, fato que só será possível mediante ato de lançamento que é privativo da Autoridade Administrativa.

Assim, a Administração deverá efetuar o lançamento em relação aos terceiros que pretende imputar a responsabilidade tributária por substituição, prevista no artigo 135 do Código Tributário Nacional, para constituir o crédito tributário em relação a estes e para que, através do regular processo administrativo com todos seus direitos e garantias, fique provado se houve ou não excesso de poderes ou afronta ao estatuto social por parte dos terceiros.

Com base nessa recente jurisprudência proferida pelo Supremo Tribunal Federal, aos administradores, gerentes, sócios e diretores, é garantia constitucional que seja assegurado o contraditório e a ampla defesa em sede de processo administrativo fiscal para se apurar a ocorrência dos requisitos previstos no art. 135 do CTN aptos a responsabilizar as pessoas acima mencionadas, antes de qualquer ato de inscrição do nome do suposto responsável em dívida ativa, pois, assim, haverá verdadeiro respeito aos princípios constitucionais supracitados, bem como uma homenagem à própria segurança jurídica.


5.Conclusões

Diante de todo o exposto, concluímos que:

i) a presunção de legitimidade da CDA é eficaz contra o contribuinte que realiza a declaração tributária (pessoa jurídica) constituindo o crédito tributário, sendo desnecessária a formação de processo administrativo em tais casos se verificado a falta de pagamento do tributo. Consequentemente, é ônus do contribuinte (pessoa jurídica) desconstituir esta presunção, o qual pode fazê-lo pela via da exceção de pré-executividade (matérias de ordem pública e sem dilação probatória) ou pela via dos embargos à execução (após garantia da dívida);

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ii) haverá presunção de legitimidade da CDA quanto a terceiro, caso o Fisco fundamente no título a existência de processo administrativo prévio no qual se apurou a responsabilidade desse terceiro (sócios, gerente, administrador, etc);

iii) inexistirá a presunção de legitimidade da CDA quanto a terceiro, quando não houver prévio processo administrativo tributário para constituir o crédito tributário contra as pessoas elencadas no artigo 135 do Código Tributário Nacional. Se o Fisco pretender imputar a responsabilidade pelo pagamento do tributo devido por uma empresa para sócio, gerente ou administrador é obrigatório e assegurado constitucionalmente, que o Fisco efetue o lançamento de ofício contra o terceiro, com fulcro no art. 149 do CTN, para constituir o débito em relação a este, pois é no âmbito administrativo que deverá ser apurado se o terceiro agiu com excesso de poderes ou de forma contrário ao disposto no estatuto social, com todos os direitos e garantias assegurados ao processo administrativo pela Constituição Federal.

Por fim, esse lançamento de ofício deverá ser efetuado de acordo com o prazo decadencial previsto no art. 173, I do Código Tributário Nacional.


Notas

[1] Teodoro Junior, Humberto. Lei de Execução Fiscal: Comentários e Jurisprudência, 8ª ed., São Paulo, Saraiva, 2002, pag. 28

[2] Fabiana Del Padre Tomé, em seu livro A Prova no Direito Tributário, discorre acerca da verdade material da seguinte forma:

“A denominada verdade material refere-se a enunciados cujos termos correspoderiam aos fenômenos experimentais. Funda-se na aceitação da teoria da verdade por correspondência, pressupondo a possibilidade de espelhar a realidade por meio da linguagem. O mundo da experiência, todavia, não pode ser ser integralmente descrito. O real é infinito e irrepetível, possuindo, cada objeto, um número ilimitado de determinações. Por isso, o sujeito cognoscente tem sempre percepções parciais do mundo.”

[3] Machado, Hugo de Britto. Responsabilidade de Sócios e Dirigentes de Pessoas Jurídicas e Redirecionamento da Execução Fiscal. Ed. Dialética, 2000, pag. 142/143

[4] STJ. REsp 1.101.728/SP. Primeira Seção, Ministro Relator Teori Albino Zavascki. DJe 23/03/2009.

[5] Súmula 435 STJ: Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.

[6] EAg nº. 1.105.993/RJ

[7] Agr no Agr no Ag 1.371.752/SP

[8] STJ. REsp nº. 962.379/RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 22.10.2008, DJe 8.10.2008

[9] Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:

I - quando a lei assim o determine;

II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;

III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;

IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;

V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;

 VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;

VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;

VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;

IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.

Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.

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Sobre o autor
Pedro Henrique Leite Vieira

Pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET (conclusão em 2012) Especialista em Direito Processual Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET (concluído em 2010) Advogado

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEIRA, Pedro Henrique Leite. Do redirecionamento da execução fiscal nos termos do artigo 135 do CTN e a jurisprudência do STJ e STF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3353, 5 set. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22560. Acesso em: 25 abr. 2024.

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