Atualmente, é possível verificar, no Judiciário, a multiplicação de ações em face de construtoras. Afinal, a reiteração de práticas abusivas por essas empresas vem, cada vez mais, causando graves prejuízos de ordem financeira e moral para consumidores que adquirem imóveis na planta sob o regime de incorporação imobiliária.
Entre essas práticas abusivas, pode-se citar a cobrança de diversas taxas, como taxa de corretagem, taxa de serviço de assessoria técnica imobiliária (a “taxa SATI”) e taxa de anuência de cessão de direitos. A taxa de corretagem nada mais é do que o repasse, para o consumidor, de todas as despesas atinentes à contratação de “corretores de plantão” que permanecem em stands de venda ou similares. A taxa SATI é um valor cobrado do consumidor a fim de custear os honorários de advogados da construtora pela elaboração de contratos de compra e venda e outros serviços relacionados ao negócio. A taxa de anuência de cessão de direitos é um montante exigido do consumidor para que a construtora concorde com a transferência dos direitos e obrigações do contrato de compra e venda do imóvel para outra pessoa. Há vasto entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo e do Superior Tribunal de Justiça de que a cobrança dessas taxas sem previsão contratual é abusiva e, portanto, nula. E, mesmo que existam disposições contratuais expressas que obriguem o consumidor a arcar com essas taxas, a maioria das decisões judiciais é no sentido de considerar ilícitas cláusulas que determinem sua cobrança. Afinal, por estarem vinculados às construtoras por contratos de adesão, os consumidores não possuem real liberdade para decidir sobre que serviços pretendem contratar ou se, de fato, concordam em pagar valores para obter consentimento da construtora caso desejem transferir os direitos e deveres do seu contrato para outro indivíduo. Sendo assim, é perfeitamente possível que o consumidor pleiteie, judicialmente, a devolução dos valores que pagou indevidamente. Configurado o abuso, a devolução deve ser realizada em dobro, conforme determina o Código de Defesa do Consumidor.
Também têm sido constantes os atrasos na entrega de obras. Infelizmente, o Poder Judiciário tem entendido serem válidas cláusulas que estipulem prazo de 180 dias de tolerância de atraso para entrega da obra. Todavia, superado esse prazo, não têm sido raras condenações de construtoras ao pagamento de multa ou indenização por lucros cessantes (aquilo que o consumidor deixou de ganhar por conta do atraso) e emergentes (aquilo que o consumidor perdeu por conta do atraso). No que se refere à multa, dificilmente, há previsão contratual de sua aplicação para a construtora em caso de descumprimento de cláusulas do contrato. No entanto, a Justiça tem entendido que essa falta de previsão acarreta desequilíbrio na relação negocial e, por isso, costuma aplicar, às construtoras, multas por equidade. Isto é, a mesma multa que incidiria para o consumidor, caso este descumprisse o contrato, passa a incidir, da mesma forma, para a construtora. Em relação à condenação ao pagamento de indenização por lucros cessantes, o Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento segundo o qual, mesmo que não haja prova de que o imóvel seria destinado à locação, o valor da indenização deve corresponder ao valor que seria auferido se o imóvel estivesse locado durante o período de atraso. E, também de acordo com o Superior Tribunal de Justiça, o montante de indenização a título de lucros cessantes deve corresponder a 0,6% mensais do valor do imóvel. No que se refere aos danos emergentes, caso sejam provados no processo, o consumidor também deverá ser ressarcido.
Outra prática abusiva corriqueira tem sido a cobrança de taxa de condomínio antes da entrega das chaves do apartamento. Essa conduta, por parte das construtoras, é pacificamente considerada ilegal pelo Poder Judiciário. A Justiça considera devida a cobrança de taxa condominial somente quando o consumidor passar a deter, efetivamente, a posse do apartamento. Caso o consumidor tenha realizado o pagamento desses valores, é admissível exigir, judicialmente, a devolução dos valores dispendidos em dobro.
Também é importante que o consumidor fique atento, em caso de pagamento parcelado do imóvel, ao índice de correção monetário utilizado. É legítimo que a construtora estabeleça, em contrato, a atualização do valor pelo Índice Nacional de Custo da Construção (o “INCC”). Porém, caso haja atraso na entrega do imóvel, a Justiça tem entendido que é abusiva a continuidade da atualização por esse índice, devendo passar a ser utilizado, a partir do primeiro dia de atraso, o Índice Geral de Preços – Mercado (o “IGP-M”), que é mais vantajoso para o consumidor.
É relevante, ainda, que os consumidores estejam alerta em relação à imposição de pagamento de juros compensatórios (os chamados “juros no pé”). Os Tribunais entendem que cláusulas contratuais que determinem o pagamento desses juros são válidas. Entretanto, caso não estejam previstas em contrato ou caso estejam redigidas de maneira pouco clara, considera-se que há abuso e, sendo assim, a cobrança dos juros passa a ser indevida.
Enfim, grande parte dos consumidores sucumbem a estes tipos de cobrança sem, ao menos, saberem que estão sofrendo graves abusos. Por isso, é muito importante que, antes de celebrar contratos de compra e venda de imóveis na planta, o consumidor submeta-os a análise de um advogado especializado de sua confiança. Dessa maneira, é possível evitar prejuízos financeiros, estresse e longas demandas judiciais destinadas a reaver os montantes pagos indevidamente.