Uma compradora de unidade residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Multy Home Mooca, localizado na Rua Andrade Reis, nº 26, no bairro da Mooca zona leste de São Paulo, perante a incorporadora ECON (o nome da SPE era: Projeto Imobiliário E 24 SPE Ltda.), obteve vitória na Justiça paulista com a declaração de quebra do “Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato da própria adquirente, que já não mais suportava arcar com o pagamento das parcelas, obtendo a devolução à vista de 90% sobre os valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária desde o pagamento das parcelas + juros de 1% ao mês a partir da citação até a efetiva devolução.
A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em abril de 2015, quando então a pretensa compradora assinou o contrato perante a incorporadora. Após cerca de 2 anos pagando as parcelas, decidiu por não mais seguir com o contrato e procurou a vendedora para obter a devolução dos valores pagos.
Porém, a incorporadora informou que devolveria o equivalente a 70% (setenta por cento) dos valores pagos em contrato. Inconformada com a resposta obtida perante a vendedora, a compradora procurou o Poder Judiciário.
O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Central de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato da adquirente, bem como a condenação da incorporadora na restituição de parte considerável dos valores pagos.
O Juiz de Direito da 10ª Vara Cível, Dr. Alexandre Bucci, em sentença datada de 18 de março de 2018, JULGOU PROCEDENTE a ação para rescindir o Contrato por ato da compradora e condenou a incorporadora na restituição à vista de 90% (noventa por cento) dos valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária desde a data do pagamento de cada uma das parcelas + juros de 1% ao mês a partir da citação até a efetiva devolução.
O Juiz fundamentou sua decisão no sentido de que o comprador de imóvel na planta pode procurar a Justiça para solicitar a rescisão do contrato, sendo aplicado as penalidades previstas em contrato, desde que não se afigurem abusivas nos termos do Código de Defesa do Consumidor e com base no entendimento jurisprudencial dominante sobre a matéria.
Nas palavras do magistrado:
- “Em se tratando de relação de consumo, a lide comporta solução pautada nas regras (de ordem pública) advindas da disciplina legalizada pelo Código de Defesa do Consumidor.
- Neste contexto, ainda que seja a autora responsável pelo desfazimento do negócio, por conta da desistência manifestada, fato é que em se tratando de relação submetida à proteção do Código de Defesa do Consumidor, da desistência em si mesma, não havia impeditivo para o pleito de rompimento contratual.
- Impossível, sob outro prisma, convalidar as previsões contidas nas disposições contratuais defendidas pela requerida, fazendo-se aqui, referência, em especial, ao teor da cláusula VIII do capítulo 7º. do Instrumento.
- Anote-se que sob as luzes da tutela consumerista, cláusulas contratuais que deixam o consumidor em situação de desvantagem exagerada são nulas de pleno direito, sendo esta a situação da previsão acima mencionada e defendida pela requerida.
- Isso porque, os artigos 51, incisos II e IV, e 53, caput, da Lei no. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) permitem ao assim denominado compromissário-comprador postular o desfazimento do ajuste e a devolução do que já foi pago, afastando-se previsões que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade, sendo esta a situação verificada no caso concreto.
- Afinal, a extinção do contrato permitirá à vendedora novamente (re)negociar o imóvel no mercado imobiliário.
- Se o imóvel, uma vez de volta à disponibilidade da vendedora há de ser (re)negociado gerando, para esta, novos dividendos, constituiria enriquecimento sem causa convalidar o regime de rescisão gravoso e que impõe exagerada desvantagem à adquirente aqui desistente.
- Inadmissível o abatimento de diversos encargos e tributos, com restituição de apenas 70% dos valores pagos em paralelo à vantagem decorrente da nova alienação da unidade imobiliária.
- Impossível, porém, dar guarida à cláusula referida, correspondentes as exigências da requerida a uma substancial retenção de valores pagos, isto, repita-se, depois de abatidas cumulativas sanções, além de outras taxas e encargos secundários. Tais imposições, com o devido respeito, se mostram típicas de prática contratual eivada de abusividade com a qual não se pode compactuar.
- Raciocinar em sentido contrário seria convalidar um distrato quase que forçado, que, de forma nítida, afrontava à regra cogente do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor, porquanto se estaria a autorizar, aqui, uma substancial perda das parcelas pagas pela adquirente.
- Em termos práticos, a prevalecer a tese de defesa contratual da requerida deixar-se-ia a autora uma situação de desvantagem exagerada, mesmo na hipótese de culpa da adquirente pelo desfazimento do negócio.
- Imperioso, sim, resolver-se o contrato de compromisso de compra e venda em questão, de maneira a repor as partes, na medida do possível, no estado em que se encontravam antes da realização do negócio.
- Reconhece-se, pois, que a autora faz jus à devolução das parcelas pagas, mas, reservando-se à requerida o direito a descontar percentual suficiente para pagamento de despesas administrativas, dentre as quais aquelas havidas com administração e publicidade, conforme entendimento jurisprudencial já consolidado na Súmula 01 do Tribunal de Justiça de São Paulo.
- Razoável que a vendedora, ora requerida, (e que não deu causa à rescisão do contrato) retenha tão somente o percentual de 10% dos valores efetivamente recebidos, garantindo-se, em consequência, em favor da adquirente, ainda que desistente imotivada, a restituição do percentual de 90% dos valores pagos, com o que se acolhe o regime de restituição de valores defendido pela autora.
- Com efeito, reafirma-se aqui o direito de retenção do patamar de 10% dos valores pagos é tido como suficiente e adequado para o ressarcimento global de possíveis perdas e danos e reembolso de todas as despesas administrativas, diretas ou indiretas, ainda que envolvendo terceiros, parceiros da requerida, não se admitindo descontos outros, cumulados ou prevendo sanções diversas e progressivas.
- Os valores passíveis de restituição em favor da autora devem contar com a incidência de atualização monetária oficial, nos termos previstos na Tabela Prática do TJSP, desde os respectivos desembolsos.
- Os valores passíveis de restituição em favor da autora devem também contar com a incidência de juros moratórios, em patamar de 1% ao mês, estes, computados desde a citação da requerida para os termos da presente Ação, incidindo, ambos, atualização monetária e juros de mora, até o efetivo pagamento.
- Em matéria de termos iniciais de atualização monetária e juros de mora, registre-se que a atualização monetária nada acresce à obrigação, imperioso, destarte, o cômputo desde os respectivos desembolsos dos valores pagos.
- Já em matéria de juros de mora, parece evidente que a citação válida torna litigiosa a coisa controversa, devidos, pois, pela requerida, os juros de mora, conforme indicação feita nas linhas antecedentes, desde a data de citação para os termos da presente Ação, desprezando-se outros marcos iniciais de incidência que não são vinculantes para o Juízo, inclusive, no âmbito do STJ, marcos estes que, com o devido respeito, se mostram incorretos por desprezarem os efeitos da citação válida.
- Do exposto, com base na previsão do artigo 487, inciso I, do Novo Código de Processo Civil/2015, julgo procedentes os pedidos formulados nesta Ação de Rescisão Contratual em face de Projeto Imobiliário E 24 SPE Ltda., o que se dá para os fins a seguir explicitados:
- I. Declaro rescindido o contrato firmado entre as partes, por desistência da autora, liberando-se, de imediato, a unidade imobiliária em questão nos autos para eventual nova comercialização por parte da requerida.
- II. Condeno a empresa requerida a restituir em favor da autora o percentual de 90% dos valores pagos (a título de preço do imóvel e parcelas contratuais) por força do contrato imobiliário ora desfeito, vedados quaisquer outros descontos.
- Os valores passíveis de restituição em favor da autora devem contar com a incidência de atualização monetária oficial, nos termos previstos na Tabela Prática do TJSP, desde os respectivos desembolsos.
- Os valores passíveis de restituição em favor da autora devem também contar com a incidência de juros moratórios, em patamar de 1% ao mês, estes, computados desde a citação da requerida para os termos da presente Ação, incidindo, ambos, atualização monetária e juros de mora, até o efetivo pagamento.”
Processo nº 1124451-81.2017.8.26.0100
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
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* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.