Um casal de adquirentes de unidade residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Edifício Pateo Barra Funda, localizado na Rua Norma Pieruccini Giannotti, nº 141, no bairro da Barra Funda, zona oeste da Cidade de São Paulo, perante a incorporadora Yuny (o nome da SPE era: Marques de São Vicente Empreendimentos Ltda.), obteve vitória perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, através da manutenção da sentença de primeira instância que havia decretado a rescisão do “Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato dos compradores que já não mais suportavam arcar com o pagamento das parcelas, determinando à incorporadora a devolução à vista de 80% sobre os valores pagos em Contrato + 100% da taxa denominada SATI, acrescidos de correção monetária desde o pagamento de cada parcela (correção monetária retroativa) e com juros legais de 1% (um por cento) a.m. a partir da data da citação até o momento da efetiva restituição dos valores.
A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em novembro de 2012, quando então os compradores assinaram o contrato perante a incorporadora.
Passados cerca de 3 anos da data da compra, se viram impossibilitados de continuar a arcar com o pagamento das parcelas finais e procuraram pela incorporadora, a fim de obter o distrato amigável do negócio. Porém, a incorporadora afirmou que restituiria o equivalente a 60% (sessenta por cento) dos valores pagos em Contrato, sem nenhuma correção monetária e de forma parcelada.
Inconformados com a resposta obtida perante a vendedora, os compradores procuraram o Poder Judiciário.
O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Central de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato dos compradores, bem como a condenação da incorporadora na restituição de grande parte dos valores pagos.
O Juiz de Direito da 27ª Vara Cível, Dr. Rogério Marrone de Castro Sampaio, em decisão datada de 30 de setembro de 2016, afirmou que reconhecia a existência de cláusula contratual padronizada e abusiva por parte da incorporadora, estipulando retenção complexa, através de descontos sucessivos e escalonados perante o consumidor, motivo pelo qual condenou-a na restituição do equivalente a 80% dos valores pagos em Contrato, além de 100% do valor pago a título de taxa denominada SATI, à vista, acrescido de correção monetária retroativa e com juros de 1% ao mês a partir da citação até a efetiva restituição dos valores pagos.
Inconformada com a sentença proferida na primeira instância, a incorporadora decidiu seguir com o processo mediante recurso de apelação interposto perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Recurso processado e devidamente distribuído perante a 9ª Câmara de Direito Privado, tendo como Relator o Desembargador Galdino Toledo Júnior, acompanhado dos Desembargadores Costa Netto e José Aparício Coelho Prado Neto, para analisar se o Juiz de Direito na primeira instância agiu corretamente ou não ao condenar a incorporadora na restituição de grande parte dos valores pagos em contrato.
Por votação unânime datada de 10 de abril de 2018, os Desembargadores entenderam por bem manter a sentença de primeira instância, para o fim de permitir que a incorporadora retivesse o equivalente a 20% (vinte por cento) dos valores pagos em contrato, devendo restituir o correspondente a 80% (oitenta por cento), além de 100% (cem por cento) da taxa SATI ilegalmente exigida do comprador.
Para o Desembargador Relator, a conduta desenvolvida pela incorporadora era nitidamente abusiva, revelando nada menos do que desvantagem exagerada para o consumidor, sendo, portanto, obrigada a restituir grande parte dos valores pagos.
Nas palavras do Desembargador:
- “Pelo teor do recurso intentado, não se insurge a alienante contra a parte do decisum que acolheu o pedido de rescisão contratual formulado pelos compradores, por simples conveniência destes, apenas se contrapondo com a fixação do percentual de 20% a título de retenção sobre os valores pagos, como forma de ressarcimento de seus custos administrativos, bem como contra a inclusão da taxa SATI no capital.
- Aduz, para tanto, que a cláusula 6.8 do compromisso de venda e compra prevê a restituição de 70% dos valores adimplidos, deduzidos, entre outros valores, os juros compensatórios, se tiverem sido cobrados, e os moratórios e de mora, pagos quando de eventual purga de mora (fls. 33/81).
- Sendo o pacto assinado livre e espontaneamente pelos compradores, alega que não lhes assiste o direito de pleitear em juízo a devolução de maior valor, até mesmo porque não teria sido requerida a declaração de nulidade da cláusula em comento.
- Sustentam, ainda, que a cobrança da taxa SATI é legal, uma vez que os apelados foram informados sobre a sua cobrança e optaram livremente pela contratação dos serviços por ela abrangidos, não podendo, agora, buscar o ressarcimento.
- Respeitado o esforço do patrono da alienante, não é possível reformar a sentença.
- Sobre a relação jurídica firmada entre as partes incide o Código de Defesa do Consumidor, de modo que, ainda que não tenha sido alegada pelos adquirentes, é possível que o juiz declare, de ofício, a nulidade da cláusula 6.8 do compromisso por considerá-la abusiva, bem como por colocar o consumidor em desvantagem exagerada (artigo 51, inciso IV).
- No caso, referida disposição garante à alienante o direito de descontar, entre outros encargos, os juros compensatórios, se tiverem sido cobrados, e os moratórios e de mora, pagos quando de eventual purga de mora, e, do restante, restituir apenas 70% (fls. 33/81).
- Isso significa que, na verdade, será devolvido aos compradores valor muito menor do que o efetivamente pago, situação que evidencia a abusividade da previsão contratual.
- Consequentemente, afastada a disposição, cabia à vendedora demonstrar que o percentual de 20% sobre os valores já pagos seria insuficiente para cobrir seus prejuízos, como alegado nas razões de apelação (fls. 356/358).
- Contudo, limitou-se a afirmar que esse percentual é incompatível com a atual situação econômica, sem elencar, especificamente no caso em exame, os encargos suportados e que, em tese, deveriam ser compensados com a retenção definida pelo juízo a quo.
- Nessas condições, inexistem motivos que autorizem o reconhecimento da insuficiência do percentual de 20% previsto no julgado, com a alteração deste para montante superior, já que, repita-se, inexistem justificativas para tanto.
- Tampouco deve ser acolhido o pleito pela legalidade da taxa SATI, até mesmo porque o C. Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp nº 1.599.511/SP pelo rito do recurso repetitivo, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, em 24/08/2016, DJe 06/09/2016, fixou a seguinte tese: “I - TESE PARA OS FINS DO ART. 1.040 DO CPC/2015: 1.2. Abusividade da cobrança pelo promitente- vendedor do serviço de assessoria técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere, vinculado à celebração de promessa de compra e venda de imóvel”.
- No caso específico dos autos, inegável que aos compradores foi previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da taxa SATI, o que, em tese, cumpre com o dever de informação atribuído ao vendedor, como por eles defendido.
- No entanto, note-se que o C. Superior Tribunal de Justiça não impôs qualquer condição para definição da validade de sua cobrança, declarando-a sempre abusiva, pelo que seu valor deverá ser restituído aos adquirentes.
- Quanto à atualização monetária, igualmente irreparável a sentença, que previu a sua incidência a partir dos respectivos desembolsos, pois aplicável a Súmula 43 do C. Superior Tribunal de Justiça: “Incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo”.
- Ante o exposto, meu voto nega provimento ao recurso.”
Ao final, por votação unânime, os Desembargadores da 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negaram provimento ao recurso de apelação interposto pela incorporadora e mantiveram a condenação em primeira instância na devolução à vista de 80% (oitenta por cento) dos valores pagos em contrato, além de 100% (cem por cento) da taxa SATI, à vista, acrescidos de correção monetária e com juros de 1% a.m. a partir da citação até o momento da efetiva devolução.
Processo nº 1114932-53.2015.8.26.0100
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
Gostou do artigo? Veja a íntegra da decisão judicial em:
http://mercadanteadvocacia.com/decisao/rescisaodistrato-do-contrato-por-ato-do-comprador/
* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.