Uma compradora de unidade residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Edifício You, Tucuruvi, localizado na zona norte de São Paulo, perante a incorporadora YOU (o nome da SPE era: Open You Empreendimento Imobiliário Ltda.), obteve vitória na Justiça paulista com a declaração de quebra do “Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato da própria adquirente, que já não mais suportava arcar com o pagamento das parcelas, obtendo a devolução à vista de 90% sobre os valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária desde o pagamento das parcelas + juros de 1% ao mês a partir da citação até a efetiva devolução.
A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em maio de 2014, quando então a pretensa compradora assinou o contrato perante a incorporadora. Após cerca de 2 anos pagando as parcelas, decidiu por não mais seguir com o contrato e procurou a vendedora para obter a devolução dos valores pagos.
Porém, a incorporadora informou que devolveria o equivalente a 20% (vinte por cento) dos valores pagos em contrato. Inconformada com a resposta obtida perante a vendedora, a compradora procurou o Poder Judiciário.
O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Central de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato da adquirente, bem como a condenação da incorporadora na restituição de parte considerável dos valores pagos.
O Juiz de Direito da 10ª Vara Cível, Dr. Alexandre Bucci, em sentença datada de 06 de julho de 2017, JULGOU PROCEDENTE a ação para rescindir o Contrato por ato da compradora e condenou a incorporadora na restituição à vista de 90% (noventa por cento) dos valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária desde a data do pagamento de cada uma das parcelas + juros de 1% ao mês a partir da citação até a efetiva devolução.
O Juiz fundamentou sua decisão no sentido de que o comprador de imóvel na planta pode procurar a Justiça para solicitar a rescisão do contrato, sendo aplicado as penalidades previstas em contrato, desde que não se afigurem abusivas nos termos do Código de Defesa do Consumidor e com base no entendimento jurisprudencial dominante sobre a matéria.
Nas palavras do magistrado:
- “Em matéria de rompimento contratual é pacífico o entendimento de que o consumidor inadimplente ou simplesmente desistente, tal como a autora, tem o direito de pleitear a rescisão do compromisso de compra e venda do imóvel. Demais disso, em se tratando de relação de consumo, a lide comporta solução pautada nas regras (de ordem pública) advindas da disciplina legal gizada pelo Código de Defesa do Consumidor.
- Anote-se, pois, que sob estas luzes, trazidas pela orientação da Lei no. 8078/90, cláusulas contratuais que deixam o consumidor em situação de desvantagem exagerada são nulas de pleno direito, sendo esta a situação da cláusula defendida pela requerida, em especial, destaque-se a cláusula VIII - capítulo 7 do contrato, que resultaria na restituição de no mínimo, 20% do valor pago, de forma parcelada, sem falar na incidência de outros inúmeros descontos e sanções contratuais.
- Impossível, porém, convalidar tais previsões contratuais manifestamente abusivas.
- Vê-se, neste contexto, que o percentual estabelecido no contrato em foco, segundo a cláusula referida, corresponde a uma substancial retenção de valores pagos, isto, depois de abatidas cumulativas sanções (multa) além de outras taxas e encargos secundários, o que, com o devido respeito, repete-se, novamente, se mostra previsão eivada de abusividade com a qual não se pode compactuar.
- Raciocinar em sentido contrário seria convalidar um distrato quase que forçado e manifestamente lesivo, afrontoso, ainda que por vias transversas, à regra do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor.
- Assim se afirma, porquanto as condições impostas pela requerida autorizavam substancial perda das parcelas pagas pela adquirente, ao passo que, os descontos e a forma de restituição de valores estabelecidos de maneira unilateral terminavam, ainda, por trazer benefício exclusivo apenas para a vendedora do imóvel.
- Em termos práticos a requerida relegava a autora a uma situação de desvantagem exagerada, tratando-se aqui, de disposições iníquas e, portanto, nulas (artigo 51, II e IV, CDC), caindo por terra os argumentos de defesa em torno de força obrigatória do contrato e legitimidade da estipulação assim imposta em contrato firmado por adesão.
- Reconhece-se que a autora faz jus à devolução das parcelas pagas, mas, reservando-se à requerida o direito a descontar percentual suficiente para pagamento de despesas administrativas, dentre as quais aquelas havidas com administração e publicidade, conforme entendimento jurisprudencial já consolidado na Súmula no. 01 deste E. Tribunal de Justiça de São Paulo.
- Razoável que a vendedora (que não deu causa à rescisão do contrato) retenha tão somente o percentual de 10% dos valores efetivamente recebidos, garantindo-se, em consequência, em favor da adquirente, ainda que desistente imotivada, a restituição do percentual de 90% dos valores pagos, com o que se acolhe o pedido deduzido pela autora.
- Com efeito, o patamar de 90% dos valores pagos é tido como suficiente para o ressarcimento de possíveis perdas e danos e reembolso de todas as despesas administrativas, diretas ou indiretas.
- Nem se cogite que a retenção de apenas 10% dos valores pagos estaria a gerar prejuízos à requerida e aos demais adquirentes, prejudicando a construção do empreendimento.
- Observe-se que a unidade imobiliária é prontamente liberada para nova negociação pela requerida, anotando-se que sequer houve imissão na posse do imóvel pela autora, não se comprovando qualquer efetivo prejuízo extraordinário que justificasse o não acerto da retenção fixada em apenas 10 % dos valores pagos. Não se justifica, portanto, retenção maior do que o percentual de 10%, impondo-se restituição imediata e de forma única, após o trânsito em julgado, conforme sedimentado na Súmula 02 da Corte de Justiça Bandeirante.
- Por fim, reconhece-se aqui como matematicamente corretos o valor apontado pela autora na exordial, uma vez incontroverso que a autora pagara R$ 53.352,95 a título de preço pela unidade. Calcula-se, pois, facilmente o correspondente ao percentual de 90%, para fins de restituição em favor da autora, também porque ausente impugnação específica por parte da requerida neste tema, admitindo-se, pois, como correto, para fins de restituição, o valor principal indicado na exordial, qual seja, o valor de R$ 48.017,66.
- Os valores passíveis de restituição em favor da autora devem contar com a incidência de atualização monetária oficial, nos termos previstos na Tabela Prática do TJSP, desde os respectivos desembolsos, até o efetivo pagamento.
- Os valores passíveis de restituição em favor da autora devem também contar com a incidência de juros de mora, em patamar de 1% ao mês, estes, com contagem a partir da citação, igualmente, até o efetivo pagamento.
- Não se acolhe, em matéria de juros de mora, o pleito da requerida no sentido da incidência de juros de mora apenas a partir do trânsito em julgado. Equivocado falar-se de não constituição em mora da requerida, tal qual preconizado em contestação, situação que resta infirmada pela citação válida, descabido compactuar-se com evidente enriquecimento sem causa em favor de quem vende e irá recuperar a disponibilidade do imóvel.
- Do quanto exposto, neste ato, com base na previsão do artigo 487, inciso I, do Novo Código de Processo Civil/2015, ao decidir a lide, com resolução de mérito, julgo procedentes os pedidos formulados nesta Ação de Rescisão Contratual proposta em face de Open You Empreendimento Imobiliário Ltda.
- Declaro rescindido o contrato firmado entre as partes, liberando-se, de imediato, a unidade imobiliária em questão nos autos (unidade residencial 54, Torre Itajuba - empreendimento denominado Condomínio Edifício You, Tucuruvi) para uma nova venda por parte da requerida.
- Condeno a empresa requerida a restituir em favor da autora o percentual de 90% dos valores pagos por força do contrato imobiliário ora desfeito, vedados quaisquer outros descontos, adotando-se como matematicamente correto, para fins desta restituição, o valor apontado na exordial, qual seja, o valor de R$ 48.017,66.
- Os valores passíveis de restituição devem contar com a incidência de atualização monetária oficial, conforme previsto na Tabela Prática do TJSP, desde os desembolsos.
- Os valores passíveis de restituição devem contar, também, com juros de mora, em patamar de 1% ao mês, computados os juros desde a citação da requerida para os termos da presente Ação, incidindo, ambos, atualização e juros, até o efetivo pagamento.”
Processo nº 1135890-26.2016.8.26.0100
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
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* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.