Um casal de compradores de unidade residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Le Parc Residence, localizado na Rua Barão de Teffé, nº 1.126, em Jundiaí, interior de São Paulo, perante a incorporadora Ticem (o nome da SPE era: SPE Barão de Teffé Empreendimento Imobiliário Ltda.), obteve vitória na Justiça paulista com a declaração de quebra do “Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda e Compra de unidade residencial” por ato dos próprios adquirentes, que já não mais suportavam arcar com o pagamento das parcelas, obtendo a devolução à vista de 90% sobre os valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária retroativa a partir da data de cada pagamento + juros de 1% ao mês a partir da citação até a efetiva devolução.
A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em maio de 2015, quando então os pretensos compradores assinaram o contrato perante a incorporadora. Após cerca de 2 anos pagando as parcelas, optaram por não mais seguir com o contrato e procuraram a vendedora para obter a devolução dos valores pagos.
Porém, a incorporadora informou que devolveria apenas o equivalente a 50% (cinquenta por cento) dos valores pagos em Contrato, sem nenhuma correção monetária e de forma parcelada. Inconformados com a resposta obtida perante a vendedora, os compradores procuraram o Poder Judiciário.
O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro da Comarca de Jundiaí em São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato dos adquirentes, bem como a condenação da incorporadora na restituição de parte considerável dos valores pagos.
A Juíza de Direito da 2ª Vara Cível, Dra. Adriana Nolasco da Silva, em sentença datada de 19 de outubro de 2017, JULGOU TOTALMENTE PROCEDENTE a ação para rescindir o Contrato por ato dos compradores e condenou a incorporadora na restituição à vista de 90% (noventa por cento) dos valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária desde a data de cada desembolso das parcelas + juros de 1% ao mês a partir da citação até a efetiva devolução.
A Juíza fundamentou sua decisão no sentido de que os percentuais previstos no contrato (Cláusulas nº 4.2, fls. 35/36) mostram-se exacerbados e abusivos, nos termos do artigo 51, IV, do CDC, lesando em demasia o consumidor que, além de não ter se imitido na posse, ao final sequer terá a propriedade do bem imóvel objeto da obrigação, sendo correta a condenação da incorporadora na retenção de 10% dos valores efetivamente pagos a título de parcelas do contrato, devendo restituir 90% desses valores.
Nas palavras da magistrada:
- “Inegável a aplicabilidade do CDC, visto que é evidente a relação de consumo havida entre os coautores e a ré.
- Todavia, anoto que o fato de o contrato ser de adesão não implica, por si só, em sua inteira abusividade.
- De início, também anoto que a parte autora não pleiteia a restituição de eventuais verbas pagas a título de corretagem, mas tão somente do que efetivamente pagou pelo preço do bem. Nesse mesmo sentido, a ré também nada aduz que do valor indicado na inicial (R$ 426.036,77), parte dele seria referente a verbas de corretagem. Tal também é corroborado pela ficha financeira de fls. 45, que não mostra nenhuma rubrica a este título.
- Dito isto, tem-se que os coautores, na inicial, admitem que solicitaram o distrato do negócio por não mais disporem de condições financeiras para mantê-lo. Este também foi o teor da notificação de fls. 46/51.
- A Súmula n 543 do STJ apresenta o seguinte teor: “Na hipótese de resolução do contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.”
- A Súmula nº 01 do TJSP dispõe que “O Compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor, assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem.”
- A multa compensatória (cláusula penal) tem caráter punitivo e incide contra o contratante que deu ensejo à mora da obrigação ou ao seu inadimplemento, com desfazimento do negócio, além de também ser devida no caso de desistência imotivada. Ao mesmo tempo, ela detém caráter compensatório, a favor da parte inocente em tal desfazimento, a título de perdas e danos.
- Ou seja, a multa servirá para cobrir os gastos próprios de administração e propaganda feitas pelo vendedor, referidos na súmula acima descrita.
- Os coautores negam terem se imitido na posse do bem, o que não é refutado pela ré.
- Portanto, considera-se como adequado o percentual de 10% dos valores então pagos pelos promitentes compradores, que serve às duas naturezas elencadas acima (punitiva e compensatória).
- Em sentido contrário, os percentuais previstos no contrato (Cláusulas nº 4.2, fls. 35/36) mostram-se exacerbados e abusivos, nos termos do artigo 51, IV, do CDC, lesando em demasia o consumidor que, além de não ter se imitido na posse, ao final sequer terá a propriedade do bem imóvel objeto da obrigação.
- Permitindo-se a dedução dos percentuais ali constantes, o valor a ser restituído seria deveras minorado, podendo inclusive representar, na prática, a perda da quase totalidade das parcelas pagas, em contrariedade ao preconizado no artigo 53 do CDC.
- Assim, aplica-se o artigo 413 do Código Civil, que prevê que a penalidade pode ser reduzida equitativamente pelo julgador se ela for excessiva, diante da natureza e finalidade do negócio. Portanto, entende o juízo que 10% dos valores pagos (e não do contrato) mostra-se montante condizente.
- Ademais, repisa-se que a parte compradora sequer foi imitida na posse do bem, enquanto à vendedora restará a possibilidade de reinclui-lo no mercado e recuperar seu preço integral.
- Nesse sentido, o entendimento ora esposado não se adere ao de que o contrato de compra e venda deva ser entendido como o de poupança, mas sim ao de que a resilição contratual dessa espécie de negociação é plenamente possível, devendo ser garantida a justa restituição dos valores pagos no percentual supra, de forma atualizada, com base na fundamentação retro.
- Assim sendo, a parte autora faz jus à devolução do percentual de 90% dos valores pagos, que deverá ser feita nos termos da Súmula nº 02 do TJSP: “A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.”.
- A correção monetária incidirá a partir de cada desembolso, visto que visa tão somente à mera reposição da perda do poder aquisitivo da moeda, ocasionada pela inflação.
- Com relação à incidência de juros de mora sobre a restituição, versando a lide sobre relação contratual, é entendimento do juízo que ele deve se dar a partir da data da citação, conforme entendimento do C. STJ.
- No mais, aplica-se o disposto no artigo 240 do NCPC, que trata sobre a constituição em mora do devedor com a citação (ressalvados os casos do artigo 397 e 398 do CC, que não tem relação com os autos), além do artigo 405 do CC.
- Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos, para o fim de: I) declarar a rescisão contratual do “Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda de Fração Ideal de Terreno, Reserva de Futura Unidade Residencial Autônoma e Outras Avenças” firmado entre as partes (fls. 21/44), liberando-se o imóvel objeto deste negócio, em favor da ré; e II) condenar a ré à restituição de 90% dos valores pagos pelos coautores quanto ao contrato discutido nos autos, importância atualizada pela Tabela Prática do TJSP desde o desembolso de cada prestação e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação.”
Processo nº 1010827-09.2017.8.26.0309
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
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* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.