Distrato/Rescisão Contratual de imóvel na planta: Justiça paulista condena incorporadora EVEN na restituição de 90% sobre os valores pagos + 100% da taxa SATI

17/11/2016 às 15:32
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Decisão do Foro Central de SP enfrenta nova determinação do STJ sobre devolução da SATI e condena incorporadora na devolução de parte expressiva dos valores pagos a título de parcelas contratuais e a totalidade da taxa ilegal, à vista!

Um casal de adquirentes de imóvel residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Edifício Club Park, em São Paulo, perante a incorporadora Even (o nome da SPE era: Even SP 26/10 Empreendimentos Imobiliários Ltda.), obteve vitória na Justiça paulista com a declaração de quebra do “Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato dos próprios adquirentes, que já não mais suportavam arcar com as parcelas, obtendo a devolução à vista de 90% sobre os valores pagos em Contrato + 100% da taxa SATI, acrescidos de correção monetária desde cada pagamento (correção retroativa) + juros de 1% ao mês.

A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em outubro de 2013, quando então os pretensos compradores assinaram o contrato perante a incorporadora. Após cerca de 2 anos pagando as parcelas, decidiram por não mais seguir com o contrato e procuraram a vendedora para obter a devolução dos valores pagos.

Porém, a incorporadora informou que devolveria somente o equivalente a 20% (vinte por cento) dos valores pagos em contrato e recusou a devolução integral das importâncias pagas a título de taxa SATI.

Inconformados com a resposta obtida perante a vendedora, os compradores procuraram o Poder Judiciário.

O escritório MERCADANTE ADVOCACIA ingressou com uma Ação de Rescisão Contratual perante o Foro Central de São Paulo, expondo a situação ao Juiz do caso e solicitando o desfazimento do negócio por ato dos adquirentes, bem como a condenação da incorporadora na restituição de parte considerável dos valores pagos e a totalidade das importâncias pagas a título de comissão de corretagem.

A Juíza de Direito da 21ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, Dra. Maria Carolina de Mattos Bertoldo, em sentença datada de 08 de novembro de 2016, JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação para rescindir o Contrato por ato dos compradores, amparados pela súmula nº 1 do Tribunal de Justiça de São Paulo, além de condenar a incorporadora na restituição à vista de 90% (noventa por cento) dos valores pagos em Contrato e 100% (cem por cento) da taxa SATI, acrescidos de correção monetária sobre cada um dos pagamentos e juros de 1% ao mês.

A Juíza fundamentou sua decisão no sentido de que o comprador de imóvel na planta pode procurar a Justiça para solicitar a rescisão do contrato a qualquer tempo, independentemente de mora do credor ou do devedor (comprador), sendo certo que a vendedora deve restituir parte considerável dos valores pagos.

Também enfrentou o tema da taxa SATI frente à nova determinação do STJ datada de 24 de agosto de 2016 e impôs à incorporadora a restituição integral daqueles valores pagos pelos compradores.

Nas palavras da magistrada:

  • “Inicialmente, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela ré acerca dos valores referentes à comissão de corretagem.
  • Observo que os autores, inegavelmente erigidos à condição de consumidores, firmaram com a ré negócios jurídicos principais e acessórios.
  • A ré firmou avenças e prestou o serviço em conjunto com terceiras, devendo ser reconhecida sua legitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda.
  • Evidente a confusão causada ao consumidor face à forma de atuação de empresas imobiliárias que, agindo conjuntamente, com o escopo de atingir objetivo comum, dividem, por meio de estratégia jurídica, as diversas posições envolvidas na consecução do empreendimento.
  • Ainda, o STJ, em julgamento do REsp nº 1551956/SP, ocorrido em 24 de agosto p.p., reconheceu a legitimidade passiva 'ad causam' da incorporadora, na condição de promitente-vendedora, para responder pela restituição ao consumidor dos valores pagos a título de comissão de corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, nas demandas em que se alega prática abusiva na transferência desses encargos ao consumidor.
  • Assim, forçoso afastar a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pela ré.
  • No mérito, a ação é parcialmente procedente.
  • Trata-se de ação de rescisão contratual cumulada com pedido de devolução de quantias pagas.
  • A existência do vínculo contratual entre as partes está devidamente demonstrada nos autos, conforme documento de fls. 38/80, não sendo, ademais, impugnada pela ré.
  • Pleiteiam os autores a devolução dos valores pagos a título de taxa de corretagem, em virtude de alegada “venda casada”; a devolução dos valores pagos à título de taxa SATI; e a devolução de 90% dos valores pagos referentes à quitação do preço do imóvel.
  • Inicio pela análise do pedido de restituição da comissão de corretagem.
  • A simples incidência das normas consumeristas, no caso em análise, não tem o condão de, por si só, invalidar o que foi livremente pactuado.
  • Na hipótese em apreço, não se vislumbra qualquer ilicitude capaz de retirar a validade do negócio celebrado.
  • Observo que, em documento apresentando pelos autores, às fls. 68/70, encontra-se o Resumo da Escritura. Às fls. 69 consta, de forma discriminada, o valor total da venda (R$ 350.000,00) e o valor total de comissões (R$ 14.000,00), além do valor do contrato (336.000,00).
  • Assim, está devidamente discriminada e clara a quantia a ser paga pelos autores a título de comissão de corretagem.
  • Como é cediço, cada modalidade de negócio tem os seus custos próprios e peculiares, discriminados ou às vezes até embutidos no preço ou nos juros. E, no caso em análise, o custo da taxa atacada era de conhecimento dos autores, que anuíram ao seu pagamento.
  • Assim, tendo sido tal obrigação voluntariamente aceita pelos compradores, não há que se falar em “venda casada”, tampouco em ilegalidade de cobrança.
  • Não sendo caso de nulidade, imprevisão e outras exceções taxativas e limitadas, nem tampouco estando caracterizadas as hipóteses previstas no art. 6º, V, do Código de Defesa do Consumidor, o contrato faz lei entre as partes e deve ser respeitado e cumprido.
  • Ademais, a legalidade de cobrança da taxa de Comissão de Corretagem restou assentada, quando expressa no contrato, conforme julgamento do REsp nº 1551956/SP, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.
  • Quanto à rescisão do vínculo contratual e à restituição dos valores pagos a título de quitação do preço do imóvel, observo que é direito dos autores, alçados na qualidade de consumidores, a rescisão do contrato e a devolução das quantias pagas. Nesse sentido:
  • “O comprador que deixa de cumprir o contrato alegando insuportabilidade da obrigação tem o direito de promover a ação para receber a restituição das importâncias pagas” (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Apelação Cível nº 68.372.4/9, OSWALDO BREVIGLIERI, Relator).
  • No caso sub judice, pretendem os autores a extinção do compromisso de compra e venda de imóvel, face à impossibilidade de efetuar o pagamento do preço. Tem-se, assim, a resolução do negócio, que deve acarretar a restituição das partes à situação anterior, nela incluída a devolução das parcelas recebidas pela vendedora.
  • De acordo com o contrato firmado entre as partes (cláusula VIII), em caso de rescisão, o comprador tem direito à devolução da quantia paga, feitas diversas deduções (fls. 49).
  • Nesse ponto, observo que a mencionada cláusula, tal como redigida, não é válida, visto que abusiva, uma vez que valida descontos sobre descontos, e em desconformidade com o entendimento jurisprudencial dominante.
  • Desta forma, é inadmissível o cumprimento da cláusula contratual referente à hipótese de rescisão contratual, o que implicaria enriquecimento ilícito por parte da ré.
  • Ademais, sendo proprietária do imóvel, obviamente poderá a ré repassá-los a terceiros, que pagarão integralmente o preço, mediante um novo contrato.
  • Contudo, deve-se considerar as despesas que a parte ré teve com a celebração do contrato. Deve-se ter em mente, ainda, que, no presente caso, os autores sequer chegaram a possuir o imóvel objeto do contrato.
  • A jurisprudência vem entendendo que “... para evitar enriquecimento injusto, a solução é determinar que as perdas das quantias pagas se limite aos prejuízos sofridos pela vendedora.” (JTJ-LEX-149/45 e 130/78).
  • Verifico que o percentual de 10% (dez por cento) para perda pela ré das quantias pagas, em razão das despesas tidas pela ré com o contrato, é o aceito pela jurisprudência.
  • Cumpre ressaltar, ainda, que tal percentual deve incidir não sobre o preço atualizado do contrato, mas sobre as parcelas pagas, corrigidas monetariamente. A devolução deverá ser imediata e em única parcela.
  • Assim, desfeito o contrato, deve a ré devolver as quantias pagas, corrigidas monetariamente, assegurando-se o direito de fazer a retenção do valor pago, tão somente, ao correspondente a dez por cento, a título de ressarcimento pelo prejuízo sofrido com o desfazimento dos negócios, sem que haja culpa de sua parte.
  • Por fim, cabe ressaltar que, em se tratando de contrato de adesão, não foi dada oportunidade à parte autora de questionar as cláusulas contratuais. Logo é imprescindível a observância das normas estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor.
  • Por fim, quanto à taxa SATI, observo que o STJ, no já citado julgamento do REsp nº 1551956/SP, reconheceu a abusividade da cobrança pelo promitente-vendedor do serviço de assessoria técnico-imobiliária (taxa SATI), ou atividade congênere, posto que é prática abusiva transferir tais custos ao consumidor.
  • Assim, de rigor a integral devolução da quantia paga pelos autores referente à taxa SATI, no valor de R$ 3.080,00 (conforme documento de fls. 69), e de 90% da quantia paga referente à quitação do preço do imóvel, devendo tais quantias serem atualizadas desde o desembolso de cada parcela e acrescidas de juros a contar da citação.
  • Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação em face de EVEN SP 26/10 EMPREEDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., para declarar rescindido Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de Imóvel e Outras Avenças firmado entre as partes, descrito na inicial, e condenar a ré a devolver as quantias efetivamente pagas referente ao preço do imóvel pelos autores, corrigidas monetariamente desde o desembolso, com o acréscimo dos juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação, até o efetivo pagamento, assegurado o direito à vendedora de reter, tão somente, a quantia correspondente a 10% do total pago pela compradora, nos termos acima expostos.
  • Condeno, ainda, a ré na devolução do valor integral pago pelos autores a título de taxa SATI, no montante de R$ 3.080,00 (três mil e oitenta reais), corrigido monetariamente desde o desembolso, com o acréscimo dos juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação, até o efetivo pagamento.”

Processo nº 1124554-59.2015.8.26.0100

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)

www.mercadanteadvocacia.com

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http://mercadanteadvocacia.com/decisao/rescisaodistrato-do-contrato-por-ato-do-comprador/

* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.

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Sobre o autor
Ivan Mercadante Boscardin

OAB/SP 228.082Advogado especialista em Direito Imobiliário e Consumidor • São Paulo (SP). Advogado atuante há mais de dez anos no Estado de São Paulo Formado pela Universidade São Judas Tadeu Especialista em: Direito Civil com ênfase em Direito Empresarial (IASP) Direito Processual Civil (PUC SP) Direito Imobiliário e Registral (EPD) Arbitragem nacional e estrangeira (USA/UK) Autor do livro: Aspectos Gerais da Lei de Arbitragem no Brasil Idiomas: Português e Inglês. E-mail: [email protected]: www.mercadanteadvocacia.com - Telefones: 11-4123-0337 e 11-9.4190-3774 (cel. Vivo) - perfil também visualizado em: ivanmercadante.jusbrasil.com.br

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