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Caso Salgueiro Mouta versus Portugal: uma relação paternal homoafetiva no perante o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

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01/10/2012 às 08:46
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Considerações Finais:

 Faz parte da condição humana a sexualidade e este também é um direito fundamental que acompanha os seres humanos desde o seu nascimento, pois é inerente à sua própria natureza. É um direito natural, individual, inalienável e imprescritível. Não é possível a realização plena do ser humano quando este direito é restringido ou desrespeitado no direito livre do exercício da sexualidade que se desdobra na liberdade sexual e na liberdade de orientação sexual.

Leciona Roger Raupp Rios[23]: “A discriminação de um ser humano em virtude de sua orientação sexual constitui, precisamente, uma hipótese (constitucionalmente vedada) de discriminação sexual”.

 A igualdade de tratamento, portanto, deve ser um imperativo a ser respeitado independentemente da orientação sexual do ser humano, haja vista que as normas constitucionais que consagram a igualdade vedam em absoluto qualquer forma de discriminação em função da orientação sexual. Por este prisma, percebe-se que todas as pessoas humanas devem gozar dos mesmos direitos, conciliando, portanto, os preceitos jurídicos com a orientação sexual, sendo esta apenas mais uma característica humana[24].

 A sociedade que clama por igualdade de direitos é a mesma que ainda mantém uma postura de discriminação quando o assunto é a orientação sexual do ser humano. Surge o direito, sob o paradigma da igualdade e do príncipio da não discriminação como mediador das relações destes cidadãos com o restante da sociedade, com o intuito de promover a dignidade de gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros, tendo em vista que estas pessoas de forma alguma reivindicam novos direitos ou desejam direitos especiais, somente buscam a efetivação dos direitos[25] que são comuns as pessoas heterossexuais.

Portanto, qualquer, discriminação que tenha por fundamento a orientação sexual de uma pessoa, além refletir total desrespeito à dignidade da pessoa humana, torna-se meio de fortalecer preconceitos sociais que devem ser superados.

A nomenclatura homossexual é originária do século XIX e deriva do grego homo (igual) e do latim sexus, que remonta a idéia de sexo entre os iguais. E na busca de tentar conceituar o termo homossexualidade: é a afinidade, atração e/ou comportamento sexuais entre pessoas do mesmo sexo.

Já a orientação sexual é uma atração emocional sexual ou afetiva de modo continua por outra pessoa. É diferente de outros aspectos da sexualidade, tais como: o sexo biológico, o papel social do gênero (que são as normas ou estereótipos culturais previamente esperados do homem e da mulher. Ou seja, a orientação sexual é um conceito diferente do comportamento sexual, pois aquele diz respeito aos sentimentos e a autodeterminação, indicando, portanto, a manifestação da identidade emocional da pessoa. Tal conceito veio para substituir a expressão homossexual, tendo em vista que tal idéia vem sendo culturalmente percebida de forma pejorativa e preconceituosa.


Bibliografia:

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SHORTER, Edward. A formação da família moderna. Lisboa, Terramar, 1995.

VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da Homoafetividade: da possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. Rio de Janeiro: Grupo de editora nacional/Ed. Método, 2005.


Notas

[1] AKEL, Ana Carolina Silveira. A guarda compartilhada- um avanço para a família moderna. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=130 acessado em 21 de Março de 2011.

[2] J.CANOTILHO e VITAL MOREIRA. A constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, Coimbra Editora, 1995.

[3] BURGUIÉRE, André. A história da família: o Ocidente, a industrialização e a urbanização. Volume 4, editora Terramar, Lisboa, 1999.

[4] SHORTER, Edward. A formação da família moderna. Lisboa, Terramar, 1995.

[5] BARROS, Sérgio Resende. Direitos Humanos da família: dos fundamentos aos operacionais. In GROENINGA, Gisele Câmara; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.) Direito da família e psicanálise. São Paulo, Imago, 2003.

[6] MADALENO, Rolf. Filhos do Coração. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese, n. 23, ano 6, out. nov. dez. 2004.

[7] Instituto Nacional de Estatística – Censos 2001: resultados definitivos, Lisboa, INE, 2001.

[8] OLIVEIRA, Guilherme. Transformações do direito de família. In: Comemoração dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma d 1977, vol. I, Coimbra, Coimbra Editores, 2004.

[9] Instituto Nacional de Estatística – Censos 2001: resultados definitivos, Lisboa, INE, 2001.

[10] OLIVEIRA, Guilherme. Transformações do direito de família. In: Comemoração dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da Reforma de 1977, vol. I, Coimbra, Coimbra Editores, 2004.

[11] O afeto é muito mais do que um vínculo que une os integrantes de uma família e sobretudo um viés externo que oferece mais humanidade a cada família e este príncipio encontra fundamento na dignidade da pessoa humana. Para maiores aprofundamentos no tema fica com sugestão de leitura o artigo “O princípio jurídico da afetividade na filiação” do Professor Doutor Paulo Luiz Netto Lôbo, disponível no sítio: http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=130 acesso em 21 de março de 2011.

[12] SHORTER, Edward. A formação da família moderna. Lisboa, Terramar, 1995.

[13] Ver Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, no Curso de direito de família, vol. II, Tomo I, Coimbra, Coimbra Editora, 2006, p. 636.

[14] Determina o artigo 1585 do código civil que somente pode iniciar a ação de divórcio aquele cônjuge que se sinta ofendido e estando o mesmo impossibilitado, encontra-se habilitado para intentar com a ação o seu represente legal, desde que haja a autorização do conselho de família. Há também uma determinação do artigo 1787 do mesmo código que prevê a declaração de uma sentença que determine de quem é a culpa do divórcio e uma vez comprovada a culpa de ambos quem possui a maior parcela.

[15] Ver artigo 13º, número 2 da CRP: Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicção política ou ideológicas, instrução, situação econômica, condição social ou orientação sexual.

[16] Ver a Constituição da República Portuguesa, no artigo 67, número 01, a Constituição Espanhola, no artigo 21 e a Magna Carta Brasileira.

[17] Ver artigo 17 e 23 deste Pacto, que reafirma os direitos contidos nos artigos 12 e 16 da Declaração Universal dos Direitos do Homem. E sobre a proteção da família ver Ana Maria Guerra Martins. Direito Internacional dos Direitos Humanos. Coimbra, Almedina, 2006.

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[18] BRONZE, José Fernando. Apontamentos sumários de introdução ao Direito. Coimbra, FDUC, 1996.

[19] Material disponivel: http://www.gddc.pt/direitos-humanos/onu-proteccao-dh, acesso em 23.05.2012.

[20] No que diz respeito a queixa perante esta corte, é imprescindível a identificação do requerente e do Estado signatário que é protagonista da queixa, não é, portanto, admissível, queixa anônima.No artigo 47º do Regulamento deste Tribunal é estipulado os elementos que devem ser apresentados na queixa. Na alínea “b” do mencionado artigo, é taxativo quando diz não ser possível apresentar queixa idêntica a outra que já tenha sido apresentada perante Instância internacional, caracterizando o princípio do non bis in idem. Também não pode a queixa ser mal fundamentada ou abusiva e deve, necessariamente, observar o dispositivo da Convenção ou dos Protocolos em função da competência ratione persona, ratione materiae, ratione temporis e ratione loci.

Sobre o prazo de apresentação da queixa, terá o requerente o prazo de 6 meses, a contar da decisão definitiva do âmbito interno (artigo 35º, número 01). Todavia, tratando-se de um fato continuo ou não havendo recurso interno para findar, conta-se o prazo no momento da cessação da situação ou violação.

E finalmente, para que uma queixa seja admitida perante esta Corte é necessário que se tenha esgotado todas as vias jurídicas no país violador. Isto é reflexo do Principio da exaustão dos meios internos, notadamente é o caráter subsidiário da convenção. Salienta-se que contraria a corrente dominante, Fausto Quadros não acha necessário que o cidadão esgote os meios políticos e legislativos, basta tão somente, exaurir as vias judiciais e administrativas. Cf.: O príncipio da exaustão dos meios internos na Convenção Européia dos Direitos do Homem e a ordem jurídica portuguesa. In Roa, Ano 50, 1990.

[21] A jurisprudência deste Tribunal reconhece em vários outros acórdãos que a vida familiar é um conceito extensivo às situações em que cessou a vida em comum entre o pai e a mãe, e o contato regular entre um pai e um filho. É essencial ver o acórdão Elsholz versus Alemanha, de 13 de junho de 2000, o Berrehab versus Suíça, de 21 de junho de 1988.

O mesmo tribunal tem compreendido que o conceito de “vida familiar” é aplicado as relações entre os parentes próximos, como é o caso dos avós e netos, entre irmãos e irmãs, sobrinhos e tios, sendo necessário que os vínculos sejam efetivos. E sem qualquer dúvida entre filhos adotados e seus país.

As relações não reconhecidas como relações familiares na jurisprudência desta casa, são por exemplo entre o homem e a mulher que doam esperma ou óvulo para inseminação artificial, ainda que haja entre estes e a criança qualquer tipo de contato (ver a queixa número 16944/90 de J.R.M contra a Holanda) e as famílias polígama (ver a queixa número 14501/89, de E.A e A.A contra a Holanda). Cf.: Irineu Cabral Barreto, “Os direitos da criança na Convenção Européia dos Direitos do Homem”, In: Direito da Criança, Coimbra, Coimbra Editora, 2004.

[22] Cf: artigo 1905º número 2 do Código Civil e o artigo 178 da O.T.M, por exemplo.

[23] RIOS, Roger Raupp. O príncipio da igualdade e a discriminação por orientação sexual- a homossexualidade no direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

[24] VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da Homoafetividade: da possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos. Rio de Janeiro: Grupo de editora nacional/Ed. Método, 2005.

[25] Exemplo de direitos que são comumente negados a estas pessoas: a vida, pois há Estados onde aplica-se a pena de morte para a sadomia, o direito da seguridade social, assistência e benefícios sociais, direito de formar uma família, há Estados que não reconhecem casais do mesmo sexo e a negação de outros direitos como no caso apresentado, o direito de proteção familiar da menor em função da oreintação sexual do pai.

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Sobre a autora
Maria Lygia de Almeida Koike

Graduada em Direito (FIR), pós-graduada em Direito Administrativo (UFPE), Ciências Políticas (Unicap) e em Direitos Humanos (IGC-Coimbra), mestranda em Ciência Jurídico-Política da Faculdade de Direito da Unversidade de Coimbra. Trabalho apresentado na cadeira Direito Internacional Público, ministrado pelo Professor Doutor Francisco Ferreira de Almeida, no mestrado da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KOIKE, Maria Lygia Almeida. Caso Salgueiro Mouta versus Portugal: uma relação paternal homoafetiva no perante o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3379, 1 out. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22706. Acesso em: 19 abr. 2024.

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