Um comprador de unidade residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio My Place Braz Leme, em São Paulo, perante a incorporadora Teixeira Duarte (o nome da SPE era: TDSP Zanzibar Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda.), obteve vitória na Justiça paulista com a declaração de quebra do “Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato do próprio adquirente, que já não mais suportava arcar com as últimas parcelas, obtendo a devolução à vista de 90% sobre os valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária desde cada pagamento (correção retroativa) + juros de 1% ao mês.
A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em novembro de 2012, quando então o comprador assinou o contrato perante a incorporadora. Após cerca de 3 anos pagando as parcelas, optou por não mais seguir com o negócio e procurou a vendedora para obter a devolução dos valores pagos.
Porém, como não foi possível um consenso entre as partes no tocante à devolução dos valores pagos em contrato, o comprador decidiu procurar auxílio perante o Poder Judiciário.
A Juíza de Direito da 31ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, Dra. Mariana de Souza Neves Salinas, em sentença datada de 08 de julho de 2016, JULGOU PROCEDENTE a ação para rescindir o Contrato por ato do comprador, amparado pela súmula nº 1 do Tribunal de Justiça de São Paulo, além de condenar a incorporadora na restituição à vista de 90% (noventa por cento) dos valores pagos em Contrato, acrescidos de correção monetária sobre cada um dos pagamentos e juros de 1% ao mês.
A Juíza fundamentou sua decisão no sentido de que o comprador de imóvel na planta pode procurar a Justiça para solicitar a rescisão do contrato a qualquer tempo, independentemente de mora do credor ou do devedor (comprador), sendo certo que a vendedora deve restituir parte considerável dos valores pagos, com observação ao quanto prescrito pelo artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor e nas súmulas 1 e 2 do Tribunal de Justiça de São Paulo.
Nas palavras da magistrada:
- “Os negócios jurídicos regidos pelo Direito Privado seguem o corolário do pacta sunt servanda, que estabelece a obrigatoriedade das manifestações de vontade válidas. Assim, presentes os requisitos de validade e eficácia, o acordo de vontades, formalizado em cláusulas contratuais, expressa comandos imperativos, obrigando as partes contratantes ao irrestrito cumprimento das obrigações assumidas.
- A força obrigatória dos contratos tem como fundamento a preocupação com a segurança de ordem geral, que ultrapassa o âmbito do interesse particular, na medida em que o comprometimento entre indivíduos cria expectativas no meio social, cujo equilíbrio o ordenamento jurídico deve garantir.
- Este princípio, no entanto, não pode ser aplicado de forma absoluta, impedindo integralmente a revisão de cláusulas contratuais. Ao contrário, a realidade atual impõe mitigação dos efeitos do pacta sunt servanda.
- Nessa toada, a fim de tutelar os interesses do consumidor adquirente, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 53, preconiza serem abusivas as cláusulas, em contratos de compra e venda, estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefícios do credor.
- É sabido, por outro lado, que a cláusula penal tem a função de indenizar uma das partes contratantes pelos prejuízos causados em função daquele que culposamente deixa de cumprir a obrigação, se constitui em mora, ou simplesmente desiste de dar continuidade àquilo pactuado, sendo que, para exigir a pena convencional, é prescindível que o credor alegue prejuízo.
- Com base no disposto no art. 413, do Código Civil, norma de ordem pública, que não admite, pois, estipulação em sentido contrário, a cláusula penal deve ser reduzida equitativamente se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, de acordo com a natureza do negócio jurídico.
- Resta analisar, pois, se a cláusula penal ofende o equilíbrio contratual, impondo desvantagem exagerada a uma das partes e, por consequência, promovendo o seu enriquecimento ilícito.
- Nesse diapasão, o contrato em questão prevê, a título de indenização predeterminada para o caso de rescisão unilateral, as cláusulas penais inseridas na cláusula VIII, qual seja, a restituição de 70% dos valores pagos, deduzidos (i) 10%, sobre o custo total da venda. Atinentes aos custos administrativos e de promoção da venda e (ii) contribuição ao PIS e COFINS, sobre os valores até então percebidos.
- Feita a anotação, as sanções aqui previstas devem ser reduzidas, sob pena de iminente enriquecimento ilícito das compromissárias vendedoras, que lucrarão novamente com a revenda do imóvel. O percentual da multa, no caso dos autos, deve incidir sobre o montante das parcelas pagas e, segundo jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça deve variar, no total, entre 10% e 30%.
- Destarte, com base no disposto no art. 413, do Código Civil, norma de ordem pública, que não admite, pois, estipulação em sentido contrário, o percentual da cláusula penal deve ser reduzido para 10% das parcelas pagas, tendo em vista o equilíbrio contratual.
- Salienta-se, por cautela, que a eventual devolução de valores deverá ser feita de forma simples, vez que não restou configurada a má fé da parte requerida.
- Como é cediço, o STJ entende que para a aplicação do parágrafo único do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor, é preciso prova da má fé ou culpa, o que não ocorreu na hipótese vertente.
- Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE os pedidos para (i) declarar a resolução do compromisso de compra e venda pactuado entre as partes, com o restabelecimento do status quo ante, adequando-se a cláusula VIII à fundamentação da sentença; (ii) condenar a requerida à devolução das parcelas pagas pelo compromissário comprador, em uma única parcela, devidamente atualizada desde o desembolso de acordo com a Tabela Prática do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, e acrescidas de juros moratórios desde a citação, com a possibilidade de retenção pela requerida do percentual de 10% sobre o montante adimplido, Em consequência, JULGO EXTINTO o processo, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.”
Processo nº 1033184-62.2016.8.26.0100
Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)
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http://mercadanteadvocacia.com/decisao/rescisaodistrato-do-contrato-por-ato-do-comprador/
* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.