Distrato/Rescisão Contratual de imóvel na planta: Justiça condena incorporadora EVEN na restituição à vista de 80% sobre os valores pagos pelo comprador

04/10/2016 às 19:22
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Decisão do Foro Central de SP ressalta entendimento jurisprudencial dominante sobre a matéria e impõe à incorporadora a devolução de parte expressiva dos valores pagos ao comprador de imóvel na planta, à vista, acrescido de correção monetária e juros.

Um comprador de imóvel residencial na planta no empreendimento denominado Condomínio Edifício Assembleia One, no Rio de Janeiro, perante a incorporadora Even (o nome da SPE era: Volens Even Empreendimentos Imobiliários Ltda.), obteve vitória na Justiça paulista com a declaração de quebra do “Instrumento Particular de Promessa de Venda e Compra de unidade autônoma” por ato do próprio adquirente, que já não mais suportava arcar com o pagamento das últimas parcelas, obtendo a devolução à vista de 80% sobre os valores pagos em Contrato, acrescido de correção monetária desde cada pagamento (correção retroativa) + juros de 1% ao mês.

A aquisição do projeto de imóvel na planta ocorreu em fevereiro de 2014, quando então o pretenso comprador assinou o contrato perante a incorporadora. Após cerca de 1,5 ano pagando as parcelas, optou por não mais seguir com o contrato e procurou a vendedora para obter a devolução dos valores pagos.

Porém, a incorporadora informou que devolveria somente o equivalente a 20% (vinte por cento) dos valores pagos em contrato.

Inconformado com a resposta obtida perante a vendedora, o comprador procurou o Poder Judiciário.

Através de ação de rescisão contratual ajuizada pelo escritório MERCADANTE ADVOCACIA, a Juíza de Direito da 40ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, Dra. Priscilla Buso Fascinetto, em sentença datada de 23 de agosto de 2016, JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação para rescindir o Contrato por ato do comprador, amparado pela súmula nº 1 do Tribunal de Justiça de São Paulo, além de condenar a incorporadora na restituição à vista de 80% (oitenta por cento) dos valores pagos em Contrato, acrescidos de correção monetária sobre cada um dos pagamentos e juros de 1% ao mês.

A Juíza fundamentou sua decisão no sentido de que era abusiva a cláusula do contrato que previa a retenção de parte expressiva dos valores pagos pelos consumidores, sendo nula a disposição contratual nesse sentido por afronta ao artigo 51, inciso IV e §1º, inciso II do Código de Defesa do Consumidor, sendo certo que a vendedora deve restituir parte considerável dos valores pagos.

Nas palavras da magistrada:

  • “Da simples leitura do relatório está claro que não há nulidades a serem sanadas, e, por conseguinte, o feito comporta julgamento antecipado, sendo desnecessária dilação probatória, tendo em vista que se trata de matéria eminentemente de direito e os fatos encontram-se comprovados pelos documentos acostados nos autos, os quais se mostram suficientes para o deslinde da demanda, de conformidade com o artigo 355, I, do Código de Processo Civil.
  • Já decidiu o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL que "a necessidade da produção de prova há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide não implique em cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do Magistrado" (RE 101.171-8-SP).
  • Ademais, facultada a providência do art. 938, parágrafo § 1º do CPC, em segunda instância.
  • Ab initio, saliente-se que a relação havida entre as partes está amparada pelo Código de Defesa do Consumidor, porquanto se adequam aos conceitos de consumidor e fornecedor elencados no artigo 2º e 3º, respectivamente, do referido código. É cediço que o diploma consumerista considera a posição isonômica dos fornecedores, em relação à parte hipossuficiente, responsabilizando quaisquer daqueles que se encontrem inseridos no elo da cadeia de fornecimento pelos danos advindos da má prestação do serviço.
  • No mérito, o pedido é parcialmente procedente, vejamos:
  • Observe-se, a princípio, que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável à espécie, uma vez que a relação entre as partes é de consumo, na qual a liberdade de contratar é limitada pelo princípio da supremacia da ordem pública, segundo o qual o Estado está autorizado a intervir na relação contratual para evitar ou reprimir desequilíbrios e a exploração do economicamente mais fraco, restabelecendo-se a igualdade dos contratantes.
  • A contratação realizada entre as partes restou comprovada, bem como concordaram as partes com a rescisão/distrato do contrato, sendo que o ponto controvertido circunda em relação a restituição dos valores adimplidos.
  • Verifica-se que o pedido de rescisão fundamenta-se na impossibilidade da parte autora continuar adimplindo as parcelas do imóvel junto à requerida, o que foi confessado na inicial. Logo, a contrato somente será desfeito por culpa da parte autora, que adquiriu bem que não poderia adimplir o preço e que futuramente acarretaria no seu inadimplemento da parcela das chaves.
  • Com a rescisão do contrato, as partes devem ser restituídas à situação em que se encontravam antes da celebração do negócio. Assim, é cristalino o direito do comprador obter a devolução do que despendeu, observando-se, no entanto, a prerrogativa do alienante de reter parte desse numerário para ressarcimento das despesas administrativas, nestas incluídas as de corretagem, publicidade, bem como perdas e danos.
  • Com a rescisão do contrato, ainda que por culpa da parte autora, faz-se necessária a restituição, mesmo que não integral, dos valores pagos pelo requerente-comprador.
  • Isso porque, como sabido, o substrato fundamental que orienta e disciplina as rescisões contratuais tem como pressuposto a impossibilidade de admitir-se, mesmo obliquamente, o enriquecimento sem causa; por outro aspecto, não menos importante, a restituição, posto sustentar-se em princípio de ordem pública, não pode resultar excessivamente minguada, caracterizando enriquecimento sem causa do vendedor.
  • Há de observar, outrossim, o artigo 51, IV do Código de Defesa do Consumidor, que prevê a nulidade de pleno direito das cláusulas que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”.
  • A restituição dos valores pagos, quando da rescisão do negócio jurídico, não só obsta o enriquecimento sem causa do alienante, repelido pelo sistema jurídico, como também e principalmente, obedece ao princípio erigido no atual Código Civil (como primado máximo das obrigações), segundo o qual o direito contratual há de seguir o princípio norteador do equilíbrio das partes no negócio jurídico, cuja liberdade de contratar se sujeita, fundamentalmente, à função social do contrato.
  • E, para que seja reparado adequadamente os prejuízos sofridos, a figura-se razoável, na hipótese, que a retenção se dê no patamar de 20% (vinte por cento) da totalidade dos valores pagos.
  • Ante o exposto, pelo mais que dos autos constam, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação para ratificar a tutela anteriormente concedida ao autor e:
  • a) DECLARAR rescindido o instrumento particular de promessa de venda e compra do bem imóvel celebrada pelas partes, por culpa da parte autora;
  • b) declarar a nulidade da cláusula contratual quanto à retenção dos valores superior a 20%, condenando a ré, mediante retenção apenas do importe de 20% dos valores pagos para aquisição do imóvel, a restituir a quantia adimplida pela parte autora em razão da aquisição do imóvel, corrigida monetariamente desde o desembolso e com juros de mora 1% ao mês contados a partir da citação.”

Processo nº 1013889-39.2016.8.26.0100

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (especialista em Direito Imobiliário e Rescisão de Contratos de Promessa de Venda e Compra de imóvel na planta)

www.mercadanteadvocacia.com

Gostou do artigo? Veja a íntegra da decisão judicial em:

http://mercadanteadvocacia.com/decisao/rescisaodistrato-do-contrato-por-ato-do-comprador/

* O texto apresentado tem caráter meramente didático, informativo e ilustrativo, não representando consultoria ou parecer de qualquer espécie ou natureza do escritório Mercadante Advocacia. O tema comentado é público e os atos processuais praticados foram publicados na imprensa oficial.

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Sobre o autor
Ivan Mercadante Boscardin

OAB/SP 228.082Advogado especialista em Direito Imobiliário e Consumidor • São Paulo (SP). Advogado atuante há mais de dez anos no Estado de São Paulo Formado pela Universidade São Judas Tadeu Especialista em: Direito Civil com ênfase em Direito Empresarial (IASP) Direito Processual Civil (PUC SP) Direito Imobiliário e Registral (EPD) Arbitragem nacional e estrangeira (USA/UK) Autor do livro: Aspectos Gerais da Lei de Arbitragem no Brasil Idiomas: Português e Inglês. E-mail: [email protected]: www.mercadanteadvocacia.com - Telefones: 11-4123-0337 e 11-9.4190-3774 (cel. Vivo) - perfil também visualizado em: ivanmercadante.jusbrasil.com.br

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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